As consequências provocadas pela desaceleração da economia nos últimos anos, continuam batendo na porta dos municípios brasileiros. Prova disso, são os índices apresentados pela Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios Contínua (PNAD), em que há cerca de 12,7 milhões de desempregados no Brasil - em Pernambuco, pelo menos 671 mil pessoas seguem desempregadas. Este cenário acaba por despertar a reflexão sobre que tipo de papel o poder público municipal pode exercer para reverter esse cenário. Ao analisar de forma mais específica para cada região do estado, temos as cidades de Bodocó, Serra Talhada e Petrolina, como aquelas que mais abriram postos de trabalho, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Os dados são referentes a janeiro e julho de 2019, mostrando também que outras cidades como Sirinhaém, Moreno e Ipojuca, vivem uma realidade oposta, sendo as que mais fecharam vagas de emprego.
Para o analista do IBGE, Marcelo Dantas, um dos pontos a ser considerado em todo o cenário nacional é a taxa de desocupação, que são as pessoas que ainda estão procurando emprego. Pernambuco está no ranking como o terceiro estado com a maior taxa de desocupados, ficando atrás apenas da Bahia e do Amapá. “O Nordeste exibe historicamente uma necessidade maior da presença da administração pública. Ele apresenta isso historicamente por conta da condição estrutural dele, de maior necessidade. Você ter um setor público e privado menor no nordeste, você tem uma necessidade maior de investimento público. Como acontece em qualquer País do mundo”, disse.
De acordo com o economista da Fecomércio, Rafael Ramos, no que diz respeito ao favorecimento de um cenário para investimentos privados, o poder público tem a responsabilidade de organizar o município ou o Estado para conquistar a confiança dos empresários. “Deve ser pautado na questão da geração de confiança. E aí muito ligado a questão de atração de investimento. Então eu acho que o papel do poder público é mostrar para os investidores, para empresários que queiram se instalar no município, que naquele município ele vai ter vantagens de estar ali”, explica. O coordenador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, André Marques, concorda com o economista no que diz respeito a relação de confiança entre gestores públicos e empresários, mas alerta que os prefeitos devem fazer seu “dever de casa” quando o assunto é reverter o quadro de desemprego nos municípios. “Antes de tudo isso ele tem um dever de casa a ser feito, porque não adianta você se relacionar com empresários, se relacionar com um monte de investidores, você precisa ter o que oferecer, você precisa ter o que vender, você precisa ter o que mostrar. Então tem um trabalho de dever de casa, de arrumação da casa. De botar as contas em dia. Nenhum investidor vai para um lugar se essas regras aqui estão assim”.
O prefeito de Afogados da Ingazeira e presidente da Amupe, José Patriota (PSB), afirma que os municípios, sobretudo os do interior, tem trabalhado a questão do empreendedorismo como uma alternativa ao desemprego. “Acho que é o caminho, porque quando não se tem o trabalho formal, não se tem na prefeitura e em um mercado de trabalho cada vez mais escasso por uma questão econômica, a crise econômica”, disse. O Sebrae, por exemplo, tem realizado diversas parcerias com as gestões municipais. Nas cidades do Litoral Sul, a analista da instituição, Ana Marina, ressalta que as atividades feitas em parceria entre prefeituras e empresas privadas, tem gerado um saldo positivo e ajudado as pessoas a saírem da informalidade. “No final do ano a gente fez uma atividade para que eles pudessem expor numa pequena feirinha que a gente organizou junto com uma jornada, e teve gente que só participou da primeira porque teve tanta encomenda que não conseguiu participar da segunda porque não podia parar o negócio”, contou a analista sobre um evento no Cabo de Santo Agostinho.
O governo do Estado tem feito um levantamento regional para descobrir qual a vocação de cada lugar. O intuito é instalar programas de geração de renda e emprego, nas regiões que não tem como levar grandes empresas. “Vamos lançar em breve um projeto voltado para o empreendedorismo, para a gente conseguir preencher essa lacuna. Estamos em uma crise nacional, em Pernambuco conseguimos 60 novos empreendimentos”, ressaltou Alberes Lopes, Secretário do Trabalho, Emprego e Qualificação de Pernambuco. O último levantamento do Caged, que foi divulgado nesta quinta-feira (22), mostrou que mesmo com o desaquecimento da economia, as regiões do Estado que já trabalham com um tipo de mercado específico, estão conseguindo se manter em crescimento, como é o caso de Petrolina, que há muitas décadas possui trabalho na área de Fruticultura. “Vem crescendo ano a ano, tanto na capacidade de produção quanto em novos mercados que vão surgindo entre o ano passado e esse ano. Então se precisa de mais pessoas para se trabalhar na área do campo, na área de gado”, disse o prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (Sem Partido).
