A Receita Federal está fazendo um pente-fino no programa de repatriação - que permite a regularização de recursos enviados ao exterior. Contribuintes suspeitos de terem declarado dinheiro de origem ilegal serão intimados já a partir de agosto e setembro. O foco da Receita são pessoas com rendimento incompatível com o patrimônio declarado. Quem não comprovar a regularidade dos ativos declarados será excluído do programa e os dados informados serão usados em investigações.
Um dos primeiros grupos que passará pelo pente-fino é o de servidores públicos. Por razões estratégicas, o órgão não divulgou o número de funcionários estatais que aderiram ao programa, mas há servidores com milhões em recursos repatriados, o que poderia ser um indício de participação em corrupção.
Chamaram a atenção da Receita casos como o de um servidor que ganhava abaixo do teto constitucional, hoje em R$ 33,7 mil, e declarou cerca de R$ 20 milhões em recursos que até então eram mantidos em um paraíso fiscal. Para alcançar esse patrimônio, esse funcionário teria que juntar todo o dinheiro que ganha mensalmente por pelo menos 50 anos.
Também há suspeita de que bens estejam sendo regularizados em nome de "laranjas" para lavar dinheiro obtido de forma irregular Na primeira etapa da repatriação, em 2016, houve a adesão, por exemplo, de empregados domésticos. Há indícios ainda de que 241 declarantes já tenham morrido. Cinco políticos também apresentaram declaração, o que não é permitido por lei.
"Há dados que são inverossímeis. Por que um funcionário público precisa esconder dinheiro lá fora?", questiona o subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Iágaro Martins. "A Receita vai intimar formalmente esses contribuintes, que terão de comprovar a origem lícita dos recursos repatriados."
A lei da repatriação prevê que só podem ser declarados recursos obtidos em atividades regulares, sob pena de exclusão do programa. Os dados de quem aderiu ao programa não podem ser usados como único indício em investigações criminais nem para fundamentar processos tributários, mas poderão reforçar procedimentos já em andamento ou que venham a ser abertos no futuro. Além disso, o entendimento é que a anistia dada pelo programa só vale para crimes tributários, ou seja, quem repatriou dinheiro de corrupção, por exemplo, pode ser processado criminalmente e as informações declaradas utilizadas nessa investigação.
Em junho, a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba denunciou o ex-gerente da Petrobrás Márcio de Almeida Ferreira por lavar R$ 48 milhões de propina com a Lei da Repatriação.