Na semana em que contou 330 mil mortes vítimas de covid-19, o Brasil se vê diante de uma série de atitudes de agentes do Executivo e do Judiciário que, longe de uma atitude proativa em respeito aos mais de 30 mil internados em UTIs, em centenas de hospitais, acabam amplificando um debate carregado de informações equivocadas e decisões que só confundem gestores e cidadãos aflitos.
A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Marques, para todo o País, apesar de os autores da ação terem pedido a suspensão de decretos de alguns municípios específicos que proíbem celebrações religiosas, repõe um embate no STF que parecia solucionado.
Desde fevereiro, inclusive com voto do próprio ministro Marques, que a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure) teve uma ação semelhante negada porque por unanimidade entendeu não cumpria com os requisitos para ingressar com a ação direta no STF.
Entretanto, o ministro decidiu neste sábado (3) que mesmo ante o contexto pandêmico que vivenciamos, que existia essencialidade da atividade religiosa, responsável, entre outras funções, por conferir acolhimento e conforto espiritual.
Mas, independentemente, da divergência que sua decisão pode provocar na sociedade nos próximos dias, a decisão do ministro, fartamente replicada nas redes sociais de apoio ao governo Bolsonaro, não foi um fato isolado.
Também, neste final de semana, o ministro das Comunicações, Fabio Faria, se encarregou de acrescentar mais uma informação polêmica ao informar através de um vídeo no Twitter, replicado pela Embratur, que o Governo Federal já tinha entregado 42.956.226 de doses com os estados aplicado apenas 20.894.140 doses induzindo ao questionamento de que os estados estariam retendo os imunizantes.
A informação não ajuda ao angustiado cidadão, eleitor e contribuinte entender o que acontece diante da tragédia sanitária que Brasil vive e sem perspectiva de redução nas próximas semanas embora seja facilmente explicável.
A “diferença” apontada por Faria se dá porque, por decisão técnica do próprio Ministério da Saúde, tão logo o Instituto Butantan começou a fazer as entregas dos imunizantes, a recomendação expressa foi de reservar a segunda dose que deve ser aplicada em três semanas.
Como até agora a Coronavac é a vacina que está sendo aplicada em quase 90% dos brasileiros é perfeitamente explicável que, ao menos 18 milhões de doses, estejam mesmo guardadas para serem aplicadas nos próximos dias.
O número atual é menor porque, como se sabe, no mesmo dia em que Faria colocou seu vídeo, o Conselho de Secretário de Saúde informou que 5.223.544 pessoas já tinham recebido a segunda dose. A conta, portanto, é bem simples. Quase 80% da diferença se deve ao fato de Estados e municípios guardarem as vacinas para a segunda dose.
Essa diferença é uma coisa boa para o Programa Nacional de Imunização. Quer dizer responsabilidade dos gestores, atitude que não tem o apreço do ministro.
O que seria, de fato, preocupante era se não existisse essa reserva. O perigo seria se os prefeitos e govenadores já tivessem aplicado as vacinas uma vez que o Ministério da Saúde vem toda semana reduzindo o cronograma de entregas semanais.
Essa “diferença” denunciada pelo ministro nos remete a uma questão central: Como estariam prefeitos e governadores se tivessem confiado na previsão de 38 milhões de vacinas entregues em março do então ministro Eduardo Pazuello quando apenas 27 milhões forma entregues?
O problema de uma informação como a do ministro é o potencial de dúvida que ela provoca no cidadão. É natural que ele acredite que está havendo retenção. Afinal, é uma informação do Governo Federal.
Ela também desvia a questão para uma não decisão do Governo Federal ano passado ao não adquiri outras vacinas que não a AstraZeneca. E desvia o foco de uma decisão de concentrar as apostas num único imunizante. E isso nos remete a uma perturbadora questão. O que estaria acontecendo ao Brasil se o Governo de São Paulo não tivesse comprado as vacinas através do Instituto Butantã?
A questão da desinformação, ou da propagação de fake News já foi estudada por dezenas de pesquisadores internacionais e não é um fenômeno brasileiro. E mesmo na pandemia do coronavírus não foi um tema visitado apenas pelo presidente Jair Bolsonaro.
O então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, produziu informações que levaram a 522 mil disseminações de informações incorretas sobre o coronavírus segundo a universidade particular em Ithaca, no estado de Nova York.
Num outro estudo, desta vez da Universidade Cornell, em apenas 16,4% dos casos de desinformação generalizada houve uma checagem jornalística dos fatos. A maioria dessas informações falsas foi disseminada sem o menor questionamento ou correção.