“Sei que vou morrer/ Só não vou deixar de viver”, canta Nando Reis em Inimitável, faixa do disco Jardim Pomar, que ele lança em show amanhã no Baile Perfumado. Em seu primeiro trabalho de inéditas em quatro anos, o ex-Titãs fala principalmente sobre a finitude e os possíveis encantos da vida, apesar de seu inevitável fim. O cantor e baixista paulista participa de uma entrevista ao vivo hoje às 15h na página do Jornal do Commercio, no Facebook (facebook.com.br/jornaldocommercioPE/videos).
“Uma coisa muito presente tanto no disco como em toda minha carreira é um pensamento, quase uma dissertação sobre a finitude, a passagem do tempo, a nossa própria vida e a forma como vivemos. É um eixo que relaciona as músicas, mas não é um disco conceitual. As músicas se amarram à forma como eu penso”, ele comenta em entrevista por telefone.
Diante dessa finitude, surge um Deus. Porém, a sua visão é particularmente crítica: “Deus sumiu de repente/ Sinto tanto calor/ Esse fogo ardente/ Vem de outro senhor?”, diz a letra de Deus Meu. Apesar de tudo, o músico – que já evocou os Hare Krishnas com Mantra, um hit quando gravado no Acústico MTV de 2004 – não nega uma possível transcendência material.
“Deus é um conceito bastante vago e abstrato. Não sou um homem religioso. Deus Meu é uma certa ironia simbólica de uma ideia quase que moral, que é inclusive colocada em questão ali, o bem e o mal, a representação que tem com o diabo. É muito mais um questionamento, eu diria de desconfiança, de posicionamento sobre o quanto a existência de Deus não é uma verdade absoluta. No entanto, eu sei que a maioria das pessoas creem e entendo. Não significa que eu seja um cético. Acredito no milagre, mas não na divindade”, avalia.
Como o próprio reconhece, suas canções são quase sempre sobre amor. Nando já revelou que todas as suas músicas foram feitas para Vânia Passos, sua esposa, que o ensinou “a matriz do amor”. Desta vez a homenagem foi além: 4 de Março foi feita como um presente de casamento para ela. “Eu a conheço desde os 15 anos e somos casados há 32. É uma elegia à nossa história, quase descritiva, factual. Uma música muito autobiográfica”. Sobre a data do título, ele diz: “Não é o dia de nosso aniversário de casamento nem nada. É uma data particular, especial para nós. E mostra que cada casal tem seus marcos”.
Das 13 faixas, apenas Concórdia, cujos versos dão título ao álbum, não é inédita – foi gravada por Elza Soares no disco Vivo Feliz (2004). Apesar de ser o show de lançamento, Nando adianta que o repertório da sexta-feira irá além do disco novo e vai abarcar toda sua carreira, incluindo duas composições suas que fizeram sucesso com o Skank: Sutilmente e Dois Rios.
Jardim Pomar foi o disco que mais consumiu tempo e atenção de Nando Reis. Lançado de forma independente pelo selo Relicário, do próprio músico, o trabalho divido em etapas de produção de acordo com o orçamento arrecadado nos shows – o que justifica os quatro anos sem um disco de inéditas desde Sei (2012).
O disco começou a ser gravado em junho de 2015 e só chegou às prateleiras no final de novembro do ano seguinte. O processo de gravação aconteceu em duas partes: a primeira, em São Paulo, e a segunda em Seattle, nos Estados Unidos, com produção de Jack Endino, que assinou discos do Nirvana, Soundgarden, Mudhoney e é parceiro do ruivo desde a época dos Titãs. O baterista Barret Martin (ex-Screeming Trees) também tomou conta da mesa de som.
Além de Endino e Martin, outras parcerias foram retomadas. O ex-guitarrista do R.E.M. Peter Buck já gravou duas canções com o brasileiro e retorna agora com sua Rickenbacker de 12 cordas em Inimitável. O funk à George Clinton Azul de Presunto é quase uma reunião dos Titãs 25 anos depois. Nando tem a companhia de Arnaldo Antunes, Branco Mello, Sérgio Britto e Paulo Miklos, além de Tulipa Ruiz, Zizi Possi, Pitty e os filhos Theo, Sebastião e Zoé. Há também uma colaboração inédita: Mike McCready, guitarrista fundador do Pearl Jam, sola em Pra Onde Foi?.
O disco foi lançado nas plataformas digitais e também em CD e LP duplo com caprichada arte gráfica assinada pela artista paulista Vânia Mignone – uma das preferidas de Nando, que possui uma pequena coleção de arte com a esposa.