O plenário do Tribunal Superior do Trabalho (TST) adiou o julgamento da revisão de mais de 30 súmulas para adaptá-las à Lei 13.467, de 2017, conhecida como Lei da Reforma Trabalhista. Uma comissão foi criada para discutir o tema e apresentar uma proposta em até 60 dias, que será colocada em votação no plenário da Corte.
Súmulas são orientações criadas para balizar os votos dos ministros e as decisões do tribunal em julgamentos sobre diversos temas. Esses enunciados são elaborados a partir de decisões semelhantes ocorridas na Justiça do Trabalho em suas várias instâncias e funcionam como referência quando não há lei ou esta não é clara sobre algum aspecto.
A sessão avaliaria o parecer da Comissão de Jurisprudência do Tribunal com recomendações de adaptação de 34 súmulas à nova legislação trabalhista. Contudo, o presidente da Comissão, ministro Walmir Oliveira da Costa, solicitou a suspensão da sessão argumentando que há uma polêmica em torno da constitucionalidade da nova redação do Artigo 702 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), dada pela reforma trabalhista.
O texto incluído pela Lei 13.467 estabelece regras para sessões voltadas à definição e alteração de súmulas do TST, como quórum para aprovação, colegiados responsáveis pela análise e procedimentos de condução das reuniões. “Esse dispositivo viola flagrantemente o Artigo 99 da Constituição Federal, que estabelece o poder diretivo e de organização interna dos tribunais”, afirmou Walmir Costa. A avaliação da constitucionalidade teria que se dar antes da continuidade da sessão, argumentou o ministro.
O presidente da corte, ministro Ives Gandra, consultou os demais ministros e recebeu concordância com a ponderação, suspendendo o julgamento. Ives Gandra apresentou a proposta de criação da comissão, que também foi acatada. O presidente do Tribunal também colocou a possibilidade de elaboração de uma regra interna, denominada instrução normativa, com orientações para magistrados do trabalho em temas relacionados às súmulas, incorporando as novidades da reforma trabalhista.
A intenção de Ives Gandra é que a instrução normativa possa tratar da principal polêmica no debate das súmulas: se as novas regras instituídas pela reforma trabalhista se aplicam ou não aos contratos vigentes quando esta entrou em vigor, em 11 de novembro de 2017.
A Lei 13.467, de 2017, não foi clara em relação a isso, gerando questionamentos e dúvidas entre trabalhadores, empregadores, advogados e magistrados do trabalho. Para tentar assegurar a validade para os contratos vigentes, o governo editou a Medida Provisória 808, em novembro do ano passado, estabelecendo essa aplicação.
Contudo, a Comissão de Jurisprudência do TST avalia que a MP não poderia se sobrepor à Constituição Federal quando essa garante os direitos adquiridos em situação de uma nova lei. “Embora a aplicação imediata seja algo próprio da lei processual, isso não significa retroatividade, pois é preciso preservar a situação jurídica já incorporada sob pena de violar a Constituição Federal”, defendeu Walmir Costa.
A Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) também entende que não é possível aplicar as novas regras aos contratos já existentes quando a lei entrou em vigor. “A norma trabalhista sempre foi orientada no sentido de assegurar não apenas os direitos já consolidados como aquelas práticas inseridas em contratos em vigor, sejam individuais ou coletivos”, diz Mauro de Azevedo Menezes, advogado da entidade.
Mauro Menezes aponta como outro problema o fato da MP 808 ainda não ter sido confirmada pelo Congresso. Até agora, mais de 900 emendas foram apresentadas ao texto. Com isso, diz o advogado da Anamatra, há uma instabilidade jurídica sobre que legislação trabalhista está valendo para uma discussão sobre as súmulas.
Para além do mérito da questão da validade em relação aos contratos, há uma polêmica também sobre o momento da revisão das súmulas à luz da reforma trabalhista. Na opinião do procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury, o TST não deveria regular “por cima” as súmulas, mas fazer isso depois de um acúmulo de decisões judiciais nas demais instâncias da Justiça do Trabalho.
“Com relação à aplicação ou não aos contratos em vigor, tem que haver uma maturação. Só depois de amplamente interpretada, caberia ao Tribunal Superior do Trabalho dar a palavra final sumulando a questão. Analisar agora questões de direito material atropela uma regra da democracia do Poder Judiciário. Se o TST quiser dar a palavra final não precisa de vara do trabalho e tribunal regional”, critica.
Entidades de defesa de direitos dos trabalhadores comemoraram a suspensão do julgamento. A preocupação central era com o pouco tempo de fala pra discutir mais de 30 súmulas. “Não havia condições de ter um diálogo jurídico aprofundado. Por isso foi importante não ter uma deliberação açodada, de afogadilho. A comissão é importante pois vai permitir um maior debate sobre o tema”, disse Roberto Parahyba Pinto, presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat).