Reale Jr. diz que pedaladas fiscais são elementos suficientes para impeachment

Segundo o jurista, Dilma feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal ao retardar o repasse de recursos para bancos públicos
Da ABr
Publicado em 30/03/2016 às 19:22
Segundo o jurista, Dilma feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal ao retardar o repasse de recursos para bancos públicos Foto: Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil


O jurista Miguel Reale Jr. disse que as pedaladas fiscais são elementos suficientes para que a presidenta Dilma Rousseff seja processada por crime de responsabilidade. Segundo o jurista, Dilma feriu a Lei de Responsabilidade Fiscal ao retardar o repasse de recursos para bancos públicos.

“Foi um expediente malicioso [as pedaladas] por via do qual foi escondido o déficit fiscal e foi, por via das pedaladas, que se transformou despesa em superávit primario. As pedaladas constituem crime e crime grave”, disse o jurista referindo-se aos atrasos de repasses a bancos públicos referentes ao pagamento de benefícios de programas sociais, como Bolsa Família, seguro-desemprego e abono salarial.

Segundo o jurista, que participa nesta quarta (30) de uma oitiva na comissão especial criada para analisar a admissibilidade do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, as pedaladas fizeram com o que a União viesse a contrair operações de crédito com instituições financeiras dos quais ela é controladora.

O jurista disse acreditar que, mesmo tendo ocorrido atrasos semelhantes em governos anteriores, o diferencial em relação a Dilma é que as operações alcançaram um volume alto de recursos.

Para Reale Jr., a medida contribuiu a médio prazo para pressionar o aumento da inflação e diminuir a credibilidade da economia brasileira junto ao mercado financeiro. “Quero lhes dizer que o ajuste fiscal é um bem público, fundamental pedra angular da economia de um país e no momento em que se quebra é como uma queda em dominó que leva à inflação, recessão e desemprego. Portanto se apropriaram de um bem que foi duramente construído, que é o equilíbrio fiscal”, afirmou.

A reunião destinada a ouvir os autores do pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff começou com bate-boca entre deputados da base aliada e da oposição, favoráveis ao impeachment. O tumulto começou quando o deputado Weverton Rocha (PDT-MA) pediu a palavra para formular uma questão de ordem.

Weverton formulou a sua questão, logo após o presidente do colegiado ter negado uma questão de ordem da deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ) em que ela questionava a realização das oitivas antes da entrega da defesa da presidenta. Para a deputada, o fato prejudica a defesa de Dilma.

Ao iniciar a reunião, o presidente da Comissão do Impeachment, Rogério Rosso (PSD-DF) disse que não ia acatar a questão de ordem, pois, no seu entendimento, o direio à ampla defesa estava garantido. "As diligências não se destinam a provar a procedência ou improcedência, mas esclarecer a denúncia. Haverá tempo para a defesa", argumentou.

Na questão de ordem, Weverton disse que o fato de se realizar oitivas de esclarecimento demonstra que o pedido de impeachment não está claro, por não apresentar fatos específicos, e pediu que os trabalhos fossem suspensos até que a comissão intimasse a defesa da presidenta para acompanhar os trabalhos. “Até quando a devida intimação não ocorrer, estamos requerendo a suspensão dos trabalhos até que a questão seja solucionada”, disse.

Deputados da oposição criticaram o pedido e houve bate-boca. Após o tulmulto, Rosso tentou passar a palavra para Reale Jr., mas o advogado foi interrompido por deputados da oposição que começaram a gritar “Impeachment!”, Em resposta, deputados contrários ao impeachment responderam com a palavra de ordem “Não vai ter golpe, vai ter luta!". A sessão foi interrompida por alguns minutos antes que Rosso passasse a palavra ao jurista.

Neste momento, a advogada Janaína Paschoal, que também assina o pedido de impeachment em curso, está sendo ouvida pelos integrantes da comissão. Ela disse discordar do argumento que vem sendo apresentada pelo governo de que não há crime de responsabilidade cometido pela presidenta que justifique o processo de impedimento da mandatária do Executivo.

 

DEFESA DO GOVERNO

O governo nega que tenha cometido irregularidade no atraso do repasse aos bancos públicos, conforme apontou auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) feita em 2015, com base em relatórios de 2014. Em audiência na Câmara dos Deputados, no ano passado, o então ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, hoje ministro da Fazenda, disse que é uma questão de “diferença na interpretação jurídica” de algumas ações financeiras implementadas não só pelo governo da presidenta Dilma Rousseff como também pelo governo Fernando Henrique Cardoso.

Segundo o parecer do TCU, houve – em determinados momentos –  diferença no fluxo de caixa do Tesouro em razão do adiamento de despesas. O objetivo seria melhorar os resultados fiscais.

Barbosa explicou que a implementação de programas sociais depende de agentes financeiros, que têm de ser remunerados pelos serviços prestados. Eventuais atrasos nos repasses, lembrou o ministro, não são irregulares. “[Os programas sociais] dependem, na maior parte, de bancos públicos. Para implementar esses programas, o governo tem de repassar dinheiro aos agentes prestadores de serviços. Eventuais atrasos nesses repasses estão previstos em contrato, [situação em que ocorre o] desequilíbrio de caixa", disse o ministro em maio do ano passado, durante audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.

 

HISTÓRICO

O pedido de impeachment da presidenta foi acatado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no dia 2 de dezembro do ano passado. No documento, os advogados Helio Bicudo, Janaína Paschoal e Miguel Reale Júnior pedem o afastamento da presidenta evocando as pedaladas fiscais do ano de 2014 apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Os autores do pedido dizem também que Dilma cometeu crime de responsabilidade ao editar seis decretos autorizando despesas extras em um cenário de restrição fiscal e ao, suspostamente, repetir as pedaladas fiscais em 2015, já no exercício deste novo mandato.

Os decretos, não numerados assinados pela presidenta em 27 de julho e 20 de agosto de 2015, autorizaram o governo a gastar R$ 2,5 bilhões a mais do que havia previsto no Orçamento. Para os advogados, Dilma não poderia criar despesa extra quando sabia que a meta de superávit primário (dinheiro reservado para pagar os juros da dívida) prevista no Orçamento não seria cumprida.

O governo rebate os argumentos, afirmando que as contas do governo de 2015 sequer foram apreciadas pelo TCU e pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional e que, portanto, não se pode falar na possibilidade de crime de responsabilidade.

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