Trânsito, transportes e mobilidade urbana, com Roberta Soares

Mobilidade

Por Roberta Soares e equipe
COLUNA MOBILIDADE

Ônibus seguem sem previsão em tempo real no Grande Recife. Sistema prometido já virou lenda urbana

De um contrato de R$ 40 milhões para implantação do sistema em cinco anos, pelo menos R$ 22 milhões foram gastos até agora, apesar de nunca ter entrado em operação

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Roberta Soares

Publicado em 19/06/2022 às 8:00 | Atualizado em 13/07/2022 às 17:04
Estado diz que, além de todas as dificuldades, a empresa vencedora da licitação abandonou o contrato. MPPE também acompanha o processo, sem muitas interferências - JC IMAGEM

Ele já virou uma verdadeira lenda urbana. De tanto esperar, muitos dos passageiros de ônibus da Região Metropolitana do Recife sequer lembram dele. A maioria nunca nem ouviu falar. O Sistema Inteligente de Monitoramento da Operação (Simop) - que deveria ser o sistema oficial de controle e informação em tempo real dos ônibus em operação no Grande Recife, virou chacota no setor porque nunca vingou.

Deveria estar conectando passageiros com ônibus, nos Terminais Integrados, nas estações de BRT e até mesmo nas paradas, a partir do smartphone de qualquer passageiro. E isso tudo desde 2014, ainda na época da Copa do Mundo do Brasil. Mas nada deu certo. Nada.

Aliás, além de não vingar, o Simop é um dos maiores símbolos do mau uso do dinheiro público. De um contrato de R$ 40 milhões para implantação do sistema em cinco anos, pelo menos R$ 22 milhões foram gastos até agora, apesar de nunca ter entrado em operação.

E dos R$ 22 milhões, R$ 8 milhões foram investidos num CMO (Centro de Monitoramento Operacional) que funciona sem autonomia na sede do gestor do sistema, o Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano (CTM), no bairro de São José, no Centro do Recife. Sem autonomia porque todo o controle das viagens ainda permanece com as empresas de ônibus. O Estado precisa solicitar as informações aos operadores.

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E, apesar do alto valor, o passageiro da RMR não foi beneficiado em nada. Absolutamente nada. “É absurdo demais ver um sistema de transporte público não ter informação em tempo real em pleno século 21. Ninguém acredita”, critica o vendedor autônomo Luiz Cláudio Dantas, que todos os dias anda de ônibus.

Deveria estar conectando passageiros com ônibus, nos Terminais Integrados, nas estações de BRT e até mesmo nas paradas, a partir do smartphone de qualquer passageiro. E isso tudo desde 2014, ainda na época da Copa do Mundo do Brasil. Mas nada deu certo - Lentamente, sistema da Etra começa a funcionar. Um único monitor está em funcionamento na Estação Guararapes do BRT. Fotos: Fernando da Hora/JC Imagem

“A maioria dos passageiros vai às cegas para as paradas, terminais ou estações de BRT. E depois o Estado e os empresários não sabem porque o número de usuários só diminui. Por que será?”, ironiza. O app Grande Recife chegou a iniciar um teste em 2018 apenas com algumas linhas da empresa Globo e os consórcios MobiBrasil e Conorte, operadores dos sistemas de BRT, mas não prosseguiu.

Ninguém do governo de Pernambuco quis falar sobre os atrasos e, principalmente, o futuro do Simop. Por email, o CTM apresentou números que diferem do que a reportagem apresenta, baseada em matérias publicadas ao longo dos anos e desde o início do processo de tentativa de implantação do sistema.

Segundo o CTM, de 2015 até 2020 foram gastos R$ 18.476.963,99. Os anos anteriores e o ano de 2021 não são citados.

Dos R$ 22 milhões gastos até agora, R$ 8 milhões foram apenas no Centro de Monitoramento Operacional (CMO), que fica no Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano, mas que não tem autonomia sobre os dados da operação diária do sistema - DIVULGAÇÃO
Dos R$ 22 milhões gastos até agora, R$ 8 milhões foram apenas no Centro de Monitoramento Operacional (CMO), que fica no Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano, mas que não tem autonomia sobre os dados da operação diária do sistema - DIVULGAÇÃO
Dos R$ 22 milhões gastos até agora, R$ 8 milhões foram apenas no Centro de Monitoramento Operacional (CMO), que fica no Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano, mas que não tem autonomia sobre os dados da operação diária do sistema - DIVULGAÇÃO

