Marcelo Tas não é o criador do CQC. O formato é argentino – portenhos faziam parte da equipe que também estava na direção e produção do programa da Band – mas ele, sem dúvidas é o nome mais associado à atração que fez história na TV brasileira entre 2008 e 2015, até mesmo quando deixou o programa em 2014.
O jornalista de 58 anos achou um tempo em sua concorrida agenda para conversar com o Jornal do Commercio sobre o marco dos dez anos neste sábado (17) da estreia do “resumo semanal de notícias”. “Eu não tinha esse dia tão preciso na minha mente”, disse ele, por telefone, surpreso pela lembrança.
Sobre a gênese do programa no Brasil, Tas contou tudo nos mínimos detalhes. “Recebi um telefonema da Band – que naquela ocasião era a única emissora que eu nunca tinha trabalhado – em novembro de 2007. Eles não quiseram falar o que era, eu tinha ir até lá. Quando cheguei, a Elisabetta (Zenatti) – diretora artística da Band na época – mandou o convite de sopetão na sala dela”, relembra.
A surpresa só não foi maior para Tas por um detalhe: ele já conhecia o programa argentino. “Eu fiquei muito surpreso e disse a ela: ‘Elisabetta, eu tava esperando esse convite faz uns 15 anos, talvez até um pouco mais’. Ela falou: ‘Porquê? Você conhece o CQC?’. E eu disse: ‘Conheço! E conheci o CQC na Argentina bem antes deles estrearem até’”, relata, argumentando que conhecia até a atração argentina embrião do Caiga Quien Caiga, chamado La TV Ataca, exibido entre 1991 e 1993.
Desconfianças e ansiedades a parte, o início do CQC não foi fácil: “Eu sabia que ia causar. Para mim, o Brasil sempre quis esse tipo de viés jornalístico com humor. Eu tinha certeza disso. Eu só não sabia se ia durar muito tempo, porque sabia que ia ter porrada, que íamos receber o troco daquilo. Principalmente os políticos, que não iam gostar muito disso. Uma rede nacional como a Band, duas horas, ao vivo, mas eu disse: ‘Vamos lá, vamos ver quanto tempo que a gente dura’”.
O clima de tiro no escuro fez com que a própria Band assinasse contratos curtos com o elenco, até com o próprio Tas: “A ideia era para testar mesmo. Testar no ar”.
Para o jornalista, conseguir anunciantes foi outro ponto difícil para o CQC. “No início, é importante lembrar, que a gente ficou um bom tempo com um só anunciante, a quem eu agradeço publicamente, que era a Skol. Ela foi a única que teve coragem de patrocinar uma coisa que era muito ousada”, disse ele, agradecendo nominalmente a Fábio Fernandes, da agência paulista F/Nazca. “Acho legal falar isso porque, cara, a publicidade é muito medrosa. Se não fosse a Skol e o Fábio naquele comecinho a gente ia rodar”, reforça.
O esforço de Marcelo Tas em manter o programa interessante teve um forte aliado: as redes sociais. “O Twitter tinha nascido em 2007 e, o programa, em 2008. Então começamos a usar o Twitter desde o momento zero, num programa que já nasceu digital. Para mim, o CQC é o primeiro programa nativo digital da TV brasileira. E a resposta do telespectador por esta rede social foi fundamental para a evolução dele. É uma coisa que eu cuidei pessoalmente”, ressalta.
Quando o apresentador percebeu que não tinha mais como colaborar, deixou o projeto, sem arrependimentos. “Eu não sinto falta. Falta não faz parte do meu vocabulário. Mas te digo uma coisa: eu tenho o maior carinho pelo CQC. Todos os dias alguém fala dele para mim. Acho que foi um programa que revelou muito talento, renovando não só o humor, mas principalmente o telejornalismo. Eu percebo a influência do CQC em vários lugares, inclusive nos telejornais. Mas não tenho saudosismo, não mesmo”, completa ele, com sentimento de missão cumprida.
“O CQC pra mim foi uma atualização do meu aplicativo. (risos) Sabe quando atualizamos o aplicativo do telefone? Foi um momento que eu atualizei a minha vida profissional e creio que contribuí com a minha colaboração, para atualizar o humor e o jornalismo no Brasil”, conclui.
Marcelo Tas também fez questão de dar méritos à Band por ter colocado um programa como o CQC no ar e lhe dar todo o apoio necessário: “A Band teve muita coragem de botar esse troço no ar durante todo esse tempo. Ela foi responsável por segurar muitas barras pesadas que nós tivemos: gente ameaçando, querendo detonar a gente. Gente até me ligando tentando me pressionar, desestabilizar, e eu sempre tive na Band - especialmente no Johnny Saad e no diretor de jornalismo, Fernando Mitre - dois caras que me apoiaram toda vez que algum senador, algum deputado, alguns desses insetos tentaram me desestabilizar, o Johnny e o Mitre foram os caras que me deram apoio. E é por isso o CQC pôde ficar no ar por todo aquele tempo”.