Sem combate à corrupção e economia liberal. Saída de Moro é o fim do primeiro governo Bolsonaro

Há quem diga que Bolsonaro está dando uma guinada para sair mais forte. Pode acontecer, mas como consequência inesperada dos acontecimentos. A estratégia de Bolsonaro, por enquanto, é de sobrevivência. E parece bem desesperada
Igor Maciel
Publicado em 24/04/2020 às 11:35
Em janeiro de 2019, Bolsonaro empossa Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato e responsável pela prisão do ex-presidente Lula, como o ministro da Justiça do Brasil. Foto: VALTER CAMPANATO/AGÊNCIA BRASIL


A crise fez Bolsonaro sofrer um tipo de metamorfose em busca de sobrevivência para ele e para os filhos na qual é capaz de desdizer tudo o que disse e ainda assumir o papel de grande oposição ao que já foi. Desde que fique no poder. A demissão de Sergio Moro representa mais um ponto de virada para o governo Jair Bolsonaro. Aliás, esqueçam o governo Jair Bolsonaro que existia até alguns dias atrás. Aquela gestão acabou. Tanto acabou que Moro está saindo e Paulo Guedes, no curto espaço de alguns dias, tornou-se um estranho no ninho.

No caso do ex-juiz, a aproximação que Bolsonaro faz com setores do centrão, inclusive com personagens condenados por corrupção ou investigados, transformou o então ministro da Justiça em figura decorativa, um bibelô na estante, um trofeu. Tudo, menos o herói da Lava Jato que abandonou a carreira de juiz para espalhar o combate à corrupção pelo País.

Já o ministro da Economia, de formação liberal, que ia modificar paradigmas da política financeira e fiscal brasileiras, ficou à deriva após os militares do Planalto lançarem, sem a presença dele, um plano de recuperação da Economia que poderia se chamar PAC 3, sem nenhum exagero.

O plano tem a mesma base desenvolvimentista do regime militar nos anos 1970, que causou hiperinflação, e dos Planos de Aceleração do Crescimento do PT. Só faltou chamar Dilma Rousseff, que se elegeu presidente como “Mãe do PAC”, na época, para ser a coordenadora.

Mas não foi algo que aconteceu de uma hora para outra. Desde que assumiu o governo, Bolsonaro percebeu que não seria possível manter a “carta branca” prometida aos ministros. Sensível demais às pressões que sofre da igreja, de empresários bolsonaristas ou das redes sociais, o presidente começou a interferir desde o primeiro momento, para se garantir e não melindrar apoiadores.

Moro, por exemplo, perdeu o controle sobre o Coaf quando Bolsonaro percebeu que ele poderia ter acesso às movimentações financeiras de qualquer suspeito. E se o suspeito viesse a ser um aliado ou, pior, um filho?

Por falar em filhos, tentou demitir o diretor da PF, Maurício Valeixo, pela primeira vez em 2019. Na época, queria que o superintendente da PF do RJ fosse exonerado porque estavam investigando o filho dele, Flávio Bolsonaro, no caso das rachadinhas, e o presidente estava indignado por não poder interferir. Valeixo não demitiu e ele resolveu demitir Valeixo. Moro não aceitou e Bolsonaro foi obrigado a engolir.

Agora, a demissão vem no momento em que o STF autoriza investigação contra as pessoas que organizaram e incentivaram os atos pró-golpe do dia 19. Informações preliminares dão conta que Carlos Bolsonaro, o filho 03, estaria envolvido. E quem vai investigar é a PF.

Por isso a pressa para trocar Valeixo, mesmo que isso signifique a perda do ministro mais popular do governo.

Enquanto isso, o presidente enche o Planalto de militares, para tentar colocar uma dúvida em Rodrigo Maia e garantir que ele tenha medo de aceitar algum dos muitos pedidos de impeachment sobre a mesa.

Há quem diga que Bolsonaro está dando uma guinada para sair mais forte. Pode acontecer, mas como consequência inesperada dos acontecimentos. A estratégia de Bolsonaro, por enquanto, é de sobrevivência. E parece bem desesperada.

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