Sem os empréstimos prometidos pelo governo, empresas reabrem fragilizadas

Fernando Castilho
Publicado em 31/05/2020 às 11:40
Lojas funcionarão aos domingos das 9h às 17h para faclilitar a vida dos clientes em busca dos presentes de fim de ano Foto: BOBBY FABISAK/JC IMAGEM


O fim do período de isolamento rígido, neologismo que o Governo de Pernambuco criou para evitar o termo em inglês lockdown, neste domingo foi a senha que alguns municípios esperavam para determinar a volta das atividades.

Ao menos dois prefeitos - Lula Cabral, do Cabo e Miguel Coelho, de Petrolina – se apressaram em anunciar a reabertura do comercio de salões de beleza, entre outros serviços.

Ainda que os índices de segurança não sejam os adotados por outros países, a expectativa é que ao longo desta semana outras cidades adotem comportamento semelhante. É um quadro perigoso.

Mas é preciso reconhecer que a pressão de milhares de empresários sobre os prefeitos aflitos com parada das atividades os faça dispostos a correr os riscos de um recrudescimento da infecção pelo novo coronavírus. Temos que pagar para ver.

O problema é que depois de 60 dias parados, sem dinheiro para manter o negócio e resistindo à ideia de fazer demissões e fechar a firma, os empresários estão dispostos a correr qualquer risco para conseguir algum faturamento.

Até porque, de cada 100 que bateram na porta do banco, apenas 14 conseguiram algum empréstimo para capital de giro. E ainda assim dando mais garantias às instituições.

Esqueça a publicidade dos mega bancos na TV falando para o empresário “aguentar firme”, que “estamos com você” e o que “podem fazer por você hoje?”. A verdade é que o dinheiro simplesmente não chegou. E milhares de empresas já ficaram pelo caminho.

A prova disso são os documentos oficiais que o Banco Central divulgou nesta semana. Num deles, o chamado Relatório de Estatísticas Monetárias e de Crédito, do mês de Abril onde a notícia principal foi a queda nas concessões de crédito nas linhas de recursos livres de -28,3%. No geral, as empresas tiveram redução de -33,7% nas concessões de crédito.

Não, o leitor não leu errado. No primeiro mês da crise do covid-19, as empresas brasileiras tiveram uma redução de crédito de um terço do que sempre captam.

No mês passado, juntando-se as linhas de crédito (livre e recurso direcionados), segundo o BC, as empresas tiveram uma queda nas concessões de crédito de -31,0% e as pessoas físicas -18,2%.

Dito de outra forma: Os bancos simplesmente reduziram o crédito para as empresas durante o primeiro mês a pandemia. É uma situação absurda se comparada aos demais países, especialmente os da União Europeia.

E é preciso reconhecer: não foi por falta de ajuda do Banco Central. Para se ter uma ideia do que aconteceu (e acontece) com as empresas - especialmente as pequenas, medias e micro empresas – quando se soma tudo que o BC colocou à disposição dos bancos, equivale a 16,6% do PIB, perto de R$ 1,2 trilhão.

Mas na verdade, os bancos não usaram a maior parte dos instrumentos colocados à sua disposição. Se for considerado os valores liberados aos bancos em abril (R$ 260,2 bilhões) representa apenas 21% do arsenal de R$ 1,2 trilhão anunciado pelo Banco Central.

Na verdade, o problema da recusa dos bancos em não emprestar não era de falta de liquidez. Os bancos estão abarrotados de dinheiro e o BC deu retaguarda. Mas no desempenho geral eles se tornaram cada vez mais seletivos com o temor do aumento no nível de calotes.

Num caminho inverso, eles decidiram não emprestar apesar de exibirem uma publicidade que dizia que estavam dispostos ajudar as empresas. Não estavam. E o entrave alegado foi uma desculpa muito conhecida pelas empresas para acessar o crédito: A falta de garantias a serem dadas aos bancos.

Assim, enquanto o governo anunciava uma enxurrada de bilhões, via BC, BNDES e Caixa Economia, os bancos simplesmente não fizeram nada.

É verdade que o governo nos bastidores não pressionou. O próprio ministro Paulo Guedes não pressionou a Caixa Econômica e o Banco do Brasil, o Banco do Nordeste e o Banco da Amazônia para ajudar de fato.

E sem uma pressão maior, os bancos seguiram o manual de crédito. O problema é, sem dar o exemplo, os bancos privados também seguiram o manual.

Na ponta da linha, o que se viu foi empresas usarem a possibilidade de primeiro não pagar os impostos federais, depois tentarem conseguir o empréstimo para parte dos salários dos funcionários e usaram o dinheiro que já tinham ganho com as vendas no cartão de credito antecipando os recebíveis. E só.

Então, depois de dois meses quando é aberta a possibilidade de as empresas retomarem suas atividades temos duas situações. As que não vão abrir porque não tem mais condições. E as que vão abrir fragilizadas.

Com o que restou do estoque, com o que restou na conta pessoal do empresário e contando com a boa vontade dos fornecedores.

Ah, existe uma possibilidade de crédito. Um fundo de aval operado pelos bancos públicos. Fundo de aval é uma especial e fiador geral. Isso já existe, mas nunca foi tentado para pequenas e mico empresas. Mas como diria a música, é o que temos para hoje e as próximas semanas.

Mas no fundo, todos os empresários sabem que a crise é algo tão destruidor que, mesmo os mais velhos e que conheceram todo os planos antes do Real, avaliam que não dá para comparar.

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