Doutor em estudos de cinema e audiovisual, o jornalista Alexandre Figueirôa ressalta que é difícil filmes traduzirem o adoecimento mental de forma convincente e sem recorrer aos clichês em que os portadores de transtornos são geralmente apresentados de forma caricata. "Retratar os delírios de quem enfrenta esse tipo de problema não é fácil", diz Figueirôa à repórter Cinthya Leite.
JC - Como vê a saúde mental abordada nos filmes?
ALEXANDRE FIGUEIRÔA - Os transtornos mentais são fontes de inspiração e tema central de muitos filmes de ficção. Algumas obras, inclusive, tornaram-se marcos da história do cinema como é o caso de Shock Corridor (1963), um dos filmes mais importantes do cineasta norte-americano Samuel Fuller, em que um jornalista simula estar com problemas mentais para ser internado num hospício e investigar um assassinato e acaba meio perturbado mentalmente. Ainda na fase muda do cinema, vale lembrar o alemão O Gabinete do Dr. Caligari (1920), de Robert Wiene, história em que um sonâmbulo sob o efeito de hipnose comete vários crimes. Ao final, ficamos sabendo que a história é a visão de um louco internado num hospício.
JC - Que outros filmes podem entrar nessa temática?
FIGUEIRÔA - Outro exemplo mais recente é O Iluminado (1980), do grande cineasta Stanley Kubrick, em que Jack Nicholson interpreta o zelador de um imenso hotel que tem sua sanidade mental afetada por um passado sombrio e se revela um perigoso psicopata. Também inesquecível é o sensível Rain Man (1988), de Barry Levinson, em que um homem é obrigado a cuidar do seu irmão autista e aprende a conviver com o rapaz depois de enfrentar inúmeras dificuldades.
JC - Consegue ver limitações nesses tipos de filmes?
FIGUEIRÔA - Uma das maiores dificuldades desse gênero de filme é traduzir o universo das doenças mentais de forma convincente e sem recorrer aos clichês em que os portadores de transtornos são geralmente apresentados de forma caricata. Retratar os delírios ou a visão interior de quem está enfrentando este tipo de problema também não é fácil. Imagens distorcidas, trucagens com superposições e cores aberrantes nem sempre são suficientes para a obtenção de um resultado que revele realmente o que se passa na mente de um doente.
JC - Podemos dizer que a maioria dos longas desse gênero é assim?
FIGUEIRÔA - Observo que a abordagem dos filmes sobre doenças mentais está mudando também de acordo com a própria compreensão que se tem hoje sobre loucura, depressão e outros distúrbios. Nos dias atuais, o enfoque dado ao tema tem visado quebrar preconceitos, apontar a convivência e o apoio aos portadores de transtornos mentais como a melhor maneira de ajudá-los. Assim, alguns filmes criticam tratamentos ultrapassados, como o choque elétrico e o isolamento dos doentes em hospícios.
* Leia a matéria completa na edição impressa de Arrecifes deste domingo (16/9).