NOVOS PASSOS

Coquetel Molotov 2016 tem bons shows, mas falha em infraestrutura

Festival recebeu cerca de sete mil pessoas durante mais de 12 horas de festa, mas ainda precisa se adaptar ao patamar que alcançou

NATHÁLIA PEREIRA e GG ALBUQUERQUE
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NATHÁLIA PEREIRA e GG ALBUQUERQUE
Publicado em 23/10/2016 às 21:26
Foto: Nathália Pereira/JC
Festival recebeu cerca de sete mil pessoas durante mais de 12 horas de festa, mas ainda precisa se adaptar ao patamar que alcançou - FOTO: Foto: Nathália Pereira/JC
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Em sua 13ª edição, o Festival No Ar Coquetel Molotov provou ter conquistado lugar de protagonismo no cenário musical pernambucano, ganhando dimensões dignas dos grandes festivais brasileiros. Mais de sete mil pessoas estiveram na Coudelaria Souza Leão, no bairro da Várzea, Zona Oeste do Recife, no último sábado (22), para conferir um lineup com alguns dos melhores shows do ano. Mas a quantidade recorde de visitantes como sinal de reconhecimento pelo bom trabalho teve consequências ligadas à falta de estrutura, revelando preparação insuficiente para o novo passo.

Por volta das 17h o clima ainda era de começo de evento. Os palcos Aeso, Sonic e Velvet, com shows simultâneos, tinham pequenos públicos direcionados as primeiras bandas, as pernambucanas Projeto Sal, AMP e Tagore. Havia foodtrucks e bares próximos a cada um dos polos dos shows e os banheiros – reforçados com a instalação de alguns químicos –  pareciam suficientes.

A proximidade entre os palcos facilitava a circulação entre os intervalos. A organização foi elogiada pela estudante Karina Moritzen, 23 anos, pelo segundo ano no Molotov. “Fiquei bem impressionada com estrutura, o cuidado com os detalhes”, disse ela, acompanhada pelo namorado Pedro Lucas Freire. Os dois são de Natal (RN) e vieram ao Recife para assistir às apresentações das bandas Ventre (RJ), Boogarins (GO) e BaianaSystem (BA).

Pouco depois das 18h, foi a banda carioca Baleia que começou a encher o espaço do palco Velvet, na área interna, apresentando canções de Altas, segundo disco da carreira que versa sobre o local do outro em meio à cidade. A boa recepção ao desempenho seguro e arrematado pelos belos vocais de Sofia Vaz construiu a cama em que os franceses da Moodoïd, projeto no qual Pablo Padovani é acompanhado por quatro musicistas, compartilhou pela primeira vez no Brasil o universo psicodélico de suas músicas.

No palco Sonic, Rakta e Deerhoof foram grandes surpresas. Pouco conhecidas, conquistaram o público com shows intensos e viscerais. Vindo de uma turnê na América do Norte e Japão, o trio paulistano Rakta criava atmosferas imersivas e ritualísticas, mas impulsionadas por um motor punk -- como em Conjuração do Espelho, faixa tocada só por bateria e tambores. O Deerhoof animou com o carisma da vocalista Satomi Matsuzaki e suas transgressões melódicas e padrões rítmicos incomuns. 

O reflexo do esgotamento dos ingressos começou a ficar nítido a partir das 22h, quando as filas para comprar comidas, bebidas e ter acesso aos banheiros já estavam bastante desconfortáveis. Quando a paulistana Céu apareceu para os fãs, perto das 23h, já era impossível entrar e sair da parte interna com rapidez e tranquilidade. Segura e mais afinada que nunca, ela deu prioridade às faixas do mais recente trabalho, mas cedeu lugar à gravações do Caravana Sereia Bloom (2012) e do Vagarosa (2009). Hit deste último, Cangote ganhou versão agitada, oposta à original, com arranjos flertando com o rock. Depois de Céu, a curitibana Karol Conka dominou completamente a situação. Acompanhada apenas por DJ, chegou ovacionada por fãs predominantemente mulheres e fez uma ode ao grito feminista que tem ecoado de muitos setores políticos e artísticos.

