A oposição venezuelana protestou nesta quarta-feira (25) nas ruas, no âmbito de sua estratégia de pressão por um referendo revogatório contra o presidente Nicolás Maduro, colocando mais uma vez à prova seu poder de convocação em meio a um crescente mal-estar social.
Acolhendo um chamado do ex-candidato à presidência Henrique Capriles, cerca de 500 opositores protestaram diante de um tribunal do leste de Caracas para rejeitar a decisão judicial que restringe as manifestações diante das sedes do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que deve definir a questão do referendo revogatório.
"Sabemos que a maioria está nas filas para conseguir comida, remédios", disse Capriles para justificar a baixa adesão ao protesto em Caracas.
Capriles convocou manifestações diante dos tribunais em vinte cidades. O secretário-executivo da coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD), Jesús Torrealba, disse à AFP que ainda não dispõe de uma avaliação sobre todos os protestos.
Na capital, policiais e militares com equipamentos antimotins aumentaram sua presença em duas vias de acesso ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ).
Ante seus partidários, Capriles declarou que a oposição não deseja um golpe de Estado contra Nicolás Maduro, mas retirá-lo do poder pelas vias legais.
"Soldados da Força Nacional: está chegando a hora de decidir se estão com a Constituição ou com Maduro. Não queremos golpe, queremos que vocês defendam a Constituição", afirmou.
"Achar que os protestos podem ser calados com sentenças judiciais é tolice", disse à AFP o secretário-executivo da coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), Jesús Torrealba, durante a concentração em Caracas.
O tribunal diante do qual esta mobilização ocorreu ordenou às forças de segurança que isolassem as instalações do CNE de "protestos não autorizados", ao decidir a favor de um recurso de funcionários desta entidade que, segundo a oposição, é controlada pelo governo.
Segurando uma grande bandeira da Venezuela, os manifestantes exibiram cartazes com mensagens que denunciam a grave escassez de alimentos e remédios.
Em maio, os partidários da MUD - que tem maioria no Parlamento - tentaram duas vezes, sem sucesso, organizar passeatas até a sede central do CNE em Caracas, mas foram bloqueados por policiais e militares, situações que provocaram conflitos.
O objetivo da oposição era exigir do CNE que não adiasse a revisão das assinaturas apresentadas em 2 de maio para ativar o referendo, primeiro passo de um longo e complexo processo para revogar o mandato de Maduro. Esta fase terminará em 2 de junho.
"Este conflito não vai ser o que Maduro disser, ou o que a MUD disser, será o que o povo disser. Por isso estamos clamando pela convocação do revogatório, porque queremos uma solução construída com os votos do povo, e não um desenlace com o sangue do povo", afirmou Torrealba.
Arma pacífica
As mobilizações são consideradas pela MUD sua principal arma de pressão para a consulta que pretende afastar Maduro, eleito para um mandato de seis anos, que termina em 2019.
O protesto de 11 de maio reuniu mil pessoas e uma semana depois o número dobrou. As cifras modestas chamam a atenção, já que sete em cada 10 venezuelanos são favoráveis a uma mudança de governo, segundo a empresa Datanális.
O cientista político Héctor Briceño explica que, após 17 anos no poder, o chavismo conseguiu controlar as mobilizações.
Além disso, especialmente nos setores populares, está presente na memória o 'Caracazo', uma violenta explosão social em 1989 que, segundo o analista, se tornou um "muro de contenção".
Em contraste com a escassa participação nas passeatas, a MUD afirma ter reunido 1,8 milhão de assinaturas em apenas cinco dias para pedir a ativação do referendo revogatório, um número nove vezes superior ao exigido.
Revogatório "impossível" em 2016
As mobilizações acontecem em um cenário de mal-estar social com a severa escassez de alimentos e remédios, além de uma inflação projetada de 700%, de acordo com o FMI, para 2016.
Além disso, o país sofre com cortes cotidianos de energia elétrica e água, além dos altos índices de criminalidade.
Briceño vê uma convergência progressiva entre o protesto político e as demandas sociais.
O governo descarta a possibilidade de um referendo revogatório em 2016, alegando que os prazos legais não permitem o que a oposição deseja.
"Este ano é impossível", advertiu o número dois do chavismo, Diosdado Cabello, que ressalta que a MUD sabe disso, mas insiste para justificar uma escalada violenta quando o CNE fechar as portas à ideia.
Se a consulta acontecer depois de 10 de janeiro de 2017, quando o mandato presidencial completa quatro anos, e Maduro for derrotado, os dois anos restantes serão completados pelo vice-presidente, designado pelo chefe de Estado. Se o referendo acontecer este ano e o chavismo for derrotado, novas eleições serão convocadas.
Maduro, que critica a ofensiva da oposição para interromper seu mandato e alega ainda uma "ameaça" de intervenção estrangeira, decretou estado de exceção em 13 de maio.