Há pouco mais de duas semanas, quando, entre os homenageados do Oscar 2014, o rosto de Eduardo Coutinho foi projetado no telão do Dolby Theater, muitos se surpreenderam com a projeção internacional do cineasta, morto em fevereiro.
Outros se surpreenderam ainda mais com o fato de Coutinho ser membro da seção de documentários da Academia, que destacou seu legado para a história do cinema documental. Por estas e por outras, mencionar a relevância da obra do documentarista já se tornou um clássico.
Mais do que nunca, conhecer, apreciar e pensar a produção do cineasta é oportuno. Nesse sentido, a Cinemateca Brasileira presta homenagem e dedica uma mostra ao diretor de filmes como Cabra Marcado para Morrer, Edifício Master, Jogo de Cena, Peões, entre outros. “Coutinho tem uma importância fundamental. Inovou o segmento de documentários e propicia um debate intenso sobre as fronteiras entre ficção e realidade”, observa Lisandro Nogueira, diretor da Cinemateca.
A programação começa nesta quinta-feira, às 19h30, com a exibição de Cabra Marcado, seguida de debate com o mestre em etnologia e doutor em comunicação Henri Gervaiseau. Com curadoria do professor e crítico Ismail Xavier, presidente do conselho da Cinemateca, a mostra exibe ainda Edifício Master, Peões e Santo Forte, todos pertencentes ao acervo da instituição. “A Cinemateca, que sempre teve uma relação próxima e de admiração do trabalho do Coutinho, restaurou um dos seus filmes mais importantes (Cabra Marcado). A mostra é uma homenagem mais do que justa. Ele, que era assíduo na Cinemateca, sempre foi um dos cineastas mais interessados nas questões que envolvem o restauro e a preservação de filmes”, comenta Nogueira que destaca a curadoria de Xavier como um trabalho que destaca uma seleção concisa, mas expressiva.
“Coutinho esteve conosco no final do ano passado quando foi homenageado e seu filme, restaurado, exibido para o público. Desta vez, os debates foram pensados como forma de levar ao público mais uma oportunidade de aprender sobre seu trabalho. O professor Ismail Xavier convidou profissionais que estudam e debatem cinema e são profundos conhecedores da obra do diretor. Cada um participará de debate sobre um filme específico. Esses debates serão cada vez mais constantes na Cinemateca”, conta o diretor.
Sexta-feira (21) às 19h30, é dia de assistir e discutir Peões e sua representação das greves históricas do ABC paulista com o professor, jornalista, roteirista e diretor Leandro Saraiva, que concentra seus estudos no cinema brasileiro moderno e contemporâneo, com ênfase nas relações entre formas estéticas e sociedade. “O papel da Cinemateca, além da preservação das cópias físicas, é o preservar a memória desse importante cineasta e contribuir para a formação de novo público”, comenta Nogueira. “Esteticamente, Coutinho se aproxima do Cinema Novo, em importância, ao estabelecer um marco para se pensar o ‘cinema de escuta’ do século 21. Ele criou um ‘método’ muito particular para ouvir as pessoas em detrimento da velha entrevista oriunda do telejornalismo. Singular, ele nos convida a repensar o cinema.”
Para debater uma das mais representativas obras de Coutinho, Edifício Master, a convidada é a doutora em ciências da comunicação Ilana Feldman, autora da tese Jogos de Cena: Ensaios Sobre o Documentário Brasileiro Contemporâneo. O longa documenta a vida de moradores em um prédio de Copacabana e ilustra, perfeitamente, o estilo único com que o cineasta ouvia, e retratava, seus entrevistados. Também com mediação de Xavier, a sessão de Edifício ocorre no domingo, 23, às 18 horas.
Antes, no sábado, 22, será a vez de conhecer mais sobre o sincretismo religioso do brasileiro com Santo Forte, que será exibido às 18 horas. Em seguida, haverá uma conversa com o doutor em filosofia e pesquisador Mateus Araújo, que se dedica ao campo da história, da teoria e da crítica de cinema.
Convidar especialistas para debater a obra de Coutinho é, para Nogueira, uma forma de seguir a vocação da Cinemateca que, além exibir e preservar filmes, foca na educação do público, tanto local quanto nacional. “Nossa próxima mostra, Imagens da Ditadura, começa dia 27 e tem curadoria do prof. Eduardo Morettin, da ECA/USP, marca os 50 anos do golpe de 1964 e terá filmes e debates”, exemplifica o diretor.
Em abril, a instituição recebe o monólogo O Livro, produzido e interpretado por Eduardo Moscovis, que já passou pelo Rio e fará sua estreia em São Paulo, na Cinemateca. “Além disso, traremos eventos culturais que ocupem o espaço de forma interessante. Temos também previstos seminários, debates e gravações para TV de programas sobre cultura e cinema.”