Ariano Suassuna viveu como sonhou até os seus últimos dias

No romance ainda inédito, ele descreveu a cena de sua morte
Adriana Victor
Publicado em 23/07/2015 às 7:22
No romance ainda inédito, ele descreveu a cena de sua morte Foto: Geyson Magno/Divulgação


 

Ariano estava deitado em seu quarto, no casarão do Chacon, Poço da Panela. Depois do infarto, em agosto de 2013, havia decidido: queria voltar ao palco, às suas aulas-espetáculo, a escutar aplausos e risos que vinham da plateia. “Só sei viver com alegria”, ouvi dele, incontáveis vezes. 

Naquela tarde, leu deitado um trecho do último livro que escrevia, inédito até hoje. Comentamos sobre a obra, ele mostrou as ilustrações. Durante muito tempo, chamei de privilégio o fato de compartilhar momentos como aquele – até o dia em que o cantor Chico César, então secretário de cultura da Paraíba, me corrigiu: a palavra correta era dádiva. Foram, pois, 20 anos de dádiva. 

No trecho do romance revelado, Ariano descrevia a própria morte, que ocorria no palco, pouco antes de uma aula-espetáculo. Estava cercado por alguns de nós, companheiros de estrada, de trabalho, de vida: Josafá Mota, Antônio Madureira, Felipe Santiago, Samarone Lima, Juscelino Moura e eu. 

Ali entendi: precisava ser como ele desejava, até o último instante. Trabalhando, contando histórias (nunca suportou a palavra ‘causos’), ouvindo os sorrisos. Nos últimos tempos, tirando muitas fotos. “É trabalhoso, mas prefiro isso à indiferença e à hostilidade”, repetia. E, claro, com Zélia ao lado, amorosamente, incondicionalmente. 

“A arte é uma espécie de imortalidade. É um protesto contra a morte”, asseverava. Os 60 anos de João Grilo e Chicó confirmam isso; a perenidade e a magnitude do Romande d’A Pedra do Reino também. O novo livro certamente provará o mesmo. Walter Carvalho quer transformar em filme as ideias de Ariano; Luiz Fernando Carvalho, responsável pela direção de A Pedra do Reino, Uma Mulher Vestida de Sol e A Farsa da Boa Preguiça, planeja levá-lo de volta à TV. "Continuo com a idéia de trabalhar sobre Fernando e Isaura. Já fiz minhas primeiras anotações sobre o romance, mas nada ainda é definitivo", revela-nos Luiz. "Tenho revisitado também as observações do próprio Ariano, colhidas por mim nas longas conversas que tínhamos sobre como seria a adaptação do romance em seus mínimos detalhes. Desejo e fé não me faltam, mas tempo", afirma.  “Ariano é e sempre será um farol para mim”. Para todos nós, Luiz. 

 

 

 

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