O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou atrás em sua própria versão sobre se tinha conhecimento a respeito das relações entre o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, ambos condenados na Operação Lava Jato.
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Inicialmente questionado a respeito pelo juiz Sérgio Moro, em interrogatório nesta quarta-feira, 10, o petista disse ter descoberto a relação de ambos "pela denúncia do Ministério Público Federal". Em seguida, no desenrolar do depoimento, Lula alegou ter pedido a Vaccari para marcar reunião com o ex-diretor da petrolífera, na qual o teria advertido sobre contas na Suíça. O ex-presidente falou a Moro no âmbito de ação penal em que é réu, acusado de receber R$ 3,7 milhões de propinas da OAS.
Durante o interrogatório, ao tratar sobre a parte da denúncia em que o MPF narra o suposto "comando" dos esquemas na Petrobras por parte de Lula, o juiz federal Sérgio Moro fez uma série de perguntas sobre o conhecimento que o petista tinha sobre as indicações de diretores à Petrobras e a respeito dos crimes cometidos contra a estatal.
O ex-presidente negou ter conhecimento dos ilícitos e de ter relação próxima com as indicações políticas na petrolífera. Ele atribuiu aos partidos políticos, bancadas partidárias e ministros a função de indicar nomes, mas admitiu que tinha a palavra "palavra final", já que, do contrário, "não precisaria ter presidente".
No contexto desta suspeita levantada pelo MPF, Moro questionou Lula sobre um encontro com Duque no Aeroporto Internacional de Congonhas. O ex-agente público admitiu, em depoimento, ter sido questionado por Lula, na ocasião, sobre se teria contas na Suíça Segundo Duque, ao ouvir uma negativa sobre a propriedade do dinheiro no exterior, Lula teria dito que "tranquilizaria a ex-presidente Dilma". A reunião, de acordo com o depoente, teria acontecido em 2014, quando o petista não estava mais no cargo.
"Tive uma vez no aeroporto de Congonhas, se não me falha a memória, porque tinha vários boatos de corrupção e de conta no exterior. Eu pedi para que o Vaccari porque eu não tinha amizade com o Duque. Trazer o duque para conversar. Foi numa sala em Congonhas. E eu fiz a pergunta simples: tem matérias nos jornais e denúncias que você tem dinheiro no exterior. Que tá pegando da Petrobras e colocando no exterior. Você tem conta no exterior? Ele disse: 'eu não tenho'. Eu falei: 'acabou, se não tem, não mentiu pra mim, mentiu para ele mesmo'", afirmou Lula.
"O Vaccari tinha mais amizade com ele do que eu. Eu não tenho nenhuma. Eu não sei se tem amizade. Liguei para o Vaccari e falei: Vaccari, você tem como pedir para o Duque ir numa reunião aqui? Ele falou tenho e ele levou Duque lá", complementou.
Inicialmente, antes da declaração sobre o encontro, Lula havia dito que só tomou conhecimento da relação de Vaccari com Duque quando foi denunciado. "Não sei (se ambos tinha relação). Eu sei que tinha porque, na denúncia, aparece que eles tinham relação "
Mais tarde, no mesmo depoimento, após relatar a reunião em que admitiu ter pedido a Vaccari para intermediar o contato com o ex-diretor da estatal, o ex-presidente foi questionado por Moro: "Salvo equívoco, eu perguntei há pouco se o senhor sabia que ele tinha uma relação e o senhor disse: 'não'. Então o senhor tinha conhecimento de que tinha essa relação".
"Eu pedi para o Vaccari e perguntei se ele tinha como trazer o Duque numa reunião e ele falou que tinha. Isso não implica que ele tenha relação. Implica que ele podia conhecer."
Ao ser questionado novamente se sabia ou não da relação entre ambos, Lula voltou a negar. "Eu quero lembrar o seguinte. Relação de amizade é uma coisa e relação é outra. Eu posso sair daqui dizendo: 'olha, eu conheci dr. Moro, eu tenho relação com ele'. E, na verdade, não tenho."
Moro voltou a perguntar sobre o tipo de relação que o ex-tesoureiro do PT tinha com o diretor da Petrobras.
"Não sei. O Vaccari está preso, você pode perguntar para o Vaccari. O Duque está preso, você pode perguntar ao Duque", rebateu.
No âmbito dos esquemas da Petrobras, Vaccari foi condenado sob a acusação de que intermediava propinas ao PT dentro da estatal. De acordo com depoimento de Duque, o ex-tesoureiro era o arrecadador de vantagens ilícitas para o partido sobre contratos na petrolífera.
A denúncia do MPF sustenta que Lula recebeu R$ 3,7 milhões em benefício próprio - de um valor de R$ 87 milhões de corrupção - da empreiteira OAS, entre 2006 e 2012. As acusações contra Lula são relativas ao recebimento de vantagens ilícitas da empreiteira por meio do triplex 164-A no Edifício Solaris, no Guarujá (SP), e ao armazenamento de bens do acervo presidencial, mantido pela Granero de 2011 a 2016. O petista é acusado de lavagem de dinheiro e corrupção.
O Edifício Solaris era da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop), a cooperativa fundada nos anos 1990 por um núcleo do PT. Em dificuldade financeira, a Bancoop repassou para a OAS empreendimentos inacabados, o que provocou a revolta de milhares de cooperados. Vaccari foi presidente da Bancoop.
A ex-primeira-dama Marisa Letícia (morta em fevereiro) assinou Termo de Adesão e Compromisso de Participação com a Bancoop e adquiriu "uma cota-parte para a implantação do empreendimento então denominado Mar Cantábrico", atual Solaris, em abril de 2005.
Em 2009, a Bancoop repassou o empreendimento à OAS e deu duas opções aos cooperados: solicitar a devolução dos recursos financeiros integralizados no empreendimento ou adquirir uma unidade da OAS, por um valor pré-estabelecido, utilizando, como parte do pagamento, o valor já pago à Cooperativa.
Segundo a defesa de Lula, a ex-primeira-dama não exerceu a opção de compra após a OAS assumir o imóvel. Em 2015, Marisa Letícia pediu a restituição dos valores colocados no empreendimento.
A Lava Jato afirma que a OAS pagou durante cinco anos pelo aluguel de dez guarda-móveis usados para armazenar parte da mudança do ex-presidente Lula quando o petista deixou o Palácio do Planalto no segundo mandato. A empreiteira desembolsou, entre janeiro de 2011 a janeiro de 2016, R$ 1,3 milhão pelos contêineres, ao custo mensal de R$ 22.536,84 cada.
Toda negociação com a transportadora Granero teria sido intermediada pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, que indicou a OAS como pagante com o argumento de que a empreiteira é uma "apoiadora do Instituto Lula".
Para investigadores da Lava Jato, os fatos demonstram "fortes indícios de pagamentos dissimulados" pela OAS em favor de Lula. Isso porque o contrato se destinava a "armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da construtora OAS", mas na verdade os guarda-móveis atendiam a Lula.