A Justiça de São Paulo decretou o sequestro dos bens de dois fiscais do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Eles são acusados de integrar uma quadrilha formada por agentes da Receita Estadual que cobravam propina de empresas com dívidas tributárias.
Segundo as investigações do Ministério Público Estadual (MPE), os fiscais José Roberto Fernandes e Eduardo Takeo Komaki são donos de 39 imóveis (entre terrenos, escritórios comerciais e apartamentos de alto padrão). Os promotores pediram o sequestro de bens de outros oito fiscais, mas ainda não houve resposta da Justiça.
Conforme os promotores do Grupo Especial de Combate a Delitos Econômicos (Gedec), autores de crimes financeiros, quando são descobertos, costumam "dilapidar" o patrimônio para assegurar o proveito do delito. Em caso de condenação, o Estado fica no prejuízo. Por isso, a necessidade de bloquear os bens dos investigados enquanto durar o processo.
As investigações, feitas em conjunto com promotores do Grupo de Combate do Crime Organizado (Gaeco) de Sorocaba e do Patrimônio Público da capital, apontam que Fernandes tem 27 imóveis. Outros 12 são de Komaki. Segundo os promotores, eles montaram empresas de administração de bens e colocaram alguns imóveis no nome delas para tentar burlar uma eventual fiscalização sobre o suposto enriquecimento ilícito. A reportagem não conseguiu localizar os advogados de Fernandes e de Komaki ontem à noite.
Alguns imóveis foram comprados em conjunto. É o caso de dois escritórios localizados na Alameda Iraé, no Planalto Paulista, zona sul da capital. Eles declararam que pagaram R$ 900 mil, mas a suspeita da investigação é de que o preço real seja pelo menos o dobro. A maioria dos bens está em Sorocaba, onde atuavam. São apartamentos de alto padrão em condomínios fechados, terrenos e salas comerciais localizados em bairros nobres da cidade.
MÁFIA - Ao todo, dez fiscais chegaram a ser presos pela Operação Zinabre entre julho e agosto deste ano - todos estão soltos -, acusados de cobrar R$ 35 milhões em propina de pelo menos duas empresas. Uma delas, a Prysmian Energia e Cabos e Sistemas do Brasil, admitiu ter pago R$ 17 milhões nas filiais de Sorocaba, Jacareí e Santo André entre 2006 e 2013. A outra empresa, que não teve o nome revelado, deu mais R$ 12 milhões. Segundo os promotores, os acusados adquiriram patrimônio totalmente incompatível com o salário de funcionário público, graças ao esquema.
Em depoimento ao MPE, o advogado Daniel Sahagoff, apontado como intermediário da Prysmian na negociação de propina com os fiscais, afirmou que José Roberto Fernandes foi promovido ao cargo de inspetor dentro da delegacia regional tributária de Sorocaba por causa do "sucesso" do esquema. Segundo a investigação, a promoção aconteceu após o primeiro pagamento de propina recebido por Fernandes, no valor de R$ 1,2 milhão, entre 2006 e 2007.
De acordo com o Diário Oficial do Estado, ele foi nomeado inspetor fiscal na delegacia de Sorocaba em abril de 2007. O cargo é responsável por supervisionar as equipes internas e externas de fiscalização e fica abaixo apenas do delegado na hierarquia local. Ele foi afastado no dia 24 de julho, quando foi preso no setor de embarque do aeroporto de Natal (RN).
Para o MPE, os altos valores cobrados de propina pelos fiscais e a promoção interna de agentes suspeitos de corrupção reforçam os indícios da participação de servidores que ocupam cargos superiores no esquema. Essa suspeita já levou a Justiça a proibir, a pedido dos promotores, que a Secretaria Estadual da Fazenda faça novas fiscalizações na Prysmian. Para a juíza, as ações poderiam configurar "retaliação" e "intimidação" de vítimas da quadrilha.
Segundo o presidente da Prysmian à época, Armando Comparato Júnior, a ação da máfia do ICMS levou a multinacional a fechar a fábrica de Jacareí e a transferir parte da produção de cabos e sistemas de energia para uma nova planta na cidade de Joinville, em Santa Catarina. A informação consta na denúncia oferecida pelo MPE contra nove agentes suspeitos de integrar a quadrilha.
YOUSSEF - Os crimes envolvendo os fiscais da Receita Estadual foram descobertos graças ao depoimento do doleiro Alberto Youssef - um dos principais delatores da Operação Lava Jato. Em junho, ele deu detalhes aos promotores de como conseguiu repassar US$ 2 milhões em dinheiro para fiscais, em duas ocasiões. Também forneceu mais nomes de agentes e detalhes de outras operações financeiras para pagar propina aos fiscais do ICMS.
Em setembro, um dos fiscais acusados de integrar a máfia fechou acordo de delação premiada com o MPE. O suspeito decidiu colaborar com as investigações em troca de benefícios da Justiça, como a diminuição de pena, em caso de condenação.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.