Os direitos do consumidor, por Edilson Vieira

Consumidor

Por Edilson Vieira
NOVAS REGRAS

O que muda na contratação de seguros a partir de março

Desregulamentação do setor promete apólices mais flexíveis e opções mais baratas. Especialistas recomendam ao consumidor atenção nos contratos para não sair perdendo

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Edilson Vieira

Publicado em 27/02/2021 às 9:36
Crescimento aponta recuperação, embora os números ainda não correspondam aos anteriores à pandemia - BANCO DE IMAGENS

A partir da próxima segunda-feira, 1 de março, contratar um seguro no Brasil será diferente de como é hoje. A propalada desregulamentação do setor foi anunciada pelo governo como um avanço. O objetivo é oferecer novos produtos, ampliar a cobertura dos seguros e reduzir o preço para o consumidor final. Mas este novo momento do mercado não é um consenso.

O seguro mais popular entre os brasileiros é o de automóvel, correspondendo a 44,8% dos contratos em 2020. Mesmo assim, a estimativa é que apenas 30% da frota nacional (47 milhões de veículos) esteja segurada. Em seguida vem o seguro rural, que registrou um grande crescimento no ano passado, chegando a 8,7% de participação. Os chamados “seguros compreensivos”, aqueles de ampla cobertura, representaram 8,2% do mercado em 2020. Fechando o ranking do cinco tipos de seguros mais contratados vem o habitacional (5,7%) e o patrimonial (4,9%). A intenção do governo federal ao decidir liberar o mercado de seguros de danos no Brasil foi permitir que as seguradoras possam oferecer aos consumidores, apólices mais flexíveis.

A seguradora poderá oferecer “combos”, como seguros que englobem, ao mesmo tempo, as categorias vida, residencial e de automóveis no mesmo contrato. Outra novidade é a possibilidade de implementação do chamado seguro intermitente, ou “liga-desliga”. Nesta modalidade, o seguro do carro só passa a valer quando o veículo estiver fora da garagem, em circulação. Já a casa só estaria coberta do risco de incêndio quando os moradores saíssem para o trabalho ou viajassem.

Antes da desregulamentação, esses tipos de contrato seriam impossíveis, ou muito difíceis de serem viabilizados. Isto acontecia porque os contratos fora do padrão precisavam passar pela análise prévia e aprovação das condições contratuais pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), autarquia do Governo Federal ligada ao Ministério da Economia, responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro. Na prática, a desregulamentação acaba com os planos padronizados.

A Susep estima que no segundo semestre deste ano as seguradoras já passem a oferecer as novas formatações de seguros. As mudanças ainda estão sendo assimiladas pelo mercado, mas o receio é que elas tragam dificuldades, em vez de facilidades e seguros mais baratos.

LIBERAÇÃO

O advogado Vitor Boaventura, sócio do escritório Ernesto Tzirulnik Advocacia, especializado em Direito do seguro e Direito regulatório, em São Paulo, diz que as novas regras podem não trazer, necessariamente, benefícios ao consumidor. Ele acredita que está havendo uma confusão entre regulamentação e desregulamentação. Para o advogado, a Circular 621 da Susep, que estabelece as novas regras para os seguros de danos, traz diretrizes importantes sobre a formatação dos contratos, como a redação clara e a necessidade de as apólices relacionarem os riscos cobertos e os riscos excluídos, tudo de forma inteligível ao consumidor. “Mas a mesma circular acaba com a regulação que havia antes nos contratos padronizados e meio que anula a prerrogativa da Susep de defender o interesse dos consumidores de seguros. Antes, quando uma pessoa contratava um seguro, ela podia presumir que a entidade supervisora, no caso, a Susep, já tinha previamente analisado aquele contrato e verificado se ele atende ao interesse dos consumidores. Era uma espécie de validação”, disse Vitor Boaventura.


O advogado acredita ainda que, inicialmente, será difícil a venda dos novos produtos. “Os corretores antes conheciam as cláusulas padrão, as linhas gerais eram as mesmas, variando um ou outro detalhe. Então o consumidor poderia escolher pela seguradora que oferecesse um preço menor sabendo que a cobertura seria similar. O que vai acontecer agora no mercado de seguros é um movimento semelhante ao que ocorre com os planos de saúde, que limitam a assistência para reduzir o preço. Quem tiver alguma limitação financeira pode acabar optando por um seguro com coberturas menores”, opinou Boaventura.

VENDAS

O presidente do Sindicato dos Corretores de Seguros de Pernambuco (Sincor-PE), Carlos Alberto Valle, afirmou que toda ação feita para atender a um número maior de pessoas, e de forma mais simples e objetiva, merece atenção. “Fala-se em seguros do tipo liga-desliga, em que o cliente aciona e suspende a cobertura quando desejar, mas com regras que não conhecemos ainda, e que devem ser muito bem avaliadas para que não haja risco de perda de direitos ou desequilíbrio financeiro para as partes envolvidas. Será que sua casa só está em risco quando você viaja, e que seu carro também só corre risco quando você está dentro dele? ou ele pode quebrar, ser roubado ou sofrer com um alagamento sem que você esteja por perto?”, questionou o presidente do Sincor.

Para Carlos Valle estamos diante de uma liberação de regras. “As seguradoras poderão criar [novas formatações de coberturas], mas não estão obrigadas a isso, portanto, contamos com a criatividade do setor”, afirmou Carlos Valle, ressaltando a necessidade de o consumidor sempre recorrer a um corretor de seguros para ter uma orientação correta no momento de contratar um seguro. “É preciso levar em conta as necessidades específicas da pessoa ou da empresa que está buscando o seguro”, explicou.

SUSEP

A reportagem do JC procurou a Susep, que preferiu responder aos questionamentos por e-mail. O órgão disse que o foco é o consumidor e suas necessidades e que a nova norma visa justamente tornar a comercialização dos seguros mais simples e melhorar a experiência do consumidor.

A Susep assegurou que “tudo o que é ofertado hoje pode continuar a ser ofertado” e que os consumidores continuam tendo os mesmos recursos para recorrer caso não concordem com as condições oferecidas pelas seguradoras. “Ele pode questionar a própria seguradora sobre tais condições ou buscar outras seguradoras que ofereçam coberturas semelhantes. Caso o seguro esteja sendo contratado por intermédio de corretor, este poderá também auxiliá-lo no contato com as seguradoras. Além disso, ele pode apresentar reclamação no portal Consumidor.gov.br, por meio do site da Susep ou recorrer aos órgãos de defesa do consumidor e ao poder judiciário", explicou o órgão. A Susep pontuou ainda que as novas regras foram amplamente discutidas através de audiências públicas.

 

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