A chanceler alemã, Angela Merkel, pediu ao presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, nesta quinta-feira (2), que garanta o respeito da liberdade de expressão na Turquia, a poucas semanas de um referendo sobre uma revisão constitucional que poderá reforçar seus poderes.
Em sua coletiva de imprensa conjunta com o presidente Erdogan, a chanceler falou de suas preocupações a respeito do estado da liberdade de expressão no país.
Merkel também disse ter compartilhado sua preocupação com a situação da liberdade de imprensa na Turquia e com as dificuldades encontradas pelos correspondentes alemães para obter visto de imprensa.
"A separação dos poderes e a liberdade de expressão devem ser garantidas" na revisão constitucional desejada por Erdogan e submetida a um referendo em abril, ressaltou Merkel.
Ela considerou ainda que o referendo deve ser supervisionado por uma delegação da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).
Já Erdogan varreu as críticas de seus adversários turcos, que temem um apagamento da separação de poderes caso a reforma constitucional, que reforça consideravelmente suas prerrogativas, seja aprovada.
"Isso não tem absolutamente nenhum fundamento (...) Há um órgão legislativo, um executivo, bem como um judiciário", afirmou Erdogan, insistindo em que "está fora de questão acabar com a separação de poderes".
Angela Merkel mencionou o "terrorismo islamita" como um dos temas do encontro bilateral. Imediatamente, demonstrando incômodo, o anfitrião corrigiu a visitante.
"A expressão 'terrorismo islamita' nos magoa profundamente. Uma expressão assim não pode ser utilizada. Não é justo. Porque o Islã e o terrorismo não podem ir juntos", alegou.
"A palavra 'Islã' significa 'paz'. Por conseguinte, se pusermos juntas duas palavras que indicam paz e terrorismo, isso entristece os fiéis dessa religião [o Islã]".
"Não vamos usá-la, por favor, porque, enquanto for assim, seremos obrigados a nos opor. Se ficarmos em silêncio, seria como se aceitássemos. E eu, como muçulmano, e como presidente muçulmano, não posso aceitar isso", continuou.
Os dois líderes também discutiram o pacto migratório concluído em março entre a Turquia e a União Europeia, a situação na Síria e no Iraque, bem como as relações comerciais, segundo Erdogan.
"A questão dos refugiados é muito importante para a Turquia, assim como para a UE e para a Alemanha", afirmou Merkel, acrescentando que o pacto sobre os imigrantes repousa em um "interesse mútuo".
A viagem de Merkel à Turquia ocorre em meio a um momento sensível nas relações entre Ancara e Berlim, dois pilares da Otan. As relações bilaterais se encontram fragilizadas desde a tentativa de golpe contra Erdogan, que iniciou, em seguida, um expurgo no funcionalismo público, na Justiça e nas Forças Armadas - o que preocupa a Europa.
Autoridades alemãs pediram diversas vezes que a Turquia respeite o Estado de direito. Mais de 43 mil pessoas foram detidas, e mais de 100 mil, suspensas ou demitidas, desde julho no país.
A Turquia acusa a Alemanha de abrigar "terroristas" por se negar a extraditar supostos golpistas e membros de organizações consideradas ilegais, como o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e grupos de extrema esquerda.
Desde a tentativa de golpe, o número de pedidos de asilo de cidadãos turcos passou de 1.700, em 2015, para 5.700, em 2016. Entre os pedidos de asilo, há 40 militares turcos da Otan, segundo a imprensa alemã.
O governo turco fez um apelo à Alemanha para que "pense cuidadosamente" e rejeite o pedido.
Esta foi a terceira visita de Merkel ao país desde que UE e Ancara assinaram, em 18 de março, um acordo migratório que permitiu reduzir de forma drástica a quantidade de migrantes na Europa procedentes do território turco. Além disso, foi a primeira viagem da chanceler desde a tentativa de golpe de Estado em julho passado.
A chanceler foi muito criticada na Alemanha e pela oposição turca por essa visita, que se dá a poucos meses de eleições importantes nos dois países: legislativas na Alemanha e um referendo constitucional na Turquia, onde Erdogan aspira a instaurar um regime presidencialista.
As legislativas de setembro na Alemanha devem ter os migrantes como um dos temas centrais da campanha. São pelo menos três milhões de cidadãos de origem turca nesse país.
Outro tema de tensão entre Alemanha e Turquia envolve o influente jornalista turco Can Dündar, que fugiu da Turquia para morar em Berlim, onde criou um site com notícias críticas ao governo turco.