Dentro de uma lógica mercadológica no consumo de arte e entretenimento, há uma noção de “perder tempo” quando a obra não corresponde às expectativas, uma espécie de racionalização da fruição artística. Parece que é feito pensado nessa lógica que Predadores Assassinos, do francês Alexandre Aja, entrega um terror que vai muito direto ao ponto, como se quisesse poupar tempo. Aqui há a mistura do filmes catástrofe com o terror promovida por animais selvagens, trocando o mar e o tubarão do clássico de Spielberg por um porão e vorazes jacarés. A aposta é uma imensa economia narrativa, balanceada pelo excelente domínio de ferramentas de tensão, potencializadas pela habilidade de Aja em trabalhar com os espaços físicos a favor do terror. Funciona.
O cenário absurdo é o seguinte: A jovem Haley (Kaya Scodelario) é uma nadadora que passa por dúvidas acerca de seu potencial. Seus anseios são interrompidos com a notícia da chegada de um poderoso furacão ao estado da Flórida. Com a tempestade engrossando, a jovem não consegue estabelecer contato com seu pai (Barry Pepper) e decidi ir verificar pessoalmente. O homem está desacordado em um porão onde fazia serviços de reforma e onde também a água começa a tomar conta. Na tentativa de reanimá-lo, a moça descobre visitas de jacarés no espaço, que não pretendem deixar ninguém sair de lá antes de se alimentarem bem.
Para fazer as engrenagens do suspense funcionar, o roteiro de Michael e Shawn Rasmussen costura uma série de coincidências, das mais palpáveis às que exigem mais da suspensão de descrença, para que o cenário seja construído. Começando pela protagonista nadadora (ok, aceitável), a chegada do furacão (sim, um fenômeno natural bem norte-americano), um pai teimoso que se recusa a se dirigir a um lugar seguro (é, começando a complicar) e um sistema de drenagem que liga um porão a um lago repleto de jacarés (um pouquinho demais). A partir da aceitação de todos esses elementos da premissa, o que talvez não seja fácil para todos, Aja começa a entregar a carne do filme.
Se há timidez no estabelecimento do alicerce dramático dos personagens, a tensão e o terror conseguem se impor com a coerência em que lida com a mise-en-scène. Aja trabalha com vigor os pontos de segurança e perigo, lidando dramaticamente bem com as distâncias e as possíveis mudanças do cenário. A escalada das ameaças e as soluções encontradas vêm em um crescendo que, apesar da absurdidade da situação, consegue transparecer organicidade em seu desenrolar. Algo que não acontece, por exemplo, em Águas Rasas (Jaume Collet- Serra, 2016), filme que compartilha diversos elementos narrativos com esse Predadores Assassinos, mas que perde demais a mão na resolução de seu conflito.
Há uma consciência também em Aja de que, a partir do estabelecimento do conflito central do filme, é muito difícil encontrar fôlego para manter o ritmo por muito tempo sem ser cansativo. Opta por entregar um filme com menos de 1h30, uma escolha que traz o bônus de um dinamismo na ação, mas o ônus da dificuldade do impacto justamente pela rapidez de tudo, fazendo com que o laço empático entre público e personagens até seja consolidado, mas com pouca espessura. O que também acaba limitando o escopo das atuações de Scodelario e Pepper, que se saem bem com o que lhes é dado, desenvolvendo algo para além do pânico.
Predadores Assassinos acaba sendo sensorialmente estimulante, até fazendo bons usos do sustos, mesmo que tal ferramenta hoje passe por uma certa desvalorização no olhar da crítica. Ecoando em boa parte os elementos mais inventivos de um terror submerso - como o clássico plano de ponto de vista da fera nadadora - o filme deixa a impressão de ser um (bom) exercício de estilo em relação a elementos específicos do gênero. Caso seja, vemos um bom caminho de amadurecimento na filmografia do diretor francês, que talvez desenvolva melhor tais habilidades apresentadas em algo ainda mais denso.