Um dos maiores investimentos em tecnologia farmacêutica da história do governo federal e referência no setor para toda a América Latina, a Hemobrás sofreu um duro golpe, ontem, com a revelação de um suposto esquema que teria desviado, segundo informações preliminares da Polícia Federal, R$ 30 milhões da empresa.
Através da Operação Pulso, a PF prendeu, na manhã de ontem, dois empresários suspeitos de fazerem lobby para o órgão junto a empreiteiras. Delmar Siqueira Rodrigues foi preso em Teresina, no Piauí, e sua filha, Juliana Cunha Siqueira, em Boa Viagem.
Também foram cumpridos mandados de busca e apreensão nas casas de três servidores da empresa: o presidente Rômulo Maciel Filho, o diretor de Produtos Estratégicos e Inovação, Mozart Sales, e gerente de Engenharia Jorge Luiz Batista Cavalcanti. Por decisão judicial, os três foram afastados dos cargos.
Ainda segundo a Polícia Federal, um dos cinco investigados – o nome não foi revelado – teria recebido grandes quantias em dinheiro e repassado a assessores de diversos políticos, para uso em campanhas eleitorais em 2014. Os nomes dos políticos beneficiados e dos assessores também não foram fornecidos pela PF.
De acordo com a Polícia Federal, as irregularidades foram praticadas em diversos contratos da Hemobrás. Um deles tem relação com processo de armazenamento do plasma sanguíneo utilizado para a fabricação de medicamentos. O contrato inicial, no valor de R$ 800 mil, foi desfeito para que uma outra empresa fosse contratada, sem licitação, “para realizar o mesmo serviço por R$ 8,3 milhões”, afirmou o delegado Wagner Menezes, coordenador da operação.
Os policiais também apontaram indícios de sobrepreço de R$ 6 milhões nas obras de construção da Hemobrás, no município de Goiana (Zona da Mata Norte). Um outro contrato, também relativo à construção da planta, passaria o valor da obra de R$ 22 milhões para R$ 74 milhões, mas o Tribunal de Contas da União barrou a mudança. Segundo a Polícia Federal, alguns integrantes do suposto esquema têm contas bancárias em paraísos fiscais.
Entre os envolvidos, o nome mais conhecido é do médico Mozart Sales. Ele foi figura de proa no Ministério da Saúde durante da gestão do ex-ministro Alexandre Padilha, entre 2010 e 2014, no primeiro governo Dilma Rousseff. Idealizou e coordenou a implantação do programa Mais Médicos no País. Candidato a deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT) nas últimas eleições, teve 73.967 votos, mas não foi eleito. Desde março exercia o cargo de diretor de Produtos Estratégicos e Inovação na Hemobrás.
CHUVA DE DINHEIRO - Um episódio pitoresco ocorreu durante as buscas na residência do diretor-presidente da empresa, Rômulo Maciel Filho, no Cais de Santa Rita, área central do Recife. No início da manhã, enquanto os agentes da Polícia Federal subiam ao apartamento do servidor para cumprir o mandado de busca e apreensão, um pacote de dinheiro, contendo vários maços de notas de R$ 50, foi arremessado do prédio, caindo perto de um dos policiais que tinha ficado no estacionamento.
A PF não confirma se o dinheiro foi jogado da residência de Rômulo. “Vamos fazer perícias para tentar identificar impressões digitais nas cédulas e saber de onde vieram”, informou o superintendente da PF em Pernambuco, Marcello Diniz Cordeiro. O episódio rendeu gozações na internet.
A Polícia Federal também apreendeu 70 obras de arte no apartamento do presidente da Hemobrás, por denúncias de que seriam usados para lavar dinheiro. Rômulo Maciel Filho, Mozart Sales e Jorge Cavalcanti se apresentaram espontaneamente e prestaram depoimento na sede da PF, no Cais do Apolo. Nenhum deles falou com a Imprensa.
Em nota, a Hemobrás informou que está colaborando com as investigações e que sua operação continua normalmente. Também por nota, Mozart Sales negou ter cometido qualquer ilícito e disse que prestou esclarecimentos à Polícia Federal na condição de testemunha. “Não teve ordem de prisão, apenas aparelhos de celular apreendidos”, diz a nota.