Nem o presidente Jair Bolsonaro nem a torcida do Flamengo esperam que Adriano Pires e Ricardo Landim mudem a política de preços da Petrobras.
Mas parece claro que o presidente, ao incluí-los na equipe de Governo, quis dar uma satisfação aos seus seguidores e a parte do estamento militar, demitindo o general pela imprensa para mostrar autoridade.
Parte dos militares viram na “independência” de Silva e Luna na gestão da Petrobras o descumprimento de uma missão dada pelo Comandante em Chefe das Forças Armadas, e isso é algo que não se discute na caserna.
Adriano Pires não tem ligação com Paulo Guedes, embora os dois concordem que a Petrobras deve, em algum momento, ser privatizada. Os dois acham que a estatal é grande demais para ser controlada pelo governo como acionista.
A Petrobras já paga tudo que o governo tem direito como acionista e como Estado dono do petróleo em royalties e participação especial. Mas como precisa prestar contas ao mercado, tanto faz ser estatal ou privado.
Isso, naturalmente, é um sacrilégio aos nacionalistas da esquerda e até da direita, mas ninguém deve esperar um leilão na B3 ou na NYSE das ações do Governo.
Mas Adriano Pires chega com uma ideia bem interessante sobre dois combustíveis estratégicos: gás de cozinha e óleo diesel e, certamente, isso agradou muito a Bolsonaro.
Não está sozinho. Muita gente acha que para quem está no Cadastro Único do Governo (CadÚnico) - que inclui o Bolsa Família e mais 30 milhões de pessoas abaixo ou próximo à linha da pobreza no Brasil - um crédito de R$ 100 para pagar o botijão de gás resolveria um problema sério.
A adoção da sugestão de Adriano Pires quando apenas prestava consultoria ao Ministério das Minas e Energia poderá ajudar muito a Bolsonaro em se livrar da acusação decorrente da inação na Petrobras, ainda que custe raspar a taxa de seus dividendos, royalties e participações especiais.
Basta lembrar que apenas no Bolsa Família, estão inscritas 17 milhões de pessoas. Portanto, o pagamento de um botijão de gás para elas seria um benefício real.
No caso do óleo diesel, Pires acha que o Governo pode, também, dar um subsídio, mas a segmentos específicos, de modo a reduzir o impacto na inflação, já que o transporte é custo usando o que a estatal lhe paga.
Numa situação de emergência (aprovada pelo Conselho de Administração, que o Governo controla), a estatal poderia, inclusive, antecipar o pagamento dos seus dividendos e impostos ao acionista controlador.
É importante entender que a diferença entre o general e Pires é que o economista é especialista no assunto. Não tem, como o general, conhecimento periférico.
Em tese, ele não se impressionaria com a forte cultura da empresa.
Isso também acontece com o novo presidente do Conselho de Administração, Rodolfo Landim. Ou seja, agora o governo teria representantes formados por gente que sabe o que é o setor e, portanto, teria argumentos no debate interno.
O problema é fazer isso com o barril do petróleo a US$ 100.
Não tem como interferir muito e nem vender tendo prejuízo para o acionista.
E o que deve acontecer? Nada. Vai continuar como está, porque não tem como baixar agora. E Bolsonaro vai continuar a dizer que não tem nada a ver com a Petrobras. Ao menos na campanha.
Mas a questão é: o país aguenta? Vai ter que aguentar.
O que a Petrobras pode fazer é adotar outros índices internacionais e até mesmo modelos de longo prazo para ter mais previsibilidade nas suas contas. Mas isso tem limite.
Quando em 2016 o Governo Michel Temer definiu que a Petrobras adotaria o PPI (Preço de Paridade Internacional), não houve resistências, porque o petróleo estava custando US$ 40 dólares.
Hoje, essa política virou um problema e nem Adriano Pires nem e Ricardo Landim vão para a empresa para mudar isso. Ao menos agora.
Ingrato, Bolsonaro fala mal da Petrobras quando empresa lhe entregou R$ 150 bilhões somente no ano passado
No ano passado, o Tesouro, além dos tributos federais, embolsou R$ 27,1 bilhões apenas com dividendos
No ano passado, a Petrobras recolheu ao Governo Federal R$ 156,2 bilhões, entre tributos próprios e participações governamentais. No período da gestão Jair Bolsonaro, o valor chega a R$ 434,4 bilhões (entre 2019 e 2021).
