Cai o índice de jovens entre 16 e 18 anos que optam por tirar seus títulos eleitorais

Tendência reflete a atual crise política e se intensificou após escândalos e onda de protestos
Mariana Mesquita
Publicado em 23/08/2015 às 0:05
Tendência reflete a atual crise política e se intensificou após escândalos e onda de protestos Foto: Foto: Ashley Melo/JC Imagem


A cada eleição, está caindo o número de jovens entre 16 e 18 anos que optam por tirar seus títulos. Nos últimos quatro pleitos, em Pernambuco, o índice nessa faixa etária, que é contemplada com o voto facultativo, caiu 42%. O problema é ainda maior se considerarmos apenas os jovens de 16 anos, dos quais quase 56% decidiram adiar sua entrada no sistema eleitoral. A tendência se intensificou após os escândalos divulgados em 2012 e a onda de protestos ocorrida em 2013. 

A baixa poderia ser explicada caso, nos últimos anos, também tivesse acontecido uma substancial queda na quantidade geral de jovens pernambucanos. De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve uma redução de 7,5% nos números dessa faixa etária, que passou de 880.185 para 813.598 jovens entre os censos de 2000 e 2010. Mas a queda, nem de longe, foi tão drástica como os dados eleitorais demonstram. Ou seja: os jovens estão, sim, deixando para tirar seus títulos apenas quando isso se torna obrigatório. 

Essa diminuição no interesse em obter o documento não surpreende o cientista político e professor da UFPE Michel Zaidan. “A verdade é que neste momento ninguém se sente estimulado a participar da política. É como se o sistema utilizasse uma linguagem analógica e a realidade já estivesse em linguagem digital. Há um grave problema de comunicação, uma crise de representação muito grande. Esse divórcio tende a continuar e a aumentar”, analisa. 

Mas na opinião do também cientista político e professor de comunicação da Universidade Católica de Pernambuco, Juliano Domingues, estes dados não significam, necessariamente, desinteresse por parte do eleitorado jovem. “Pelo contrário. Estudos recentes indicam que o jovem participa politicamente, porém não se sente atraído pelos meios tradicionais de participação”, alerta Juliano. Ele destaca que, contraditoriamente, a eleição passa a ser vista como o anti-clímax da política, desestimulando a juventude a participar de maneira convencional. “Não se trata de apatia, e sim de ceticismo diante de formas tradicionais de participação e representação”, resume.

Zaidan concorda com a ideia de que não se trata de apatia. Ao contrário: afirma que “uma das principais características da juventude é a exigência da radicalidade”. “Os jovens exigem autenticidade, não querem meio termo. Só que na atual geração política é difícil achar quem ofereça essa oferta de uma proposta nova, que empolgue”, explica. “A juventude tem sua razão, porque vivemos o fim de um ciclo liderado pelo PT e pelo PSDB e, em meio à agonia, não achamos alternativas que possam substituir o que há no momento. Talvez por isso muitos jovens venham aderindo ao anarquismo e a movimentos sociais que partem para a ação direta, já que não há outras opções institucionais para a ação”, aponta.




TRIBUNAIS ELEITORAIS TENTAM REVERTER O PROBLEMA

A possibilidade de adesão voluntária dos jovens menores de 18 anos ao processo eleitoral surgiu em 1988, após a criação da nova constituição brasileira. A primeira vez em que eles puderam votar foi na histórica eleição direta para presidente em 1989, depois de quase trinta anos sem que se pudesse escolher um dirigente para o País.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não possui dados sobre a presença exclusiva de determinada população às urnas, e controla apenas o momento de inscrição dos eleitores no sistema. O auge da adesão dos menores aconteceu no início dos anos 1990. Em 1992, os eleitores com menos de 18 anos chegaram a representar 3,57% do eleitorado total do Brasil, somando mais de 3,2 milhões. 

Porém, após os escândalos e o subsequente impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, o declínio das inscrições se estabeleceu de forma vertiginosa. Só entre 1992 e 1996, o número de menores de 18 anos que tiraram o título caiu 34,5%. 

O presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, Antonio Carlos Alves da Silva, toma para si parte da culpa e da responsabilidade por enfrentar o desinteresse dos jovens pelo tema. “Se a juventude está desenganada, compete a nós atraí-la”, afirma ele. 

Segundo Antonio Carlos, o problema é causado pela falta generalizada de assistência nesse sentido, por parte das instituições eleitorais, dos partidos políticos, da mídia e dos próprios cidadãos, em forma geral. “Claro que o andamento da política brasileira contribui para o comportamento dos adolescentes, mas eles enxergam o processo de uma forma própria e cabe a nós explicar e valorizar o que é o sistema eleitoral. O sistema precisa estar se renovando sempre e provocando a sociedade, especialmente os eleitores do futuro”, afirma.

Por isso, junto com os demais tribunais regionais brasileiros e sob a orientação do TSE, o TRE-PE vem desenvolvendo ações de conscientização com crianças a partir dos 7, até atingir os adolescentes menores de 16 anos. “Isso é feito de forma continuada, e não apenas nos anos de eleição”, explica.

No Recife e no interior do Estado, voluntários do TRE-PE têm promovido palestras e outras atividades incentivando uma maior participação dos jovens nos cartórios eleitorais.
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