O questionamento que intitula esse texto precisa ser repetido: até quando vamos, Estado, prefeituras, empresas, famílias e sociedade, fingir que nada está acontecendo enquanto jovens morrem ao cair dos ônibus na Região Metropolitana do Recife?
A desmoralização do transporte público do Grande Recife chegou ao limite. Pouco importa se ela está sendo alimentada há muitos anos, por gestões políticas diferentes, se foi potencializada com a pandemia de covid-19 ou se é reflexo da decadência social, moral e econômica de nossa sociedade.
Pouco importa.
Ela precisa ser combatida com ações rápidas, fortes, precisas e eficientes. E precisa de um combate para ontem. Não interessa se é herança do PSB ou de qualquer outro partido - já que o problema diz respeito, também, às prefeituras da RMR. Precisa de solução. Rápida, forte, precisa e eficiente.
Mais uma morte provocada pela prática do ‘surf’ e ‘morcegamento’ nos ônibus aconteceu no domingo (7/5) em plena Avenida Agamenon Magalhães, no Derby, uma da áreas mais movimentadas e tradicionais do Recife.
Um adolescente de 17 anos estaria pendurado na porta do coletivo e caiu, sendo atropelado em seguida. Morreu na hora e de forma extremamente violenta. Segundo informações apuradas pela TV Jornal no local, ele estava com um grupo de mais de dez jovens ‘brincando’ de ‘surfar’ e viajar ‘morcegando’ nos coletivos.
Para um caso acontecer no Derby, a 500 metros do Quartel do Derby, onde fica o Comando da Polícia Militar de Pernambuco, imagine o que está se passando nas periferias do Grande Recife.
Os registros da prática do ‘surf e do ‘morcegamento’ nos coletivos são mais frequentes nos subúrbios do que nos bairros de classe média ou na área central da capital.
Mas a impunidade tem crescido e os adolescentes e jovens têm praticado até mesmo em corredores viários importantes da cidade, como o Viaduto Capitão Temudo, na área central, e a Avenida Conselheiro Aguiar, em Boa Viagem, na Zona Sul.
VÍDEO SURF NOS ÔNIBUS: jovem morre no Grande Recife
Domingos e feriados são os dias certos para se ver diversos flagrantes, como o que matou o adolescente no Derby.
O vandalismo no transporte público - sim, o ‘surf’ nos ônibus pode ser enquadrado como crime de vandalismo, com pena de prisão de seis meses a três anos e multa correspondente à violência - fugiu ao controle do poder público.
E a sensação de impunidade é tão grande que os vândalos se sentem vítimas. Na morte de domingo, amigos e familiares do adolescente morto intimidaram não só a imprensa, mas até mesmo a PM, que estava em pequeno número. Eram 6 PMs contra mais de 20 pessoas.
O grupo, segundo informou a polícia à TV Jornal, já tinha sido expulso de outro coletivo por estar com as mesmas práticas.
Pelo menos dois óbitos e um caso de mutilação foram registrados em 2022. Em 2023 já foram dois casos com mortes. Sem falar nos flagrantes quase diários, mas que não chegam à imprensa porque não resultam em mortes ou ferimentos.
Por tudo isso, voltamos a questionar: até quando vamos ver isso acontecer?
Alguém pensa nos motoristas de ônibus, sozinhos na condução do veículo e tendo que assumir o papel que é do Estado? Alguém já pensou no risco que esses profissionais correm ao esboçar reação e serem facilmente marcados, já que fazem aquelas rotas diariamente?
Não cabe mais, no mundo atual, enxergar o transporte público como um serviço privado. Não, não é. Na verdade, nunca foi. Transporte público de qualidade é direito social previsto na Constituição Federal do Brasil desde 2016 e, sem ele, até mesmo quem só anda de carro é prejudicado.
O funcionário da sua casa ou do seu prédio chega para trabalhar, em sua maioria, de transporte público, pode ter certeza. O mesmo vale para o cozinheiro e os garçons do restaurante onde você almoça. Sem falar nas pessoas que querem ter o direito de usar o ônibus, o metrô e o trem para se deslocar. Que não querem mais o deslocamento exclusivo de automóvel.
Por tudo isso, é preciso uma reação conjunta urgente. Força policial, fiscalização presente e responsabilização social das famílias desses jovens-vândalos.
Atenção:
Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano (CTM)
Secretaria de Mobilidade e Infraestrutura de Pernambuco (Seinfra)
Secretaria de Defesa Social de Pernambuco (SDS)
Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE)
Prefeitura do Recife e dos outros 13 municípios da Região Metropolitana do Recife
Conselhos Tutelares