O ministro da Economia, Paulo Guedes, comparou servidores públicos que ingressaram nos cargos por concurso com militantes políticos.
Ele excluiu a Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, únicas instituições que autorizaram concursos públicos cumprindo ordens do presidente Jair Bolsonaro.
Guedes replica uma visão antiga e não atualizada do Liberalismo em relação ao setor público, sem levar em conta que o Estado precisa de servidores para tomar conta do Estado e que optem por uma carreira no serviço público independentemente do dirigente de plantão.
- Guedes: não fomos nós que cortamos o Censo, foi o Congresso
- Guedes diz que Fies beneficiou até 'filho de porteiro que zerou o vestibular'
- Presidente da CPI da Covid admite possibilidade de convocar Paulo Guedes e governadores
- 'Não podemos no meio da guerra julgar os crimes de guerra', diz Guedes sobre CPI
Esse pensamento, dos anos 80, nivela todo mundo por baixo e esquece que o pessoal que “pega no pesado” não é o mesmo que escolhe usar o setor público para fazer política, fugir das rotinas enfadonhas da repartição e que se escuda na impossibilidade de ser demitido (salvo após processo administrativo) para não trabalhar mesmo.
Não se deve ter uma visão sindicalista sobre tal questão. O setor público tem um segmento que acredita fielmente que não precisa melhorar. Por uma penca de fatores que vão da simples destinação de verbas, interrupção de programas interrompidos nos quis se envolveu, problemas de relacionando com os superiores e uma posição política contrária ao governo do momento.
Mas também cabe a pergunta: Se todos os servidores públicos se movessem por esses motivos. Como estaria hoje a prestação do serviço na ponta?
Ninguém, minimamente honesto, discorda do fato de que serviço prestado na ponta, não tem o nível que o contribuinte que paga a conta merece. Mas a visão de Paulo Guedes passa longe dessa análise porque nivela por baixo. E isso é preconceito.
Felizmente esse grupo ao qual o ministro direciona sua crítica é pequeno embora histriônico. Confundi-los com o grosso comprometido com a prestação dos serviços do setor público é inadequado.
O setor público, por exemplo, escreveu a peça orçamentária de 2021 que Paulo Guedes, com sua atabalhoada negociação com o Congresso, o transformou numa peça que envergonha a Secretaria de Orçamento Público.
A visão de Guedes é obtusa porque parte da ideia de que é a impossibilidade de ser demitido que transforma o setor público num prestador de serviço ruim.
Por esse caminho, os serviços da Receita Federal, Serpro, Ibama ICMBio, IBGE, SIF e Cacex, só para citar alguns seriam um gueto de militantes comunistas empenhados 24 horas por dia em derrubar o Governo Jair Bolsonaro.
Talvez o ministro, que noutras oportunidades elogiou a dedicação da equipe que o ajudou a administrar a economia brasileira, fizesse melhor em defender novos sistemas de controle, avaliação de carreiras e implantação de programas de desempenho mirando na produtividade.
E discutir essa questão é um tema estratégico. E que pode estimular a ampliação das possibilidades das equipes de os órgãos de ponta na gestão pública ajudarem os de baixo desempenho.
O governo conseguiu melhorar sua performance com ajuda de processo de digitalização que permitem ao cidadão que precisa do INSS, por exemplo, fazer 95% de suas demandas pela internet. O problema é que não gerou tecnologia para atender aos 5% restantes e que refletem a parte ruim. Esse é um bom debate.
Paulo Guedes também poderia ajudar na organização de modelos de administração no setor público que mirassem os projetos de longo prazo e, naturalmente, perpassassem o período de quatro anos.
Mas a pergunta é: o que como líder do Ministério da Economia, ele fez e se destinou recursos para melhorar o serviço público na ponta?
Nenhum país vive sem o setor público. E é perfeitamente correto que o Estado busque a saída de setores em que não performa bem.
Mas é preciso ter presente que os dirigentes do governo do momento sempre cuidam de interferir para piorar na medida em que misturam política eleitoral com política de governo.
Um dos maiores desafios do Estado brasileiro, no futuro, será reorganizar o setor público a partir do desmonte de dezenas de órgãos para onde foram levadas pessoas do setor privado de baixíssima qualidade, apenas porque eram afinadas com as ideias do governo.
Não será uma tarefa que embuta uma questão ideológica ou de militantes políticos. Será de reconstrução do aparelho estatal que estava funcionando bem, tinha reconhecimento internacional e reduziu sua qualidade por má interferência política.
A visão liberal da década de 1980 de Paulo Guedes lembra a atabalhoada entrada de Fernando Collor no governo quando se desmontou um monte de seções que funcionavam no Palácio do Planalto desligando computadores e mandando arquivos inteiros para o deposito com o propósito de abrir mais espaço.
Duas semanas depois se viu que, junto com os computadores foram também os arquivos de contatos políticos, demandas de deputados e senadores, conversas e demandas de governadores que faziam o governo atuar no Congresso. Eles haviam ido parar no gabinete do líder do Governo, Ricardo Fiuza, porque um servidor publico decidiu não apagar os arquivos que, a seguir, foram devolvidos ao Planalto.
Certamente depois do deputado ter feito uma cópia, ampliando seu poder de negociação.
No fundo, a questão se resume ao descontrole que ao longo dos anos, o Governo permitiu ao não criar estruturas de controle e de melhoria desempenho do setor público.
Quando estimulou que parte do setor fosse apropriado por gestores que misturam política com corrupção. Mas fazer isso custa caro e exige visão de longo prazo que poucos gestores eleitos têm do que seja visão de Estado. Exige compromisso.
Até porque quando o servidor público se envolve nisso, como ordenador de despesa, é seu CPF quem fica comprometido para o resto da carreira.