SÃO PAULO – Menos de um mês após a derrota do PSDB nas eleições, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998/1999-2002) atacou duramente a gestão da presidente Dilma Rousseff, reeleita no último dia 26 com 51,64% dos votos.
“A situação do Brasil é difícil. Temos que reconhecer. Não tem como cumprir a meta de superávit fiscal. A Dilma disse que eu quebrei o País três vezes. Mas quem está quebrando é a Dilma”, criticou FHC ao sair de um evento promovido pela Symantec, empresa que lidera o mercado de segurança na internet e armazenamento em rede.
As críticas do ex-presidente foram dirigidas ao projeto enviado pelo governo federal na última terça-feira. Com as contas no vermelho, o governo recorreu mais uma vez a uma manobra fiscal (e agora política também) com o objetivo de descumprir a meta de superávit fiscal (economia para pagar os juros da dívida) que havia sido aprovada no Congresso.
Com a brecha, o Planalto quer o aval do Legislativo para excluir investimentos do Programa de Aceleração de Investimentos (PAC) do cálculo que mede a as saúde financeira do Executivo. Desonerações tributárias, utilizadas fortemente pelo governo Dilma, também devem ser excluídas da fórmula. A estratégia do governo pode ser resumida da seguinte forma: como gastou mais do que manda a lei, pede agora ao Congresso que parte dos gastos não seja computada. Com isso, mesmo que artificialmente, não poderá ser acusado de descumprir a meta de superávit fiscal, fixada e aprovada na Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Até setembro passado, o governo acumulava um déficit de R$ 15,4 bilhões e não conseguiria atingir, neste ano, o superávit de 2,15% do PIB, como manda a lei. Com a lei da forma como está, o governo pode abater até R$ 67 bilhões do cálculo da despesa. Aprovada a manobra no Congresso, o desconto seria de R$ 130, 4 bilhões. O governo, então, curiosamente, deixaria de fechar o ano com déficit para fechar com superávit.
Questionado se a medida do Planalto poderia ser considerada um estelionato eleitoral, FHC, impaciente, disparou: “É mais um. Depois vem outro e outro”. Durante toda a campanha eleitoral, o candidato do PSDB a presidente, Aécio Neves, acusou a presidente Dilma de estar gerindo o País de forma temerária. Dilma reagia afirmando que Aécio queria privatizar as estatais e reduzir os investimentos sociais.
Antes das críticas políticas ao governo Dilma, Fernando Henrique Cardoso falou, em pé, durante 45 minutos para centenas de executivos e técnicos do setor de tecnologia.
Ao fim da palestra, após abordar diversos temas da macropolítica global e evitar falar em política no Brasil para o público, o ex-presidente respondeu a algumas perguntas, entre elas, qual era o segredo de sua vitalidade. “Remédio”, respondeu, para risos da plateia. Depois explicou: “Tem que ter motivação e fazer exercícios. Tenho uma genética boa também”. FHC também comentou seu modelo de administração enquanto esteve à frente do governo. “Primeiramente tem que saber falar com o País, tem que saber falar com o Congresso. Do contrário, o Congresso fecha a cara e não passa nada. E é preciso falar também com a própria equipe. Não adianta só dar ordem porque se não a coisa não anda”. Essas últimas palavras foram interpretadas por muitos como uma alfinetada na postura de Dilma à frente da Presidência.
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