Durante dias, María Magdalena Saldaña enganchou uma corrente dourada que envolve a sua cintura à grade que protege uma das prisões mais famosas da Nicarágua. E tem a intenção de permanecer ali, sem consumir nada além de água, até que o governo do presidente Daniel Ortega liberte seu filho, detido sem explicações em sua casa na semana passada durante uma batida policial.
"Que o mundo saiba o que uma mãe sofre na Nicarágua", diz Saldaña em meio às lágrimas, enquanto vários seguranças a observam através da grade.
"O meu coração dói. A minha alma dói", acrescenta, agarrando-se à ordem de libertação de seu filho, emitida por um tribunal de apelações de Manágua, e que a mulher de 75 anos declara ter sido ignorada.
Em 12 de junho, a polícia prendeu Wilder Octavio García Saldaña e o levou à prisão de El Chipote, envolta por uma exuberante vegetação no topo de Manágua.
A reputação da brutalidade dessa instituição está tão enraizada quanto suas celas subterrâneas, que se estendem por baixo de uma íngreme montanha no centro da cidade.
Saldaña, de 37 anos, é um dos cerca de 2.000 presos ali desde que a população começou a protestar contra Ortega, um ex-guerrilheiro que desde 2007 é reeleito no poder.
A mãe do prisioneiro se juntou a dezenas de pessoas que se manifestam contra a prisão repentina de seus familiares e amigos.
"O único 'delito' que acho que meu filho cometeu foi ter ido a um protesto", afirma, em referência às manifestações maciças contra o governo que têm sido violentamente reprimidas pelas forças oficiais, e que deixam ao menos 178 mortos em dois meses.
"Ele levantou a bandeira da Nicarágua, que é o símbolo da pátria", continua. "Queremos a liberdade".
O complexo carcerário agora conhecido como El Chipote já serviu como centro da ditadura militar sob a dinastia política dos Somoza, que teve na tortura a sua principal ferramenta para esmagar a rebelião.
O próprio Ortega esteve preso ali, enquanto lutava com as forças guerrilheiras que derrubaram Anastasio Somoza em 1979.
Mas, ao assumir o poder, o governo de Ortega optou por manter a prisão de pé.
A batizaram de El Chipote em homenagem ao centro de operações do venerado Augusto Sandino, um revolucionário que durante os anos 1920 e 1930 lutou contra a ocupação americana, inspirando os rebeldes da época de Ortega décadas mais tarde.
Mas entre os nicaraguenses de hoje, o antigo símbolo da ditadura - com celas escuras do tamanho de armários - mantém o terror pairando.
Por isso, a acusação de familiares de detidos e advogados de direitos humanos de que Ortega permite que milhares de opositores sejam "arbitrariamente" e "ilegalmente" presos ali é particularmente dura.
Braulio Abarca, advogado do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh), assinala que em apenas um dia recebeu 28 "denúncias de detenções ilegais, com espancamentos, tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, e com sinais claros de tortura executados pela Polícia Nacional".
Alguns dos detidos, diz Abarca, têm somente 15 anos.
"O crime na Nicarágua é ser jovem e defender a sua pátria", mostra um dos vários cartazes que os manifestantes deixaram na grade da prisão.
A alguns metros de Saldaña, a avó de 96 anos Anastacia Morales Centeno esfrega o rosto enquanto soluça por seu neto Bernardo.
Conta que em uma manhã um grupo de paramilitares leais a Ortega o lançou a um caminhão.
"Não aguento mais. Não durmo, estou pensando nele", conta, enquanto se protege do sol com um guarda-chuva.
Nos primeiros dias dos protestos contra Ortega, que começaram em 18 de abril, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) disse documentar "um padrão de detenções maciças e arbitrárias".
Os detidos eram às vezes despojados de seus pertences e privados de comida e água, detalhou esse ente, acrescentando que alguns foram "barbeados, algemados com violência e submetidos a espancamentos e chaves de pescoço asfixiantes".
O subdiretor do Cenidh, Gonzalo Carrión, tinha 18 anos quando os sandinistas expulsaram Somoza, e agora expressa sua comoção ao descrever a atual "tragédia".
Esta polícia está "a serviço do poder", afirma.
Enquanto os nicaraguenses lidam com o que Carrión chama de "um Estado de terror", o governo nega.
Durante o diálogo mediado pelos bispos católicos, o chanceler negou a culpa das forças apoiadas por Ortega.
E na sexta-feira, o clero anunciou que o governo e delegados civis chegaram a um acordo para criar uma Comissão de Verificação, para a qual foram convidados entes internacionais, incluindo a CIDH, a fim de investigar a violência que quase diariamente termina em derramamento de sangue.
Mas Saldaña tem preocupações mais imediatas. "Não sairei daqui até que deixe essa prisão", diz em referência a seu filho. "Estamos sendo constantemente agredidos", assegura chorando, enquanto familiares gritam "liberdade" atrás dela.
"Não existe justiça na Nicarágua. Estou decepcionada com a minha linda Nicarágua", assinala.