Foi assim. Em setembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff decidiu prorrogar concessões de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica e autorizou indenização às empresas que ainda tinham investimentos não amortizados. O discurso foi de que as contas deveriam baixar até 25% porque os investimentos já tinham sido amortizados.
Numa festa no dia 11 de janeiro de 2013, ela sancionou com seis vetos a nova norma oriunda da Medida Provisória 579, aprovada pelo Congresso em 18 de dezembro com o rolo compressor do PT e partidos de esquerda. Os 25% anunciados viraram 18% de redução.
Para viabilizar a redução das tarifas, o governo antecipou a renovação das concessões de usinas e linhas de transmissão, cujos contratos vencem a partir de 2015. Para assegurar a eficiência da prestação do serviço e a tarifa mais baixa, a vigência do contrato só poderá ser renovada uma única vez, pelo prazo de 30 anos.
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A consequência dessa decisão de base econômica rudimentar foi que, em 2016, já no Governo Temer, uma portaria do Ministério das Minas e Energia permitiu a incorporação desses valores nas tarifas de energia dos consumidores. A conta começaria a ser paga a partir da revisão tarifária de 2017 com previsão de ser cobrada até 2028.
A Aneel autorizou aumentos de 7% a 8%, a depender da concessionária. Os custos, porém, subiram acima de 20%. Mas a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) questiona os valores na Justiça. A confusão ainda não foi resolvida.
BOLSONARO IGUAL A DILMA
Essa memória faz sentido agora que o presidente Jair Bolsonaro está com a proposta de fazer a Aneel deixar de cobrar o acréscimo das bandeiras tarifárias devido ao impacto que elas estão provocando nas contas.
A Agência Nacional de Energia Elétrica é bem resiliente aos apelos dos presidentes que indica seus diretores e a possibilidade de Bolsonaro concretizar seu desejo de reduzir a taxa cobrada sobre a conta de luze real. O que não está dito é que o custo recai, num primeiro momento, sobre as distribuidoras e depois nos consumidores.
Segundo dados Aneel, o déficit entre a arrecadação e as despesas alcançou R$ 8,06 bilhões em agosto e pode dobrar até o fim do ano.
Esse é um problema político grave porque está impactando na aprovação do presidente. Mas a menos que tenhamos em novembro um pequeno dilúvio as coisas não vão se resolver.
A ideia do presidente não leva em consideração o fato de que o aumento do déficit foi provocado, sobretudo, pela alta global dos combustíveis usados pelas térmicas - gás natural ou diesel.
O aumento afetou o custo variável das usinas, que estão operando a plena carga para preservar os reservatórios. Na quinta-feira, 14, por exemplo, as térmicas (exceto a nuclear) produziram quase 30% de toda energia usada no mercado nacional. O que o presidente para não entender é que o preço de algumas delas, no entanto, está na casa de R$ 2,2 mil o MWh.
BRASIL USANDO MAIS TÉRMICAS
A Aneel está indo atrás de qualquer coisa que gere energia. Nesta segunda feira, ela anunciou que concluiu o mês de setembro com 4.882,88 megawatts (MW) em usinas de geração de energia elétrica liberadas para operação comercial, antecipando-se em mais de três meses à expectativa de 4.790,4 MW definida no início do ano.
O problema é o presidente decidir suspender a cobrança do acréscimo das bandeiras vermelhas. No setor elétrico tudo é muito bem amarrado juridicamente em função dos operadores e dos investidores e com sempre a ultima ponta dessa cadeia produtiva é o cliente final.
No caso da MP de Dilma entre 2013 e 2018 o consumidor houve um aumento real de 20,4%. Segundo a própria Aneel a MP 579 provocou um aumento de despesas no setor de R$ 198,4 bilhões.
Tudo isso para a presidente anunciar uma redução de 20% nas contas de energia que rapidamente foi incorporado às tarifas. O risco é Bolsonaro repetir Dilma e depois de seu mandato o consumidor pagar a conta por ano seguindo.