As lojas no Centro do Recife estão fechando as portas. E não é somente por conta da crise. O aluguel na praça, dizem os empresários, ficou salgado demais, desproporcional. Muitos lojistas não têm conseguido resistir à concorrência, numa disputa que vai além da ocupação asiática, sobretudo a chinesa. O comércio naturalmente descentralizou-se. Hoje não é mais preciso ir à Cidade para fazer compras. As lojas estão também nas periferias, praticando preços semelhantes e igualmente repletas de promoções para enfrentar o momento econômico. Além disso, o retorno da violência, já há algum tempo, tem repelido quem costumava frequentar as tradicionais ruas Nova, do Rangel, do Livramento, da Imperatriz, Duque de Caixas, das Calçadas, da Praia, da Palma. A chuva também é um agravante nesta época do ano, inclusive porque piora o já precário transporte público.
Num passeio por essas vias, o que se vê são lojas cheias de ninguém. Ocupadas pelos próprios vendedores. Está difícil vender, mesmo com os saldões. O fechamento das portas cresceu desde o início do ano. A Esplanada, por exemplo, resolveu encerrar as atividades no Estado, porque não estava sendo rentável manter as duas unidades na capital (Avenida Conde Boa Vista e Rua da Praia).
A Esposende, num movimento de reposicionamento, fechou a loja da Rua da Rangel na semana passada. Na mesma via, a parte da frente de uma outra loja, igualmente cerrada, serve apenas de vitrine para a loja ao lado. “Ninguém aparece, então estamos usando”, diz um funcionário. Um ponto tradicional, que, por muitos anos, abrigou farmácias, na esquina da Rua Nova com a Av. Dantas Barreto, também está sem operação. Na Rua da Imperatriz, igualmente se veem portas fechadas.
Até nos locais em que a fiscalização conseguiu expulsar os asiáticos está difícil alugar novamente os pontos. Há vários meses desocupado, o Shopping São José, na Rua do Rangel, que antes dava lugar a lojas de bolsas, sapatos, roupas contrabandeadas, não consegue novos inquilinos. Muitos imóveis do Centro, contam os lojistas, estão fechados para servir de estoque para produtos orientais. É um público que está disposto a pagar mais pelo aluguel. Na área, as pessoas dizem sofrer intimidação e têm medo de falar sobre o assunto.
“Só tem funcionário dentro da loja. Cliente que é bom, nada”, comenta a gerente da Malhas Famosas, Marinalva Santos. Por causa dos assaltos constantes, ela tem dois fiscais para ficar de olho no movimento da Rua Nova. O medo fica ainda maior, acrescenta, porque a maioria dos funcionários é mulher. “Semana passada mesmo, derrubaram um senhor aqui na frente”, conta. Ela diz que os ladrões passam dando “botes” rápidos, levando celular, bolsa, joias.
“As pessoas hoje não vêm mais ao Centro para comprar. Vêm para resolver pendências da vida, ir a uma consulta médica, ao banco. Mas, para comprar, não”, ressalta Dona Marinalva. Na avaliação dela, a abertura de mais shoppings também tira o consumidor da região central, assim como a multiplicação dos centros comerciais descentralizados.
Para tentar atrair a clientela, o jeito é fazer promoção, mudar vitrine, dar desconto. “Todo dia tem uma promoção, uma coisa diferente”, afirma o gerente da Júnior Magazine da Rua Duque de Caxias, Reinaldo Alves. “Movimento fraco, assalto constante. E, com a chuva, aí é que o movimento diminuiu mesmo”, registra. Ele espera que o Dia dos Pais levante as vendas, já que a situação anda fraca desde o Dia das Mães. Por enquanto, Seu Reinaldo ainda não precisou demitir funcionário, mas a situação pode mudar caso o cenário continue assim até o Natal.
Esposende fecha unidade da Rua do Rangel
“A unidade da Rua do Rangel já estava com os dias contados, a crise acelerou o processo”, explica a gerente de marketing da Esposende, Eliana Muller. A marca, do Grupo Paquetá, está fazendo um grande reposicionamento dos pontos de vendas, remodelando lojas e investindo na modalidade de outlet e saldão para dar vazão ao estoque e repor as vitrines constantemente na tentativa de chamar a atenção do consumidor. O movimento já começou, mas ganhará mais força no ano que vem.
“Muitas lojas foram abertas na periferia e nos shoppings, para ficarem mais próximas dos clientes. Então não justificava ter tantas lojas no Centro nem pagar aquele valor de aluguel”, detalha, sem citar valores. “Nosso público tem restrição de renda até para pegar ônibus, por exemplo. Tem muito cliente que compra no crediário e precisa ir periodicamente à loja”, reforça.
Para adequar a unidade da Rua do Rangel seria preciso, calcula Eliana, gastar, por baixo, R$ 1,5 milhão. O outlet inaugurado recentemente na Imbiribeira, Zona Sul do Recife, custou cerca de R$ 600 mil. O espaço tem 600 m². O pessoal foi realocado, enfatiza a gerente. Não houve uma onda de demissões. As metas estão sendo readequadas para este novo período, mas os bons funcionários estão sendo mantidos, têm emprego garantido.
“Não vamos negar que existe uma crise e que estamos passando por ela. Mas nosso cenário tem sempre que ser otimista. Estamos azeitando a máquina porque a crise vai passar. Estamos investindo em treinamento, atendimento, readequação”, analisa a gerente da Esposende.
“O volume de compras para estoque vai diminuir paro o fim do ano, mas vamos sempre ter novidade. Por isso, o outlet é um trabalho importante, a loja precisa girar”. A ideia do projeto é que algumas unidades tenham um espaço reservado para pequenos saldões, remarcações, últimos pares, com design mais vivo, mais colorido.
Lojista reclama da ausência de policiamento
Segurança pública não se faz só com reforço policial. Mas a patrulha é necessária para inibir os assaltantes. Na tarde da última quarta, a reportagem percorreu várias ruas comerciais do Centro e praticamente não encontrou efetivo fazendo ronda. Após sucessivos roubos e denúncias, a PM colocou uma viatura permanente na Praça da Independência. Mas, segundo os lojistas, não tem sido suficiente. Os ladrões dão o bote nas ruas adjacentes e saem correndo. A Polícia nem vê. E, quando chega, o meliante já está longe.
Segundo o tenente-coronel Alexandre da Cruz, do 16º Batalhão, a viatura na praça conseguiu reduzir os assaltos em quase 80% na área mais próxima. Muitos dos assaltantes, diz, portam facas ou facões para inibir as vítimas. O problema é que “o simples porte desses objetos não constitui um ilícito penal”, explica. Apesar do esforço, ele reconhece que infelizmente não há efetivo para cobrir todos os locais. “Invariavelmente vai haver migração para outros locais. O ideal seria que tivéssemos efetivo para cobrir toda essa área, principalmente policiamento a pé”, acrescenta.
Da Cruz diz que um projeto está sendo gestado dentro do governo. Chamada de “Centro Mais Seguro”, pretende resgatar o policiamento a pé e reforçar a segurança, com aumento de efetivo. Por enquanto, empresários têm se comunicado com o batalhão através de um grupo no WhatsApp, criado após apelo da câmara por mais segurança. Como medida preventiva, o coronel pede que as pessoas evitem “dar chance aos oportunistas, não ostentando objetos de valor, celulares, nem retirando grandes quantias nos bancos e tomando cuidado com a bolsa. Isso facilita e incentiva quem tem intenção de cometer o crime”.