Artistas nascidos em outros estados 'adotaram' Recife e Olinda

Tom Zé, Elba Ramalho, Karina Buhr, Helder Aragão e outros falam da relação com as cidades
JC Online
Publicado em 12/03/2017 às 12:12
Tom Zé, Elba Ramalho, Karina Buhr, Helder Aragão e outros falam da relação com as cidades Foto: Reprodução


Ao longo do tempo, Recife e Olinda se desenvolveram de formas diferentes e moldaram personalidades próprias. No entanto, as cidades-irmãs, que fazem aniversário neste domingo (12), têm mais características que as aproximam do que afastam, principalmente no que diz respeito à arte. Plurais e antropofágicas, se tornaram berço ideal para o florescimento cultural que, até hoje, encanta e atrai artistas ao redor do Brasil e do mundo. Para celebrar esse espírito, o JC conversou com artistas de outros estados que moram nas cidades ou que, de alguma forma, criaram laços especiais com elas, tendo suas trajetórias artísticas modificadas pela vivência no Recife e Olinda.

 

DEPOIMENTOS

Jeff Colas (FRA), chef francês
Minha vinda para Recife/Olinda foi por acaso, no final de 1985. Na época, morava em Rondônia e um amigo pernambucano me convidou para conhecer o estado. Foi golpe baixo: me encantei com o que eu conheci, a cidade de Recife, o litoral e, sobretudo, Olinda. Sempre fui apaixonado pela história e Olinda são histórias... suas cores, sua natureza via quintais, colinas, tudo isso me encantou.

Habib Zahra, escritor egípcio
Cheguei em Olinda em janeiro 2005, e nunca mais consegui sair. Até tentei... Passei uma temporada no Rio de Janeiro, depois, junto com Valeria, na Chapada Diamantina, mas sempre acabo voltando. O que mais me atrai em Olinda não é necessariamente que ela é uma cidade histórica, mas principalmente sua riqueza artística e cultural. A cultura de rua, os ateliês abertos, as sambadas nos becos e terreiros, os blocos nas ladeiras o ano todo, os músicos e artistas do mundo inteiro chegando aqui para beber da fonte e participar das brincadeiras. Isso é uma maravilha, os verdadeiros tesouros da cidade.

Valeria Rey Soto, ilustradora espanhola
Vim em 2007, graças a uma bolsa de intercambio da minha faculdade na Espanha com a UFPE. [O aspecto que mais a encanta na cidade é] a cultura popular pernambucana, onde se mistura brincadeira com beleza e comunhão em um encontro mágico. [A cidade influenciou seu o trabalho pois] Não posso dissociar vida de obra.

Ronaldo Correia de Brito, escritor cearense
Vim para o Recife, em 1969, fazer vestibular de medicina. Vivíamos a ditadura militar, e apesar do tempo sombrio, me apaixonei pela cidade. Morava na Casa do Estudante, na Cidade Universitária, e dava aulas num sindicato na zona do porto e dos cabarés. Isso me aproximou de um Recife marginal. Acho que não teria chegado à minha literatura sem os 48 anos de Recife. Em quase tudo que escrevo, a cidade bota as unhas de fora.

Patrick Torquato, produtor musical e DJ baiano
Recife e Olinda para mim é como se fosse um corpo com dois corações. São dois lugares que pulsam uma cultura, uma música, uma identidade que sempre mexeu muito comigo desde a infância. Sou de Paulo Afonso, e a gente tinha uma influência grande do Recife. A sensação que tinha é que daqui brotava um Brasil com características tropicais, mas que trazia o Brasil em si. Recife e Olinda compreendem essa coisa entre a sujeira e a beleza, entre a distorção e a pureza, algo que encanta muito quem é de fora e que pulsa no peito de quem é daqui.

Tom Zé, músico baiano
Nasci duas vezes: em 1936, em Irará (BA), depois no Recife, no começo dos anos 2000, quando acabei o Abril Pro Rock, fui para o hospital do coração, colocaram um canudo no meu coração, então nasci outra vez aí. Antes, quando o Tropicalismo estava se formando, Caetano cantava Dora e, quando ele começava a cantar, o som do telégrafo da polícia entrava no som do teatro e isso, antes da ditadura. De certo modo, era uma informação vinda anteriormente pelo espírito do Recife, que liga todos os tempos e lugares, de que a gente ia ser preso pela ditadura. Além disso, quando eu era criança, na rádio ouvia “Recife falando para o mundo”, e pegava em Irará fortemente e seguia para o mundo (risos).

Karina Buhr, cantora baiana
Vim para o Recife em 1981 e minha relação é de pertencimento. Sou de Recife e adoro quando um monte de gente me fala "eu jurava que você era de Olinda!" (risos). Tenho uma ligação muito forte com Olinda, com o carnaval, mas não só com ele. Nasci em Salvador (cidade pai) e Recife (cidade mãe) é onde vivi a maior parte da minha vida e ainda vivo, apesar de morar em São Paulo. Represento Recife/Pernambuco onde quer que eu vá, inclusive acho estranho ser entrevistada como "artista de fora". Fui baiana do maracatu Piaba de Ouro, fui do baque do Estrela Brilhante do Recife. Já dormi muito no chão da Dantas Barreto, Pátio do Terço e redondezas nas intermináveis horas em que esperava pra desfilar na Guararapes. Foi em Olinda o primeiro ensaio da Comadre Fulozinha, banda que batizei e onde toquei minhas primeiras músicas.
Helder Aragão (DJ Dolores), músico sergipano
Depois de mais de 30 anos aqui, me considero um recifense, porque tudo o que eu fiz na minha vida, as coisas mais importantes, são ligadas à cidade, foram inspiradas pela cidade, influenciadas por um pensamento local, pelas pessoas daqui. E acho que consegui retribuir isso algumas vezes representando o Recife viajando. A minha história de vida se confunde com as últimas décadas da cidade, só tenho a agradecer por ter sido bem recebido e comemoro com muita felicidade o aniversário de Recife e Olinda.
Elba Ramalho, cantora paraibana
Como paraibana, sempre tive relação muito estreita com Pernambuco. Conheci Recife logo cedo e sempre admirei essa cultura forte que o estado tem. Tenho muitos amigos pernambucanos e sou muito influenciada pela cultura de Pernambuco. Recife é uma cidade linda, que sempre me recebe com muito amor. É evidente que essa cultura influencia tudo que eu faço.

Manuel Castomo, pesquisador e dançarino moçambicano
Quando se fala da relação com Recife e Olinda, acho que falamos no geral do Brasil e sua relação com história de Moçambique em particular o continente africano. Conhecer Recife e Olinda é estar ciente que estamos diante de uma relação de formação cultural do mosaico vindo de vários pontos de África. Somos distantes, mas unidos pelos códigos dinâmicos da cultura ancestral. Aqui tive minha filha, Zahara. Olinda e Recife serão grande lugares da minha memória artística.
Naná Sodré, atriz carioca
Em 1992, vim passar o Carnaval. Me apaixonei. Fora que, Recife, também fora do Carnaval, anda num clima muito festivo e isso me encantou. Fora a cultura, o frevo, o maracatu, a ciranda, essa negritude que está na rua, as pontes, os rios. Em 1994, voltei e estou desde então. Sou casada com um pernambucano, tenho uma filha pernambucana, e Recife e Olinda têm influência muito grande no meu trabalho porque investigo negritude e isso aqui é muito forte.

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