O ano de 2023 já foi encerrado, mas o de 2022 ainda não acabou para o mundo político. Existe uma expectativa sobre a continuidade ou não da divisão entre lulistas e bolsonaristas nas eleições deste outubro, um tipo de terceiro turno disputado entre prefeitos.
Mas não há flores para os petistas na esquerda e muito menos para a direita em 2024.
Bolsonaro
Após ser derrotado quando tentava a reeleição, Bolsonaro (PL) se viu na situação curiosa de quem fracassa com votação alta. Perde o cargo, mas poderia manter um patrimônio eleitoral.
Rapidamente, o seu partido enxergou nisso uma oportunidade para as disputas municipais. A força do bolsonarismo poderia garantir eleições importantes em capitais, levar o lulopetismo a uma derrota nas prefeituras e encaminhar a direita ao Planalto outra vez em 2026.
Para garantir isso e ser um tipo de garoto propaganda/influencer do PL, o ex-presidente ganhou cargo, sala, equipe e salário de mais de R$ 40 mil pagos pela sigla.
O plano era bom. O problema, como sempre, é a realidade.
Sem fidelidade
Esse patrimônio eleitoral do ex-presidente tem um defeito de fabricação que é a formação dele. Há pouca fidelidade porque a comunicação de Bolsonaro sempre foi falha. E isso atraiu um grupo heterogêneo de apoiadores.
O lulopetismo está tomado por militantes carregando suas bandeiras mais ou menos uniformes, incluindo as tolices ingênuas ou fabricadas. Já os bolsonaristas, com poucas exceções, estavam divididos entre radicais inconsequentes, pragmáticos conscientes e aliados fisiológicos.
Fora isso, há um Gilson Machado (PL) aqui e ali. O pernambucano é um dos poucos que não se enquadra nessas três categorias. Mas é uma raridade.
A vida seguiu
Depois das eleições perdidas, os radicais invadiram os três poderes em janeiro de 2023, foram presos e muitos se afastaram quando se sentiram abandonados pelo líder.
Os pragmáticos se afastaram quando Bolsonaro ficou inelegível, porque entendem que não há "esperança" no curto prazo.
E os fisiológicos seguiram seu caminho lógico e atualmente são aliados de Lula, o presidente sentado na cadeira.
Pra completar, dentro do próprio PL os atritos são praticamente diários e a sigla quase não se move. A direção do partido, nos bastidores, reclama que Bolsonaro não se empenha. Bolsonaro diz que não é demandado.
Lula
Do outro lado, o PT briga com o PT no planejamento eleitoral, mas a maior dificuldade é tentar administrar o poder dos aliados nas prefeituras espalhadas pelo Brasil. E os aliados, que têm muito mais prefeituras do que o PT, não vão aceitar ser atropelados pela máquina federal.
Enquanto o PL pretende fazer prefeitos sob sua sigla para dizer que "venceu os petistas no país", os petistas são obrigados a aceitar que, tendo o presidente, é preciso ceder as gestões municipais para outras siglas e garantir a governabilidade no Congresso.
Quem manda nos prefeitos
Não dá pra brigar com o PSD, por exemplo, e lançar candidatos em cidades que os correligionários de Gilberto Kassab (PSD) consideram de alta prioridade.
Se brigar com o PSD na eleição municipal, Lula pode perder o apoio de 42 deputados federais e 10 senadores.
Se brigar com o PP, pode perder 47 deputados federais e 7 senadores. Só para citar alguns exemplos.
Briga pesada
Quando o PSD, o PP, o União Brasil e o MDB chegarem para o presidente e disserem que "não abrem mão" dessa ou daquela prefeitura, o PT será, quase sempre, obrigado a aceitar.
E não é raro de acontecer, pelo tamanho desses partidos. O PSD, hoje, tem o maior número de prefeituras do Sudeste e o maior do Brasil (428). No Nordeste, o partido com maior número de prefeituras é o PP (256). O União Brasil é majoritário no Norte (115) e no Centro-Oeste (150). O MDB manda no Sul (251).
Quase nanicos
O PT só comanda 227 municípios no Brasil inteiro.
O PSD comanda quase mil (968), o MDB está à frente de 838 prefeituras e o PP tem 712 prefeitos. O União Brasil tem 564. Todos são aliados, com cargos em ministérios.
Com os seus 227 prefeitos, o PT já perde atualmente para o PL. O partido de Bolsonaro, hoje, tem 371 prefeituras.
Mesmo assim, os partidos de Bolsonaro e Lula, comparados com os dos "colegas", são quase nanicos nos municípios.
Lavareda, de Bolsonaro a Lula
O cientista político Antônio Lavareda conseguiu reunir em seu livro mais recente, “De Bolsonaro a Lula III”, dados importantes sobre as conturbadas eleições de 2022 com uma capacidade analítica singular.
O livro parte dos números, indiscutíveis para derrubar ou reforçar teses que acabam sendo repetidas diariamente até hoje nos canais de opinião pública e nas redes sociais sobre polarização ideológica ou sobre o “aperto” do resultado obtido pelo atual presidente. Foi realmente tão apertado assim?
A leitura é essencial para este ano de eleições municipais que já está sendo tratado como um tipo de terceiro turno do pleito de 2022.