Não bastasse o aumento expressivo do preço de insumos da ração, os produtores de gado leiteiro de Pernambuco podem amargar mais prejuízos com a Instrução Normativa (IN) do Ministério da Agricultura que autoriza as indústrias de laticínio a usar leite em pó para produzir leite UHT ou pasteurizado por um ano. Associações ligadas à agropecuária acreditam que o preço do litro do leite fluido – vendido de R$ 1,20 a R$ 1,50 no Estado – vai cair, levando criadores a reduzir os rebanhos ou desistir da atividade.
A Instrução Normativa publicada na última sexta-feira libera a reconstituição do leite em pó por empresas na área da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). Este tipo de produto vem do Sul e Centro-Oeste do País, Uruguai, Argentina e Nova Zelândia. Antes, a prática era proibida pela portaria nº 196/1994, do próprio Ministério da Agricultura. Com a nova regulamentação, a portaria foi suspensa.
A liberação pegou os agropecuários de surpresa. O setor estava negociando com o governo Federal a melhor forma de tratar o tema, visto que enfrenta dificuldades com o aumento de farelo de soja e de trigo, sal mineral e outros insumos que compõem a ração. Só o milho apresentou alta de 97% desde o início deste ano. “A medida é um artifício para obter uma matéria-prima mais barata. O governo Federal prometeu que, antes de tomar qualquer decisão sobre a importação, haveria um entendimento conjunto entre todas as partes envolvidas. Não ocorreu isso. O produtor é o mais prejudicado, porque os laticínios vão tentar baixar o litro do leite, que é insuficiente para os gastos com a produção”, afirma o presidente da Sociedade Nordestina dos Criadores (SNC), Emanuel Rocha. Ele ressalta que pelo menos 85% da produção vem de pequenos criadores.
O leite foi um dos vilões da inflação em junho. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o preço deste alimento subiu 8,53% em junho no Recife. Por outro lado, o preço do litro comprado ao produtor está mais barato do que em 2012, quando começou a seca no Estado, afirma o presidente da Federação de Agricultura de Pernambuco, Pio Guerra. "Este é o 5º ano consecutivo de seca e o preço está asfixiado. Como é o que o trabalhador do campo vai sobreviver?", questiona. A Confederação de Agricultura e Pecuária do País (CNA) emitiu nota de repúdio contra o Ministério da Agricultura.
Uma das justificativas do setor de laticínio para a necessidade da liberação é que a seca no semiárido impactou a bacia leiteira. A produção atual não atende à demanda das grandes empresas. Atualmente, Pernambuco gera, em média, 1.8 milhões de litros por dia. Em 2011, o número chegava a 2.6 milhões de litros por dia.
Mas o uso de leite em pó significa que o preço final ao consumidor vai cair? “O preço deve estabilizar, mas não é possível dizer quanto vai cair ainda. Tudo depende do comportamento do mercado internacional, já que a maior parte do produto consumido no Brasil é importado”, comenta o presidente do Sindicato das Indústrias de Laticínios e Produtos Derivados de Pernambuco (Sindileite-PE), Carlos Albérico Bezerra. “Não posso dizer que o criador não será prejudicado. Porém, o impacto não será tão fatal. A preferência dos laticínios é pelo leite do produtor local. O preço é mais barato e o produto final fica mais gostoso. As empresas de grande porte importam o quilo do leite em pó por uma média de R$ 14”, complementa.