Pipoca, confeito, tudo o que a idosa Maria Soares, 66 anos, vendia no terraço de sua casa foi levado pelas águas em Rio Formoso, ela contou ao JC emocionada. Mais do que tocar obras físicas e reequipar prédios públicos, o desafio que se impõe aos municípios atingidos pelas enchentes é garantir que as pessoas possam voltar a viver com dignidade. Na casa de Maria Soares, a água veio sorrateira, pelo quintal, tomou os cômodos, engoliu o fogão, levou o aparelho de TV e o liquidificador.
"O balcão que a gente está vendendo, as compras que a gente estava vendendo. Desapareceu tudo. A gente não pode pegar. A gente é velho, se fosse pegar, morria afogado. Porque aqui nessa rua andou uma canoa", lamenta a idosa, que mora com o marido. "Eu vendia minhas coisinhas. Era confeito, pipoca. Tudo de coisa miúda eu vendia. Fiquei sem nada. Fiquei sem dinheiro, sem nada", lembra.
Em Barreiros, a babá Gilvânia Santiago, 44 anos, nem viu quando a enchente consumiu armário, sofá, guarda-roupa, fogão e panela na casa que fica às margens do Rio Una. Ela passou o fim de semana no trabalho. "Eu deixo a chave com a minha mãe. Meu irmão tirou só as roupas e os documentos", explica. Desde então, ela e o filho de 7 anos se mudou para a casa do irmão. A dela, que continua em pé na área de risco, também foi atingida pelas cheias de 2001 e 2010. Por isso, ela espera conseguir outra moradia em um local mais seguro. "Eu perdi tudo. Não fiquei com um prato. Não fiquei com uma colher. Minha patroa que comprou prato e garfo para mim", afirma.
Como Gilvânia, há um contingente. Mais de 36 mil pessoas ficaram temporariamente desalojadas no Estado em função das enchentes, segundo levantamento do governo de Pernambuco. Outros 3.296 pernambucanos ficaram desabrigados e não têm mais onde morar.
Vanessa Priscila, 25 anos, deveria ser uma dessas. A barreira que fica por trás da casa dela cedeu, derrubou o muro do quintal e estraçalhou a oficina que ficava ao lado. O imóvel está condenado pela Defesa Civil porque o barro pode cair a qualquer momento sobre a cozinha. Ela, o marido e o filho de dois anos não saíram porque não têm ao certo para onde ir. Os quatro parentes mais próximos moram numa casa vizinha. "Tenho medo. Nunca caiu desse jeito, não. Antes já tinha caído. Mas como a gente fez o muro lá do outro lado, que agora rachou, não tinha caído mais. Dessa vez, entrou terra dentro de casa", diz.