RETROSPECTIVA/EXPECTATIVA: Perdas foram maiores na política cultural

Ano foi marcado por mudanças no MinC ao cancelamento de incentivos para eventos importantes do calendário local
NATHÁLIA PEREIRA
Publicado em 31/12/2016 às 9:00
Ano foi marcado por mudanças no MinC ao cancelamento de incentivos para eventos importantes do calendário local Foto: Foto: Porto Musical/Divulgação


O ano de 2016 foi marcado por mudanças e baixas importantes na política cultural no Brasil, desde as alterações no Ministério da Cultura (MinC) ao cancelamento de incentivos vindos da secretaria municipal. Um dia após assumir interinamente a presidência da República, em maio, Michel Temer extinguiu o MinC, em atividade desde 1985. Vinculado ao Ministério da Educação e rebaixado ao status de secretaria, o setor passou a ser responsabilidade do ministro Mendonça Filho, decisão que caiu como uma fagulha entre artistas e agentes culturais em todo o País. Atos de repúdio à extinção foram organizados em mais de 18 capitais pelo movimento Ocupa Minc.

Menos de dez dias após ser extinto, Temer voltou atrás, mantendo o MinC e convocando para assumi-lo o diplomata Marcelo Calero, uma resolução “para serenar os ânimos”, afirmou Mendonça Filho. A medida provisória para a recriação do Ministério foi aprovada na Câmara dos Deputados já em setembro. Dois meses depois, Marcelo Calero pedir demissão do cargo, alegando divergências com membros do governo. Em pouco mais de seis meses na função, Calero encabeçou medidas como a exoneração de 70 funcionários de instituições ligadas ao MinC e a convocação do economista Alfredo Bertini, realizador do festival Cine PE, como secretário nacional do Audiovisual, desagradando os cineastas pernambucanos. Calero também afirmou ter descoberto um desfalque de R$ 1,34 bilhão nas contas do Ministério e anunciou a intenção de reformular a Lei Rouanet.

Com a saída do diplomata, o deputado Roberto Freire (PPS–PE) foi convidado por Temer a ocupar o cargo. Entre as medidas já tomadas, a nomeação do ator Stepan Nercessian como presidente da Funarte e da empresária recifense Maria do Céu como chefe de representação do MinC no Nordeste. De passagem pelo Recife, em novembro, Freire reforçou o discurso de Calero sobre a necessidade de uma reorganização da Lei Rouanet, se dizendo favorável às políticas de incentivo cultural. Um antigo projeto de lei, por diversas vezes reformulado, tramita há anos no Congresso Nacional. Procurada pela reportagem do JC, a assessoria do Ministério da Cultura informou que o ministro Roberto Freire está cumprindo a primeira viagem oficial ao Rio de Janeiro e não poderia falar no momento. 

No âmbito estatal, o ano ficou marcado pela falta de apoio à eventos já consagrados no calendário pernambucano. Programada para o início de dezembro, a Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto) foi cancelada, de acordo com Antonio Campos, membro do Conselho Cultural da feira, por falta de suporte financeiro do Estado. Em comunicado, a administração da Fliporto afirmou que sequer conseguiu protocolar documento solicitando recursos por causa da antecipada negativa estatal. Por meio de nota divulgada pela Empetur, então patrocinadora da Fliporto, o Governo de Pernambuco rebateu, dizendo não ter recebido requerimento de apoio para a edição 2016. Na trilha dos cancelamentos, o Porto Musical 2017 teve o anúncio da suspensão feito via Facebook pela produtora Melina Hickson. O festival perdeu o apoio do BNDES, principal patrocinador, e “as respostas dos governos estadual e municipal não vieram a tempo”, afirmou Melina.

Mudanças nas regras dos fundos de incentivo a Cultura para 2017 foram anunciados há cerca de uma semana. O Funcultura terá orçamento de 42,2 milhões, sendo R$ 20 milhões para o Audiovisual e R$ 4,55 milhões destinados ao novo edital, específico para a música. A Lei do Patrimônio Vivo também sofreu alterações, passando a nomear seis e não mais três patrimônios ao ano, além de ter aumentado a bolsa vitalícia para R$ 1,6 mil para pessoa física e R$ 3,2 mil para jurídica. 

