Elomar Figueira Mello acabou se tornando a espécie de figura mítica que ele mesmo desenhara, em 1979, no famoso refrão de O Violeiro: “Para o cantador e o violeiro, só há três coisas nesse mundo vão: amor, forria, viola – nunca dinheiro”. Desde 1980 ele vive na fazenda Casa dos Carneiros, no município de Vitória da Conquista, Bahia. Recluso, raramente aparece em público ou concede entrevistas. Tem passado grande parte da vida cuidando dos seus animais, balizando cercas, montando cancelas. E, sempre, compondo.
Algumas dessas criações mais recentes foram selecionadas e são apresentadas hoje no concerto Arioso – Árias para Ariano, às 21h no Teatro RioMar. Elomar sobe ao palco acompanhado do filho, o maestro e arranjador João Omar.
Aos 78 anos, Elomar mantém alto ritmo criativo. João adianta que um novo disco está em produção para contemplar essa fase da carreira. “Vai se chamar Riachão do Gado Brabo. Serão canções inéditas do meu pai, algumas jovens e algumas antigas que ainda não haviam sido gravadas”. Segundo ele, será lançado de forma independente, sem suporte de grande gravadoras. “Tirando o Cantoria (ao vivo com Xangai, Vital Farias e Geraldo Azevedo), todos foram lançados assim”. E revela uma curiosidade: “O disco não deve ter uma versão digital. Com ele a coisa é mais ‘manual’ mesmo. Apesar de que ele gosta de tecnologia e alta fidelidade. Compõe no computador. É o bode hi-tech!”, brinca.
O repertório do show intercala as composições operísticas (aqui em versão reduzida, sem orquestra), novas canções e outras mais conhecidas. O Violeiro, porém, não deve aparecer. “Ele prefere mostrar as inéditas. O objetivo é apresentar ao público essa produção nova”, comenta.
“O concerto é dedicado a Ariano para gente celebrar essas identidades do Sertão. Ele era um bom amigo e agora estamos chegando pela terra dele para fazer essa louvação”, afirma o maestro. Assim como o autor de Auto da Compadecida, Elomar carrega influência da cultura ibérica medieval e suas narrativas de confrontos, disputas de poder, catástrofes naturais, feitos épicos e trágicos. Trazem tanto a simbologia cristã quanto a música profana de menestréis errantes como Zé Krau, Zé Guelê e Zé Serradô. “Pegamos essa ideia para fazer uma homenagem, mas Ariano está sempre ligado ao Sertão e a meu pai. São dois grandes contadores de histórias”, aponta.
Novas gerações e ritmos
Apesar de sua discrição e quietude, Elomar permanece ativo com sua música, que atravessa gerações e gêneros musicais. Nó, o álbum de estreia da dupla banda voou, foi lançado no ano passado e conta com a voz rouca do músico na faixa Finado Tóta.
“Nós conhecemos Rossane, a produtora dele, em show que ele fez na Caixa Cultural. Mandamos um material bem básico pra ela, com umas três músicas gravadas em casa mesmo. Ficamos no aguardo, sabíamos que o que viesse seria lucro. Alguns meses depois recebemos a confirmação dele”, lembra o vocalista PC Silva, que na juventude foi influênciado por álbuns como Cantoria, ...Das Barrancas do Gavião e Na Quadrada das Águas Perdidas. “Essa era uma música mais voltada para referências de Elomar, apesar de o disco ser mais pop, como a gente sempre deixou claro. Depois tivemos que resolver como seria feita a gravação”.
Então PC e Carlos Filho, a outra metade da banda, foram até Vitória da Conquista. “Passamos um final de semana na Casa dos Carneiros e fomos muito bem recebidos. Eu brinco que nós conversamos sobre Adão e Eva até aqui. Ele disse que ficou curioso com essa, como ele chama, ‘alcunha’ Tóta porque todas pessoas com esse nome que ele conheceu tiveram um final trágico, como na música”, relata. “Pra gente, ter Elomar num disco de estreia já é um sucesso. Ele é muito criterioso no que tange à sua obra. Rossane comentou que, no mesmo dia em que mandamos o material, ele havia recebido uma solicitação de um maestro para regravar uma versão orquestral de, se não me engano, O Violeiro. E ele não aceitou, achou que já tinha sido gravada de várias maneiras e não era interessante pra obra”.
Ao mesmo tempo, Elomar também dá aberturas para sua obra. Aceitou, por exemplo, o pedido do músico amador Vitor Munhoz para fazer uma versão da mesma O Violeiro em forma de rap. "Fiquei sabendo que ele a ouviu e inclusive sugeriu uma alteração numa das partes da letra em que eu não cantei no 'sertanês' correto, ao que eu corrigi e re-enviei", conta Vitor.
“Ele ouviu e achou inusitado, até ousado da parte de quem propôs”, diz a produtora Rossane. Ele é muito autêntico e verdadeiro. Ele se interessa desde que cumpra os trâmites: uma proposta séria e que não distorce o dialeto que ele trabalha, que é o dialeto do sertanejo, a linguagem do homem do interior”.
SERVIÇO
Show Arioso - Árias para Ariano, de Elomar
Às 21h no Teatro RioMar
Ingressos: R$ 100 e R$ 50 (meia), à venda no Ingresso Rápido e na bilheteria do local
Avenida República do Líbano, 251, Pina. Fone: 4003-1212