O cronista Millôr Fernandes (1923— 2012) costumava dizer, entre uma dose e outra de um bom whisky, que “acabar com a corrupção é o objetivo supremo de quem ainda não chegou ao poder”. Mas pode até ser que os poderosos do Brasil não sejam bom exemplo quando o assunto é corrupção. É bom que se diga que essa praga é uma erva daninha que contamina boa parte da sociedade.
É de causar espanto relatório da Controladoria Geral da União (CGU) que aponta mais de 118 mil mortos que receberam, tranquilamente, o pagamento do auxílio emergencial, criado como importante medida de alento a famílias de baixa renda, em meio à pandemia da covid-19.
A prudência do relatório da CGU chama de “pagamentos possivelmente indevidos” e “pelo menos 118 mil dos que registraram saques com suspeitas de irregularidades já estavam mortos quando o benefício foi liberado em suas contas bancárias”.
A fraude é ainda maior. Atinge mais de 3 milhões de brasileiros envolvidos com recebimento indevido do benefício, mas, por hoje, eu vou me ater aos mortos. Cento e dezoito mil deles “ressuscitaram” para abocanhar mais de R$ 50 milhões de recursos que poderiam ter ajudado a alavancar as finanças de famílias que realmente são de baixa renda.
No caso investigado, quase sempre, são familiares e amigos de entes queridos que já não estão mais na convivência da inviolabilidade do lar que fizeram o registro do morto no programa. Tiveram os benefícios liberados e agora, a polícia começa a sair à cata dos fraudadores.
Como no Brasil, quase sempre, o crime de corrupção compensa, é sabido que alguns dos familiares de mortos que receberam o beneficio já se preparam para dar como desculpa que o dinheiro era para reformar o túmulo do falecido.
Agora, é hora de esperar que a Justiça seja rigorosa com com quem fraudou o programa social e que, assim como em outras ações de enfrentamento a desvios de dinheiro público, o Poder Judiciário não colabore para perpetuar o "jeitinho brasileiro" até na hora da morte.
Pense nisso!