Além disso, um novo mecanismo passa a valer: o Mecenato de Pernambuco, por meio do qual empresas poderão financiar projetos através de um fundo gerido pela Secult em troca de dedução fiscal. Cerca de 10% dos valores investidos irão para o Credicultura, fundo para viabilizar ações de baixo valor. Reclamação frequente entre os artistas, os atrasos nos pagamentos serão discutidos, segundo afirmou a presidente da Fundarpe, Márcia Souto. “Temos que avançar muito e trabalhar a prioridade nos pagamentos”, assegurou.

Já a Secretaria de Cultura do Recife começou o ano de eleições municipais com a notícia de que o festival Rec–Beat, um dos mais importantes da cidade, sofreria um corte de 50% no valor do patrocínio fornecido pela Fundação de Cultura. Em agosto, artistas recifenses redigiram carta aberta aos candidatos à prefeitura solicitando, entre outros tópicos, o cumprimento do Plano Municipal de Cultura e a volta do lançamento de editais por meio do Sistema de Incentivo Municipal de Cultura (SIC). 

“Como militantes da Cultura que somos, entendemos a urgência da classe artística para que todos os problemas sejam resolvidos e sofremos juntos com ela quando as dificuldades parecem ser maiores que os resultados, mas temos a certeza de que demos passos importantes e estruturadores para o fortalecimento de uma Cultura que valorizou o artista local e popular, que são aqueles que conseguem traduzir a alma do nosso povo”, afirma a secretária de Cultura Leda Alves. 

Com as atenções voltadas às festas de Réveillon, ainda não há previsão de orçamento para o ano que vem e a reunião prevista para acontecer no último dia 20/12 com o produtor do Rec–Beat, Antonio Gutierrez, não aconteceu. Entre os objetivos listados pela Secretaria para 2017, no entanto, estão “reduzir o espaço de tempo entre as apresentações e os pagamentos de artistas, buscar parcerias financeiras para a continuação da reforma do Teatro do Parque (fechado há seis anos), dar andamento aos estudos de uma nova proposta para o SIC e expandir as ações para a Rádio Frei Caneca”.

SAIBA MAIS

RETROSPECTIVA

Brasil

- Extinção do MinC

- Vinculação ao Ministério da Educação como secretaria

- Retomada do Ministério, com nomeação de Marcelo Calero

- Pedido de demissão de Calero, alegando divergências com o governo

- Nomeação de Roberto Freire como ministro da Cultura

 

Pernambuco

- Retirada de R$ 1,150 mi da Cultura para o pagamento de auxílio funeral de servidores

- Cancelamento da Fliporto 2016

- Cancelamento do Porto Musical 2017

- Anúncio do Funcultura da Música

- Anúncio da ampliação de nomeações e bolsas para os patrimônios vivos

 

Recife

- Perda de 50% do valor do patrocínio da Fundação de Cultura para o Rec-Beat Festival

- Artistas solicitam mudanças nas políticas de incentivo aos candidatos à prefeitura

- Participantes do Festival A Letra e a Voz, realizado em agosto, denunciam falta de pagamento

- Teatro do Parque chega ao sexto ano de fechamento sem conclusão da reforma

 

EXPECTATIVA

Brasil

- Reformulação da Lei Rouanet, através de projeto em tramitação no Congresso Nacional

 

Pernambuco

- Implementação da Lei do Mecenato

- Encaminhamento à Alepe de Projeto de Lei que altera a SIC

- Implementação do Funcultura da Música

- Abertura de espaço no Funcultura para projetos do interior

- Informatização do Funcultura pela Secult-PE

 

Recife

- Regulação da contratação, cachês e dos apoios financeiros a artistas e grupos culturais

- Promoção de apoio financeiro às Quadrilhas Juninas

- Ampliação da Rádio Frei Caneca

- Reforma da Escola de Frevo do Recife

- Modernização das duas Freviocas

- Ampliação e modernização da Agenda Cultural do Recife

- Requalificação e reativação do Sistema de Incentivo à Cultura (SIC) e do Fundo de Incentivo à Cultura (FIC)

- Reestruturação e modernização da Secult-Recife/FCCR, criando o Plano de cargos e salários para os trabalhadores da Cultura

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Retrospectiva/Expectativa Retrospectiva 2016 políticas públicas Políticas culturais
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