O presidente sírio, Bashar al-Assad, acusou os países ocidentais de forjar o suposto ataque químico na cidade rebelde de Khan Sheikhun para preparar, segundo ele, o terreno para os ataques americanos que se seguiram contra o seu exército.
Assad, no poder há 17 anos e considerado um pária pelos ocidentais, assegurou que o seu regime não possui armas químicas desde a destruição de seu arsenal em 2013.
Esta entrevista exclusiva concedida na quarta-feira à AFP em seu escritório no centro de Damasco é sua primeira após o suposto ataque químico de 4 de abril e os ataques americanos de três dias depois, os primeiros contra o regime de Assad desde o início do conflito, há seis anos.
"Para nós, trata-se de um evento 100% fabricado", declarou o chefe de Estado sírio, que apareceu sorridente e descontraído.
"Nossa impressão é que o Ocidente, principalmente os Estados Unidos, é cúmplice dos terroristas e que armou essas história para servir de pretexto para o ataque" americano de 7 de abril contra uma base aérea no centro do país, acrescentou.
O Departamento de Estado americano afirmou nesta quinta-feira que o bombardeio equivalia a um "crime de guerra", e seu porta-voz, Mark Toner, ridiculizou o presidente sírio por suas declarações à AFP: "Lamentavelmente se trata de um típico Assad. Tenta lançar informações falsas, gerar confusão".
O suposto ataque químico na cidade de Khan Sheikhun, cujas imagens de pessoas atingidas chocaram o mundo, causou em 4 de abril a morte de 87 civis, incluindo 31 crianças, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH).
Os ocidentais culparam o regime de Assad pelo evento e, em retaliação, os Estados Unidos realizaram seus primeiros ataques contra uma base militar ao sul de Homs.
"As únicas informações disponíveis para o mundo até o momento presente são as publicadas pela facção da Al-Qaeda", assegurou o chefe de Estado sírio em referência ao grupo extremista islâmico Fatah al-Sham, que controla a cidade de Khan Sheikhun com os rebeldes.
"Não sabemos se todas as fotos ou imagens de vídeo são verdadeiras ou manipuladas (...) Não sabemos se essas crianças foram mortas em Khan Sheikhun, não sabemos nem mesmo se elas realmente morreram", afirmou.
"E se houve um ataque, quem o lançou?", questionou o presidente sírio.
Assad negou qualquer envolvimento: "nenhuma ordem foi dada para lançar um ataque e, além disso, nem possuímos armas químicas".
"Há vários anos, em 2013, renunciamos a todo o nosso arsenal (...) E, mesmo que possuíssemos tais armas, nunca usaríamos", ressaltou ele.
Após 2013, a Organização para a Proibição de Armas Químicas alertou em duas ocasiões o regime sírio sobre ataques contra áreas rebeldes.
A Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ) abriu uma investigação nesta quinta-feira, afirmando que o suposto ataque químico é "uma acusação verossímil", segundo avaliações preliminares de seus especialistas.
O presidente sírio afirmou que deseja uma investigação sobre o que aconteceu em Khan Sheikhun, mas desde que seja "imparcial".
"Vamos trabalhar (com os russos) para uma investigação internacional. Mas deve ser imparcial. Só iremos permitir uma investigação se, e somente se, for imparcial e com a participação de países imparciais para ter a certeza de que não será utilizada para fins políticos", disse ele.
Assad afirmou que a Rússia, sua aliada na guerra, "não teve tempo de advertir" seu regime sobre o ataque americano que se seguiu.
Comentando os ataques americanos contra a base aérea de Al-Shaayrate, ele minimizou o impacto.
"Nosso poder de fogo, nossa capacidade de atacar os terroristas, não foi afetado por este ataque", garantiu Assad à AFP.
Perguntado se havia perdido um potencial parceiro na pessoa do presidente americano Donald Trump, Assad disse: "sempre fui muito cuidadoso em expressar minha opinião a seu respeito (...) sempre disse 'vamos ver o que ele vai fazer'".
"Este ataque é a primeira evidência de que (...) o regime nos Estados Unidos (não muda)", afirmou o presidente sírio, cujas relações com Washington sempre foram caóticas. Para Assad, Trump tomou partido da rebelião.
"Você não pode falar de parceria entre nós, que lutamos contra o terrorismo (...) e aqueles que o apoiam abertamente", criticou, considerando que "os Estados Unidos não são sérios (na busca) de qualquer solução política" para o conflito na Síria.
"Eles querem usar o processo político como um guarda-chuva para os terroristas", disse ele.
Lavrov disse nesta quinta-feira que ele e Tillerson haviam "chegado a uma posição comum de que uma situação similar não pode se repetir", referindo-se ao bombardeio da base.
"No contexto da histeria ocidental, é fundamental não cair nas provocações e não permitir nada que possa romper os esforços feitos no contexto dos processos (de paz) de Genebra e Astanah", acrescentou Lavrov, que nesta quinta-feira se reuniu em Moscou com seu homólogo sírio Walid Muallem.