O município de Ipojuca, localizado no Litoral Sul do Estado, ainda amarga a desaceleração econômica em consequência do fim das obras do Complexo de Suape e o encerramento das atividades da Refinaria Abreu e Lima. Segundo o levantamento do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), referente ao período de janeiro a julho deste ano, o município alcançou a média de -11,80% - ou seja, a cidade fechou mais postos de trabalho do gerou vagas de emprego.
Desempregada, Maria Eduarda Cavalcanti, de 19 anos, mora apenas com sua mãe. Seu sonho, era cursar uma faculdade de enfermagem, mas devido as dificuldades financeiras, precisou procurar capacitação profissional para outra área. “Não tinha condições de fazer faculdade, então desisti. O que mais desejo é ter independência financeira e ajudar em casa, mas as dificuldades de arrumar um emprego estão grandes”, declarou a jovem. O diretor de Desenvolvimento Econômico de Ipojuca, Tony Kuo, afirma que a crise em relação ao desemprego é um cenário nacional, mas que o poder público de Ipojuca não está inerte a este quadro. “Pernambuco dependia muito dos empreendimentos estruturadores que tiveram seu boom no estado entre 2007 até 2010. Ipojuca acabou sentindo o maior impacto, porque a maioria destes empreendimentos estão localizados nessa região. Porém estamos otimistas com a reativação de parte da Refinaria, mesmo que o impulso econômico não seja o mesmo de antes”.
O IBGE apontou que em 2013, na construção da refinaria Abreu e Lima foram contratados mais de 45 mil trabalhadores. Após seis anos restaram apenas 650 empregados. Uma redução de 98,6% no número de vagas.
Para Tony Kuo, não cabe ao município ficar apenas a reboque do Complexo Portuário, como era no passado. É necessário implementar atrativos para outros tipos de empreendimentos e estabelecer políticas mais eficazes para as empresas que continuam atuando na área. “Nós estamos finalizando projetos de incentivos fiscais, que serão submetidos à Câmara Municipal. Também estamos trabalhando com a ampliação das atividades da LM Wind Power, um dos maiores produtores mundiais de pás eólicas, para mais de 20% da sua capacidade de mão de obra. Além dos investimentos nas áreas de hotelaria e entretenimento”, afirmou o diretor.
Sem oportunidade, os profissionais especializados no segmento da construção civil e industrial, precisam readequar seus perfis ao mercado de trabalho. De vocação turística, Ipojuca possui mais de 20 mil empregos diretos dentro deste setor. Com o projeto Emprega Ipojuca, a gestão tem ofertado cursos de qualificação - são 20h/aula - para cargos de camareira, garçom, auxiliar administrativo e recreador.“O desemprego tem aumentado, mas não queremos aqui empregar por empregar. Muitas empresas reclamam que os funcionários são bons no que fazem, mas deixam a desejar no comportamento. Então aqui ele vai se preparar melhor”, afirmou a coordenadora do Emprega, Alcione Gonçalves.
Para o instrutor do projeto, Aldair Ivo Aureliano, de 24 anos, muitos jovens quero poder ajudar nas despesas da casa e obterem a indenpendência financeira, mas esbarram na falta de dificuldades. “Eles sabem que o mercado está difícil e por isso buscam a capacitação. Muitos não teriam condições de custear uma faculdade, mas não querem deixar de se especializar em alguma área”, declarou. Mesmo dividia entre alta e baixa temporada, a rede hoteleira continua sendo o maior empregador na região. “Como o estaleiro foi desativado, queremos sensibilizar as redes para contratarem a mão de obra que era de lá. Principalmente em relação a realidade salarial. Por isso temos trabalhado diretamente com os departamento de recursos humano dos hotéis”, explica Alcione.
