O Exército do Zimbábue colocou, nesta quarta-feira (15), o presidente Robert Mugabe, 93 anos, em prisão domiciliar e assumiu o controle da capital, Harare, em uma operação dirigida contra o entorno do mais velho governante em exercício do mundo.
Apesar dos indícios, os militares asseguraram que sua intenção não é a de um golpe de Estado.
Soldados e veículos blindados bloquearam esta manhã o acesso de veículos ao Parlamento, à sede do partido no poder, o ZANU-PF, e ao Supremo Tribunal.
Os escritórios onde o chefe de Estado reúne seus ministros também foram cercados pelos militares.
O presidente Mugabe declarou estar detido em sua residência, em conversa por telefone com o colega sul-africano, Jacob Zuma. Ele indidou que passa bem.
Durante a noite, um oficial anunciou na televisão nacional que o Exército estava intervindo contra "criminosos" ligados a Mugabe, mas negou qualquer tentativa de golpe de Estado contra o regime.
A operação militar ocorre em meio a uma crise aberta entre Mugabe e o líder do Exército após a destituição, na semana passada, do vice-presidente, Emmerson Mnangagwa, considerado braço-direito do chefe de Estado.
"Esta não é uma tentativa de derrubar o governo", disse o general Sibusiso Moyo em pronunciamento à Nação em rede nacional.
"Queremos assegurar à Nação que Sua Excelência, o presidente (...), e seus familiares estão sãos e salvos, com sua segurança garantida", declarou. "O alvo são criminosos de seu entorno. Após cumprirmos nossa missão, esperamos que a situação volte à normalidade", ressaltou.
Aliado de Mugabe, o presidente sul-africano, Jacob Zuma, declarou esta manhã sua hostilidade a qualquer mudança de regime "inconstitucional" no país vizinho.
"Muito preocupado" com a situação, Zuma também fez um apelo "à calma e à contenção", e exortou as partes a "resolverem amigavelmente o impasse político".
Por meio de seu presidente, o guineano Apha Condé, a União Africana (UA) denunciou "o que parece um golpe de Estado", e exigiu "o restabelecimento imediato da ordem constitucional".
Após dias de grande tensão, a operação do Exército, até então considerado um pilar do regime, constitui um desafio sem precedentes à autoridade de Mugabe.
Um forte tiroteio ocorreu durante a madrugada, na zona da residência de Mugabe em Harare, segundo testemunhas ouvidas pela AFP.
"Pouco antes das 2h, ouvimos entre 30 e 40 disparos, durante três a quatro minutos, procedentes de sua residência", contou à AFP um morador do bairro de Borrowdale.
Na segunda-feira, o comandante do Exército, Constantino Chiwenga, ordenou o fim do expurgo no partido ZANU-PF, no poder, após a destituição do vice-presidente Emmerson Mnangangwa, e advertiu sobre uma intervenção dos militares.
"Devemos lembrar a quem está por trás destes acertos desleais que, quando se trata de proteger nossa revolução, os militares não hesitarão em intervir", alertou o general.
Um porta-voz do ZANU-PF reagiu às declarações do general Chiwenga afirmando que as mesmas foram "claramente calculadas para perturbar a paz nacional (...) e sugerem uma conduta traidora por sua parte, com a intenção de incitar à insurreição".
Mnangagwa foi destituído uma semana depois de ter discutido com Grace, mulher de Mugabe e primeira na linha de sucessão do marido, de 93 anos.
O ex-vice-presidente tem fortes vínculos com o Exército, após ter ocupado o cargo de ministro da Defesa.
Mugabe, que dirige o Zimbábue com mão de ferro desde a independência do país, em 1980, já anunciou que concorrerá em 2018 a um novo mandato.
Antes da troca de tiros desta quarta-feira, o Foreign Office britânico relatou "movimentos de veículos militares nas imediações de Harare".
A embaixada dos Estados Unidos em Harare recomendou a seus cidadãos que permaneçam em casa, diante da "incerteza política" no Zimbábue.
"Recomendamos aos cidadãos americanos no Zimbábue que se protejam permanecendo em suas casas até novo aviso".
"Em razão da incerteza política que impera esta noite, o embaixador instruiu todos os funcionários (diplomáticos) a permanecer em casa".
Mugabe é o decano dos chefes de Estado em atividade. Sob seu regime autoritário, o país africano empobreceu muito, e, desde o início dos anos 2000, lida com um desemprego em massa - cerca de 90% da população ativa - e uma falta de liquidez que atrasa o pagamento dos salários dos funcionários.