Do ponto de vista fiscal, a Petrobras é o estado da arte em termos de contribuinte. Paga seus impostos em dia, recolhe ao governo suas participações especiais e ainda cuida de repassar aos estados os impostos que recebe na condição de contribuinte substituta, que no ano passado chegaram a R$ 46,7 bilhões.
Ainda assim, o presidente e os presidentes da Câmara e do Senado não se cansam de criticar a empresa pelos seus altos lucros. Pura ingratidão. Quando o petróleo estava na faixa de US$ 40 o barril, os mesmos personagens eram só elogios à empresa, especialmente pela sua performance com o pré-sal.
O presidente (assim como Arthur Lira e Rodrigo Pacheco) também se comporta como fariseu. O Estado é quem mais recebe dividendos pela condição de acionista. No ano passado, o Tesouro, além dos tributos federais, embolsou R$ 27,1 bilhões apenas com dividendos.
De certa forma, pode-se dizer que apenas com os seus dividendos da Petrobras, o Governo pagou todas as emendas de relator que Lira e Pacheco escondem.
Os governadores também são ingratos com a empresa, que lhes recolheu, a custo zero, os R$ 46,7 bilhões, como no ano passado, quando a cobrança de ICMS fez explodir o seu caixa, apenas com a substituição tributária, onde a Petrobras cobra o ICMS na origem.
Tem mais: na condição de controlador da empresa Pré-Sal Petróleo S.A (PPSA), empresa vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), o Governo arrecadou R$ 1,22 bilhão em 2021, cerca de 70% a mais em comparação a 2020, quando a arrecadação total foi de R$ 704 milhões.
No próximo mês, quando a ANP realizar os leilões de Sépia e Atapu, a União deve começará receber quase US$ 7 bilhões em Volumes Excedentes da Cessão Onerosa de petróleo, o equivalente à produção de 1,1 milhão de barris de petróleo por dia numa escala crescente até 2031.
A ingratidão do presidente com a Petrobras - onde já trocou dois presidentes - tem a ver com o impacto que os preços dos combustíveis têm na economia e, consequentemente, na sua popularidade, tanto em 2021 como agora.
Quando o presidente assumiu, o ministro Paulo Guedes escolheu o economista Roberto Castelo Branco, que passou despercebido do público. Até que, entre janeiro de 2020 e janeiro de 2021, o barril passou de US$ 41,47 para US$ 69,89. Bolsonaro demitiu Castelo Branco e chamou o general Silva e Luna dizendo que ele iria "dar uma geral" na empresa.
Silva e Luna foi e entregou um resultado espetacular da empresa, com lucro de R$ 104,1 bilhões.
Estaria no céu se para isso não tivesse cuidado de uma empresa que monta seu negócio em dólar, cujo barril saiu dos US$ 69,89 em janeiro de 2020 para US$ 97,57 no dia 1º de janeiro último. Bolsonaro virou alvo de críticas nas redes sociais e culpou o general por não ter cumprido a missão que ele lhe deu.
Nesta segunda-feira, ele anunciou Adriano Pires para o lugar do general Silva e Luna.
O problema da Petrobras é que ela é muito boa para presidente surfar na sua onda de eficiência e rentabilidade quando o preço do barril do petróleo está em baixa, mas é uma desgraça quando os preços sobem e a gasolina, o óleo diesel e o gás de cozinha explodem, na ponta.
Bolsonaro decidiu "terceirizar" a culpa dos aumentos, quando se tivesse um pouco mais de atenção, poderia usar parte dos lucros que a empresa lhe entrega. Poderia pensar em políticas de ajuda social com foco como, por exemplo, em gás de cozinha para pessoas de baixa renda e para prefeituras e os governos do Estado para passagens de ônibus e transporte de cargas.
Em público, ele comete uma enorme ingratidão com a empresa, que tem compromissos com ele como acionista controlador e com os demais minoritários.
Mas ele prefere dizer que a empresa é uma desgraça no seu governo enquanto embolsa os seus lucros, dividendos e impostos.
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