O secretário do Trabalho, Emprego e Qualificação de Pernambuco, Alberes Lopes, reconhece as perdas causadas por Suape para a região. “Perdemos mais do que os outros estados, por isso os números da gente ficaram piores. Estamos com poucos recursos para qualificar, para dar um melhor atendimento nas agências, fazer uma intermediação melhor. Tudo isso atrapalha. É a crise econômica e o que a gente sofreu diferente dos outros estados por causa de Suape”, declarou
Em tempos de desemprego alto no Estado e incertezas na economia nacional, o município de Moreno, localizado a 33 km do Recife, luta por soluções e investimentos. Segundo um estudo realizado pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), com dados do Ministério do Trabalho (MTE) referente ao mês de janeiro a junho deste ano, a cidade foi a segunda que mais fechou vagas do que abriu, alcançando uma taxa negativa de -16,47%. Para se ter uma ideia, foram abertas 582 vagas e fechadas 1.486.
De acordo com o prefeito do município, Vavá Rufino (PTB), os números pessimistas estão ligados a crise econômica do País, a recessão do Complexo Industrial Portuário de Suape, ao fechamento de usinas de cana-de-açúcar nas redondezas e a falta de emprego nas cidades mais próximas, como Recife e Jaboatão dos Guararapes.
“Isso é fruto de uma coisa que está acontecendo no Brasil e na região. A demanda está complicada graças a crise econômica que impacta na geração de emprego e até na manutenção do trabalho. Naturalmente, quando há uma decisão de desativação ou redução de produção de alguma empresa próxima de Moreno, de certa forma, conta negativamente”, contou. Para melhorar esse cenário, o prefeito ainda disse que está sendo elaborado o Plano Municipal de Qualificação Profissional, mas que não há uma data definida para o início da implementação.
Há anos, o município podia contar com diversas fábricas e usinas de açúcar, que atualmente se encontram desativadas. O aposentado Severino Bernadino dos Santos, de 62 anos, é um dos ex-funcionários da antiga fábrica de papel Incelpa. Segundo ele, o desequilíbrio econômico em Moreno levou não somente a falta de emprego para os cidadãos, mas também ao afastamento do lazer. “Moro aqui há mais de 60 anos e nunca vi a situação como está. Uma pessoa que mora em Moreno, se quiser emprego, precisa se virar. Antigamente, quando eu trabalhava na fábrica, tinha até cinema. Ou seja, tinha uma estrutura, uma vida. Hoje dá pena”, lamentou.
Entre as pessoas que precisam se virar, está Juliana Batista, 29 anos. Desempregada desde que terminou os estudos em 2010, a jovem chegou a fazer uma entrevista de emprego para a vaga de serviços gerais, mas não recebeu nenhum retorno até o momento. “Aqui em Moreno não se tem nada para oferecer. Se conseguir, é porque tem amigos ou pessoas para indicar”, afirmou.
Mesmo ainda necessitando de investimentos, o município possui dois empreendimentos fundamentais: a Tramontina e a Capricche. A primeira ainda está expandindo os negócios e possui poucos funcionários. Já a empresa de alimentos e bebidas, segundo Vavá, funciona em quatro turnos, empregando vários morenenses. “A Capricche está em processo de um centro distribuidor, então isso vai gerar ainda mais mão de obra. Ela também possui mais de 860 funcionários, sendo 80% de Moreno. Nós temos também a Tramontina, que está em processo de ampliação da planta, de uma nova unidade”.
A reportagem entrou em contato com a Tramontina, que confirmou os planos de expansão até o fim do próximo ano. Já a Capricche não atendeu aos telefonemas até o fechamento desta edição.
A cidade, antigamente, também contava com o período de moagem das usinas de cana-de-açúcar, como a desativada Auxiliadora, para gerar empregos. Segundo o presidente do Sindicato dos Cultivadores de Cana-de-Açúcar de Pernambuco (Sindicape), Gerson Carneiro Leão, quando centros perdem esse tipo de manufatura, como Moreno, os maiores prejudicados são os habitantes. “Quando uma usina fecha, os trabalhadores têm que se virar, arrumarem alguma outra ocupação. Muitos chegam até a irem para Goiás, atrás de outras usinas, porque é o que sabem fazer da vida”, ressaltou.