Raio X do Simop

Os valores gastos até agora, segundo o governo de Pernambuco

2015 - R$ 2.537.295,92
2016 - R$ 4.515.193,58
2017 - R$ 2.656.708,29
2018 - R$ 1.600.000,00
2019 - R$ 4.999.075,65
2020 - R$ 2.168.690,55

Total: R$ 18.476.963,99

SIMOP CHEGOU A SER TESTADO DE FORMA RESTRITA: 

Na verdade, todos os lados que têm ligação com o Simop cruzaram os braços. O Estado, por enfrentar dificuldades técnicas e de gestão para avançar com o sistema; e o setor operacional (as empresas de ônibus), que nunca teve interesse em ver o Simop avançar para não perder a autonomia no controle de dados da operação.

Em função da demora do Simop, inclusive, foi disponibilizado para a população o CittaMobi, aplicativo privado que desde 2016 disponibiliza a chegada dos coletivos em tempo real na Região Metropolitana do Recife.

PROMESSAS

O governo de Pernambuco, como faz desde antes de 2014, promete. Explica que teve dificuldades com a empresa vencedora da licitação - a espanhola Etra, que opera a tecnologia do BRT Transmilênio, de Bogotá - e que agora irá retomar o processo.

Via CTM, diz que “decidiu elaborar um termo de referência para contratação de uma empresa especializada para dar sustentação ao sistema já existente do Simop e outros sistemas integrados”. E que, com essa sustentação, será possível implantar o aplicativo com informação em tempo real para o usuário. De novo, vale ressaltar.

Aliás, além de não vingar, o Simop é um dos maiores símbolos do mau uso do dinheiro público. De um contrato de R$ 40 milhões para implantação do sistema em cinco anos, pelo menos R$ 22 milhões foram gastos até agora, apesar de nunca ter entrado em operação - JC IMAGEM

Segundo o CTM, muita coisa avançou na implantação do sistema. “A arquitetura do Simop no que diz respeito ao software encontra-se devidamente implantada, faltando detalhes de configurações (tradução e customização, por exemplo) que não invalidam a ferramenta, mas que não a deixa apta para execução dentro dos parâmetros contratados”, segue explicando.

E responsabiliza a Etra: “Essa demanda recai sob a responsabilidade de cumprimento por parte da contratada Etra, que apesar de ser diversas vezes notificada, ter apresentado prazos perante o Grande Recife Consórcio e o MPPE, não realizou tal cumprimento, tendo inclusive abandonado o contrato, o que levou este CTM a abrir um processo administrativo contra a mesma por descumprimento de contrato”, finaliza.

Histórico sobre o Simop - ARTES/JC

CARONA NA GESTÃO PRIVADA

Ao menos nos Terminais Integrados (TIs) e nas estações dos BRTs Leste-Oeste e Norte-Sul, uma solução poderá estar mais próxima. E virá da concessão pública dos TIs. o Centro de Controle Operacional (Core) da Nova Mobi Pernambuco prevê, nos próximos meses, a informação em tempo real de chegada e saídas dos ônibus nos TIs e dos BRTs nas estações.

A Nova Mobi Pernambuco é uma empresa do Grupo Socicam que venceu a licitação do governo de Pernambuco para administrar por 35 anos os 26 terminais integrados de ônibus e as 44 estações de BRT em operação no Grande Recife. O contrato começou no início de 2022.

O governo de Pernambuco, como faz desde antes de 2014, promete. Explica que teve dificuldades com a empresa vencedora da licitação - a espanhola Etra, que opera a tecnologia do BRT Transmilênio, de Bogotá - e que agora irá retomar o processo - JC IMAGEM

MPPE

A implantação do Simop do transporte público da RMR é tão polêmica que pelo menos desde 2020 existe um inquérito civil instaurado pelo MPPE para acompanhar o processo. Mas, como até mesmo a investigação demorou, este ano o inquérito que tramitava na Promotoria de Transporte foi arquivado e um novo reaberto.

O procedimento é recomendado pelo MPPE. O novo inquérito civil (02011.000.097/2022) foi instaurado no dia 8 de março de 2022 para continuar apurando a não conclusão do Simop, “apesar do tempo decorrido desde a sua licitação, dos vultosos recursos públicos já investidos e das consequências negativas para o STTP/RMR e todos os seus usuários”, diz o MPPE.

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