Livro reúne fotografias do Recife feitas por Benicio Dias

Editada pela Fundaj e pela Cepe, a obra traz 158 imagens da coleção do artista pernambucano
Diogo Guedes
Publicado em 10/12/2015 às 5:29
Editada pela Fundaj e pela Cepe, a obra traz 158 imagens da coleção do artista pernambucano Foto: Benicio Dias/Fundaj/Divulgação


Ao fotografar as pessoas de Pernambuco e as mudanças nas paisagens do Recife, o fotógrafo Benicio Dias (1914-1976) não estava apenas registrando o presente da sua época. As imagens que produzia, mais do que funcionarem como documentos, eram carregadas de uma preocupação com a ideia de “pintar com a luz” – é por isso que traziam, ao mesmo tempo, uma preocupação social e de um olhar subjetivo. Como define a pesquisadora Rita de Cássia Barbosa de Araújo, o que Benicio terminou criando com as suas fotos foi a “possibilidade de construir memórias – diversas, múltiplas e mesmo antagônicas”.

Parte do acervo do fotógrafo, pertencente à Fundação Joaquim Nabuco, é apresentado agora no bonito volume Benicio Dias – Fotografias, organizado por Rita e por Albertina Otávia Lacerda Malta (Betty Lacerda) e editado em uma parceria entre a Cepe Editora e a Massangana. O lançamento quinta (10/12), às 19h, na sede da Fundaj de Casa Forte, reúne as pesquisadoras da obra e o filho do fotógrafo, o arquiteto Sérgio Benicio Whatley Dias, que escreve no volume um ensaio sobre a produção do pai.

O acervo de Benicio, doado à Fundaj no mesmo ano da sua morte, reúne 1.432 imagens – algumas são de autoria de outros fotógrafos e abarcam o Recife entre 1870 e 1950. Para o livro, foram escolhidas 158 fotos da coleção do artista, considerado um mestre pelo amigo Gilberto Freyre. Seu interesse pelo Recife, pelas mudanças urbanas e pelas pessoas da cidade não são por acaso: ele trabalhava para o Departamento de Documentação e Cultura da Prefeitura do Recife registrando a capital.

Benicio ressaltava, a partir da sua lente, o interesse pela cidade, vista com um olhar moderno e artístico. “Junto com Alexandre Berzin, ele via a fotografia não como um documento ou uma representação do real. Os dois vão propor outra linguagem, uma linguagem artística em que a subjetividade do sujeito não só está presente como é um fator qualitativo e um diferencial”, destaca Rita.

O livro, para ela, permite que o leitor participe da construção da memória da cidade a partir de décadas de muitas transformações urbanas. “Ele pegou o período em que o Brasil estava deixando de ser uma sociedade mais agrária para uma mais urbana, com a decadência de engenhos e a ascensão de um Recife mais fabril. Isso mudava os espaços físicos e as construções, como visto na reforma do Bairro de Santo Antônio”, ressalta a pesquisadora.

Uma das belezas das imagens dele é, portanto, o registro da tensão entre o velho e o novo na cidade. Como fala o seu filho Sergio no seu artigo, havia ali uma visão do “que o Recife tinha sido e estava prestes a perder”. “Tudo isso em um período em que os intelectuais e artistas produziram muito sobre a própria cidade. É entre 1920 e 1950 que vai se criando essa imagem do Recife, não só na ascendência de Gilberto Freyre, mas de outros nomes, como Josué de Castro”, destaca Rita.

As imagens de Benicio ajudam, para ela, a refletir sobre como tradição e mudança não precisam ser elementos antagônicos. Segundo a pesquisadora, Benicio Dias – Fotografias é uma obra importante porque reafirma a necessidade de se questionar a forma como a cidade é pensada e erguida. “A nossa elite, desde antes, não consegue conviver com as nossas memórias. Os interesses econômicos escolhem como a cidade é gerida, a despeito do patrimônio, do meio ambiente e das classes subalternas. As fotos ajudam a gente a pensar o momento atual”, comenta.

Outro aspecto da seleção são as imagens do povo, com vendedores de feiras e outros profissionais, dentro do que se convencionou de chamar de “tipos populares”, como a própria Rita conta. Era uma busca de vários fotógrafos da época, que tentavam, a partir desse povo autêntico, retratar melhor a identidade nacional e regional. “As fotos tinham essa ideia de mostrar o País através da própria aldeia”, explica a pesquisadora da Fundaj.

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