Já passava das 2h quando os graves da BaianaSystem chegaram para fechar a programação da área interna. Misturando experimentação eletrônica, percussão e guitarra baiana, o grupo fez todo mundo dançar, mas muita gente preferiu sair antes do término por causa da fila gigantesca que fazia voltas no gramado da Coudelaria: as vans disponibilizadas para levar as pessoas de volta à entrada da propriedade não deram conta da dimensão alcançada pelo festival, fazendo com que muitos esperassem mais de uma hora em pé até que conseguissem deixar o lugar, com o dia já claro. Na página oficial do evento no facebook foram muitas as reclamações sobre a situação.

Em nota enviada à imprensa, a organização reconhece as falhas e se compromete a corrigi-las para a edição 2017. “Sabemos que ainda é longe para isso, mas já nos comprometemos a melhorar esta infraestrutura e o atendimento para a edição do ano que vem assim como viemos melhorando em outros aspectos ano após ano. Somos todos profissionais nesta área, mas acima de tudo, amantes de música que estão contentes em ver que tanta gente veio atrás de uma opção de lazer e shows que diferem tanto do atual mainstream”, afirma o comunicado assinado pelo produtor Jarmeson de Lima.

PERNAMBUCANOS

Além de nomes de destaque do cenário nacional e internacional, o Coquetel Molotov deste ano dedicou um bom espaço de sua programação aos artistas locais. Os pernambucanos começaram a tocar à tarde, na abertura do festival, no Palco Aeso – maior e mais estruturado do que no ano passado, tornando-se de fato um palco e não uma tenda. A Projeto Sal, formada em 2012, estava com a carreira em stand by e retornou mostrando uma virada estilística: ao invés da musicalidade nordestina, a banda acentuava alguns timbres eletrônicos, buscando uma aproximação de uma linguagem pop/global –mudança que poderá ser ouvida em Sem Medo, Sem Freio, Sem Dor, EP que a banda deve lançar no ano que vem.

Este movimento é, de certa forma, análogo ao de Tagore, que abriu o Palco Velvet com o show de lançamento de Pineal. Influenciado por Tame Impala, a construção de suas músicas envolve um caráter textural mais forte, e esse foi o impacto principal de sua apresentação. No álbum, soa como um decalque do atual revival da psicodelia. Mas ao vivo, no calor do palco, as faixas ganharam brilho nas camadas sonoras e na manipulação dos pedais de efeito da guitarra. Os singles Mudo e Pineal, com participação de Benke Ferraz, guitarrista do Boogarins, foram os pontos altos.

Um pouco mais tarde, por volta das 20h, Barro fez o show de lançamento de Miocárdio, seu álbum solo. Apenas uma pequena parte do público conhecia o seu repertório, mas as canções provaram a sua força “pop-regional-cosmopolista” e envolveram o público. Em Piso em Chão de Estrelas, um forró pé de serra com beats eletrônicos, as pessoas dançaram juntihas. Barro teve participação especial de Juçara Marçal, vocalista do Metá Metá, em Nouvelles Vagues (gravada como dueto em Miocárdio) e Velho Amarelo (do repertório solo de Juçara). Contou ainda com a presença de Russo Passapusso, do BaianaSystem, com quem improvisou versos em ritmo de rap.

O rapper PRK, de Belo Jardim, foi uma grata surpresa. Escalado no pequeno espaço do Som na Rural durante a apresentação de Céu, o músico fez uma apresentação seca, crua e contundente. PRK começou a sua carreira em 2012, mas depois desta apresentação não é exagero considera-lo como um expoente importante da nova cena hip hop de Pernambuco ao lado de Diomedes Chinaski, Lívia Cruz e outros.

Por volta das 3h30, o duo pop-eletrônico Phalanx Formation subiu ao Palco Sonic. O show passou despercebido. Já cansados, os poucos que assistiam se sentaram na grama da Coudelaria. O show terminou com These DJs, música que ironiza os “DJs Pendrives”. A banda deixou o palco e colocou um manequim com os hits que sempre embalam essas festas.

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