Em 28 de abril de 1989, o governador de Alagoas, Fernando Affonso Collor de Mello, despede-se do Conselho da Sudene. Alçado ao País pela imagem de “Caçador de Marajás”, ao enfrentar os altos salários de desembargadores do Estado, Collor anuncia sua candidatura à Presidência do País. Promete à Casa – se eleito – resgatar a autonomia da Sudene, que ficaria ligada a seu gabinete. Empossado, põe 582 servidores em disponibilidade, recebendo em casa apenas 50% do salário. A reportagem dá sequência à série Dossiê Sudene.
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Três anos e meio antes da abertura do processo de impeachment, o primeiro de um presidente brasileiro, em toda a República – pedido aprovado em 29 de setembro de 1992 pelo Congresso Nacional –, o então governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello oficializou a sua caminhada rumo à Presidência do Brasil com um discurso de despedida, na Sudene, no qual promete a redenção do Nordeste e a adoção de novas práticas políticas o País. Mais jovem presidente da história do Brasil, Collor renuncia ao mandato em 29 de dezembro daquele ano, às vésperas da aprovação do processo, para fugir da cassação e da inelegibilidade, por acusações de comandar esquema de corrupção na Presidência.
A ata da sessão de 28 de abril de 1989 e o texto original do discurso de Collor na reunião do Conselho Deliberativo da Sudene, partes do acervo documental da autarquia, registram a sua última participação como conselheiro e o passo oficial inicial para a candidatura e o projeto pessoal que levaria a um dos mais traumáticos e vergonhosos episódios da República. No discurso, o governador Collor projeta um novo tempo para o País e anuncia que, se eleito presidente, a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste retomaria as suas origens, sendo vinculada diretamente à Presidência.
Um trecho do discurso revela a intenção e o compromisso claro do presidenciável de resgatar a autonomia e a força de decisão idealizadas pelo economista e primeiro superintendente, Celso Furtado, e o presidente Juscelino Kubitschek, em 1959, para a autarquia de planejamento e desenvolvimento do Nordeste. “Pretendo, no decorrer desta luta, que iniciarei a partir do próximo dia 14 de maio (1989, depois de desincompatibilizar-se-se do governo de Alagoas), como postulante à Presidência da República, pelo Partido da Reconstrução Nacional PRN), levar a bandeira do Nordeste, levar a bandeira da Sudene, e assumir, desde já, um compromisso de que nós faremos com que a Sudene volte a se vincular diretamente à Presidência, sem a intermediação de qualquer Ministério”, ressalta.
O trecho final do discurso de Collor retoma o compromisso de fortalecimento da Sudene, paralelamente a uma política de valorização de seus técnicos e servidores. Obcecado pelo projeto de candidatura presidencial, o governador assegura uma autarquia forte e a retomada do prestígio de seus quadros técnicos. “Com esta instituição já me sentia, e me sentirei eternamente comprometido com os técnicos desta Casa, que sofreram tantas críticas infundadas, e que eu aqui quero me solidarizar com todos. A esses técnicos honestos que carregam este piano, que mantêm ainda acesa em seus corações a esperança de ver a Sudene retornar aos seus áureos tempos, e nós haveremos de fazê-lo, aos técnicos desta instituição, os meus agradecimentos, por estarem mantendo acesa esta esperança”, discursou repetidamente.
Vencedor das eleições, ao derrotar o petista Luiz Inácio Lula da Silva, no segundo turno, o ex-governador de Alagoas assume e toma as primeiras medidas na contramão do que tinha prometido na campanha, como o confisco da poupança, parte do plano de combate à inflação. Entre as decisões, manda 582 servidores da Sudene para casa, em disponibilidade, recebendo 50% do salário. “É revitalizando a nossa Sudene, fazendo com que se torne um instrumento de ponta do nosso desenvolvimento (...) que nós estaremos trilhando ou iniciando o trilhamento do caminho da nossa redenção”, aponta a direção.
No discurso de despedida da Sudene, Collor – que em manifestações anteriores à imprensa denunciava a a corrupção nos órgãos do poder público – também antevê um quadro de bem-estar social no futuro, a partir de novas concepções e políticas de governo: “Nós queremos, sim, o bem-estar social. E só se consegue, só se alcança se tivermos uma política econômica coerente, uma política industrial, uma política agrícola, políticas essas que se entrelacem dentro deste objetivo de crescer, hoje, no mínimo, 7% ao ano (...) Nós precisamos, rigorosamente, repensar este País”, exalta aos conselheiros.
Ufanista, Collor prevê uma Região forte e livre da subalternidade na política: “O Nordeste não quer tratamento de primo pobre da Federação. O Nordeste não aceita e não quer esmolas. O Nordeste não mendiga (...). O Nordeste vai mostrar, nos próximos anos, que é uma Região viável, no momento em que nos desprendermos dos grilhões da subalternidade política, do clientelismo político, do paternalismo e de todas as outras formas de opressões (...)”.