Belchior de rapaz latino-americano sem dinheiro no bolso a ídolo pop

Em 1976, ele estourou com Alucinação, a trilha de uma geração
JOSÉ TELES
Publicado em 25/02/2016 às 9:53
Em 1976, ele estourou com Alucinação, a trilha de uma geração Foto: foto: divulgação


"Na Hora do Almoço, vencedora do festival, serve para ilustrar um hábito muito freqüente no concurso: vários compositores foram buscar assunto em autores consagrados. Essa, por exemplo, foi em cima de Caetano Veloso e, se isso não chega a ser um pecado, pelo menos, a comparação é inevitável e aí (alguém duvida?), o autor perdeu de goleada". A crítica acima é do Jornal do Brasil, em 8 de setembro 1971, sobre a final do Festival Universitário da Música Popular Brasileira. As alfinetadas vão para o autor que tirou o primeiro lugar ­ Belchior ­, um desconhecido cearense estudante de medicina (a letra da música realmente tem semelhanças com Deus vos Salve Esta Casa Santa, de Caetano Veloso e Torquato Neto, gravada por Nara Leão em 1968).

Seis anos depois, agosto de 1977, a notícia de capa do mesmo JB (então o jornal mais importante do país): "19 PMs do 13º Batalhão, seis soldados do patrulhamento tático móvel do 1º BPM, e oito seguranças quase não conseguiram conter ontem a multidão ­ mais de três mil pessoas ­ que tentava invadir o Teatro João Caetano para assistir ao show da dupla Belchior e Simone, na sessão das seis e meia. As filas começaram às 11h30, mas a aglomeração que congestionou todo o trânsito da Praça Tiradentes, atingiu o clímax às 16h30, quando as portas foram do teatro foram baixadas". Naquele ano, Belchior tornara-­se o nome mais quente da música popular brasileira. Depois de batalhar durante cinco anos, lançar um LP pelo qual ninguém se interessou, ele gravou pela Phillips um álbum cercado de expectativas, e avalizado por Elis Regina, que incluiu duas composições suas ­ Como Nossos Pais e Velha Roupa Colorida ­ em Falso Brilhante, disco que lançou no começo de 1976.

"Belchior que, depois de trabalhar se apresentando em igrejas, quadras de esporte, praças públicas e escolas, durante todo o ano de 1975, no interior de São Paulo, está tendo, finalmente, a oportunidade de interpretar as próprias composições em seu primeiro disco individual". A nota é de exatamente 40 anos atrás. Ele começava a gravar um álbum cujo título inicialmente seria Populus, com direção musical de Zé Roberto, do Azimuth (foi produzido por Roberto Menescal): "As letras são longas, em geral em cima de temas do cotidiano. Vão entrar também algumas canções autobiográficas, quase confessionais, que traduzem a vivência de um nordestino numa cidade como São Paulo", adiantava Belchior, na coluna Gravando, do JB. O cantor e compositor cearense, nesse ínterim, já havia feito a devida passagem pela censura do regime militar. De 15 canções que enviou para serem analisadas, 12 foram liberadas e três ficaram retidas. Ele precisou ir à Brasília para tentar demover os censores. Conseguiu que liberar uma intacta, e fez modificações em outras duas, Apenas Um Rapaz Latino­Americano, por exemplo, teve uma estrofe inteira alterada, assm como mexeu nos versos de Não Cante Vitória Muito Cedo.

Sucesso pode ter sido demais

Alucinação não teve um alcance maior porque a Phillips desacelerou a divulgação, ao saber que o cantor estava indo para a Warner Music, que entrou agressivamente no mercado do disco formando seu cast com artistas bem sucedidos de outras gravadoras (até então seu catálogo era lançado no Brasil pela Continental). Selvagem, a estreia de Belchior na Warner, era formado em parte por músicas antigas (inclusive Populus, que quase batiza Alucinação), porém mais consistente, menos panfletário do que o anterior. Tem clássicos como Todo Sujo de Baton, Paralelas, e Galos Noites e Quintais.

Este álbum e Alucinação são o auge em popularidade de Belchior. No disco seguinte, Todos os Sentidos, de 1978, ele dá uma guinada de 180 graus, surpreendendo com a temática romântica, flertando com o funk eletrônico (Corpos Terrestres), disco music em Como Se Fosse Pecado. Dedica música a Ney Matogrosso e canta com As Frenéticas, o grupo mais famoso da incipiente discoteca nacional. Se Belchior nunca fora o favorito da crítica, com o show de Todos Os Sentidos virou quase unanimidade em resenhas negativas: "... o artista não cria para adular a crítica ou o público. Faço o que acho necessário fazer... Nunca fiz uma proposta de pureza nordestina E não consigo ver nas criticas à minha música reconhecimento da características do meu trabalho" , declarou o cantor.

(leia matéria na íntega naedição impressa do Jornal do Commercio) 

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