Uma conta numerada num banco da Suíça. Ou num paraíso fiscal? Das operações do Comendador José Alfredo, na novela Império, à revelação de que não só do ministro da Fazenda Paulo Guedes como do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, o movimento rela um desejo que povoa o imaginário do brasileiro:
E isso acontece não apenas para ter dinheiro protegido das ameaças do Governo no Exterior, como não querer pagar imposto, ou simplesmente poder ter a oportunidade de algum dia desembarcar em Genebra, por exemplo, e ver o seu rico dinheirinho num cofre. Ou conferir o saldo de sua conta internacional.
A perda do dinheiro do Comendador José Alfredo pode ser uma ficção.
Mas o noticiário de hoje relacionado a Paulo Guedes e Campos Neto, demonstra que esse desejo existe e ficou muito evidente nas investigações da Operação Lava Jato, ente 2015 e 2019, quando ela descobriu que uma grande parte dos envolvidos “fazia questão” de receber suas propinas num paraíso fiscal ou mesmo na Suíça.
Até começar a ser desmontada, na gestão de Augusto Aras, a força-tarefa da Operação Lava Jato diz ter recuperado R$ 67 milhões que estavam em contas no exterior. Mas esse valor se referia apenas ao dinheiro que tinha sido desviado de contrato firmado entre a Odebrecht e a Petrobras.
Mas ao longo de mais de cinco anos da operação Lava Jato, em Curitiba, chegou-se a nada menos que R$ 4.069 bilhões o total de valores recuperados por meio de acordos de colaboração premiada, acordos de leniência, termo de ajustamento de conduta (TAC) e renúncias voluntárias de réus ou condenados, já efetivamente restituídos.
Um dos casos mais emblemáticos foi do ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, um dos primeiros delatores da Operação Lava Jato, ao Supremo Tribunal Federal (STF) que pagou devolveu R$ 75 milhões que surrupiara em contratos com à Petrobras. E a maior parte dessa montanha de dinheiro estava no Exterior.
As contas fora do país estão em nome de Expedito Machado e se constituíam de "trustes" (quando o dinheiro é administrado por terceiros) e fundos de investimento no Banco UBS Deutschland AG e no Santander Bahamas. Juntas, as contas possuem US$ 13,9 milhões.
O curioso é que as pessoas sempre acreditam que podem chegar num banco entregar uma montanha de dinheiro sem que ninguém tenha qualquer informação ou documento sobre ela.
Isso ficou demonstrado que não por ocasião da Lava Jato quando Ministério Publico Federal fechou acordos de colaboração com 61 países e recebeu 606 pedidos passivos de cooperação jurídica em matéria penal, oriundos de outros 40 que fizeram 447 pedidos.
Mas porque os brasileiros sonham tanto ter dinheiro suficiente para ter uma conta no Exterior?
Segundo a 3ª edição do Raio X do Investidor da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais), estão: segurança (46%), retorno (24%) e liquidez (23%). E segundo a entidade a poupança representa 42% de todas as aplicações dos brasileiros, a maior fatia entre os produtos do varejo.
Em dezembro do ano passado, milhares de investidores brasileiros fizeram, pela primeira vez, uma aplicação no exterior. A intenção, contudo, não era diversificação, mas sim participar da oferta inicial de ações da XP Investimentos, que decidiu abrir seu capital fora do Brasil, na Bolsa americana Nasdaq.
O número de cotistas de fundos com classificação de "investimento no exterior", conforme dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), ainda é tímido: cerca de 88 mil em março, 10 mil a mais do que no início do ano passado.
Esse interesse em deixar dinheiro La fora está provocando situações preocupantes.
Este ano as exportações somam US$ 260,6 bilhões no acumulado de 12 meses até agosto, maior valor na série histórica iniciada em 1995. Entretanto o fluxo cambial em operações de exportação soma US$ 214,4 bilhões no mesmo período.
Isso quer dizer que uma diferença que totaliza US$ 46,2 bilhões ficou fora do Brasil, a maior nível desde 1995. O ano de 1995 para quem não lembra foi quando o Real começou a valer e as pessoas não tinham nenhuma confiança e temiam ter o dinheiro confiscado como aconteceu no Governo Coller.
E esse recorde que vêm sendo renovado desde abril segundo o pesquisador Armando Castelar, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV.
Para Castelar, as incertezas em relação à política econômica, como o nível de desequilíbrio das contas públicas, e a crise política estão pesando mais. "Se a perspectiva é que o câmbio vai andar mais ainda (ou seja, o dólar vai subir), é a crise política atrapalhando", disse Castellar ao jornal o Estado de S. Paulo.