Com informações da Agência Estado
O Brasil registrou 47.503 homicídios ao longo do último ano, o equivalente a 130 mortes por dia, segundo dados divulgados nesta terça-feira (28), pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O número representa queda na comparação com 2020 (quando foram somadas 50.448 mortes) e é o menor registrado desde 2011, quando se inicia a série histórica.
Entre os motivos, especialistas apontam uma estabilização de conflitos entre facções criminosas, que na última década avançaram pelo Norte e Nordeste do País, e a implementação de programas estaduais focalizados em públicos mais jovens.
"As mortes caíram, o que é boa notícia", disse ao Estadão o diretor-presidente do Fórum, o sociólogo Renato Sérgio de Lima. "Mas comparando internacionalmente o número ainda é muito alto", ponderou.
Segundo ele, os dados divulgados neste ano foram contrapostos aos índices de 102 países, reunidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). A comparação, segundo ele, não é positiva. "O Brasil é líder na quantidade absoluta de mortes e está entre os dez países mais violentos do planeta", disse Lima.
"Quando se olha com zoom, 30 cidades brasileiras têm taxas acima de 100 mortes por 100 mil habitantes", disse ele, reforçando que o índice nesses municípios é maior que o de qualquer país no mundo.
Entre os Estados brasileiros, Pernambuco apareceu como o 5º mais violento de 2021, em números absolutos. Ao todo, o Estado somou 3.368 assassinatos.
Em primeiro lugar apareceu a Bahia, com 6.734 mortes violentas ao longo do último ano.
CIDADES MAIS VIOLENTAS
Entre as 30 cidades mais violentas do País, aponta o levantamento, 13 integram a Amazônia Legal e a maior parte delas está situada na região de fronteira. "Existe um processo de migração da violência para a região Norte", explicou Lima.
Como causa disso, ele atribui a atuação na região de facções de bases prisionais e de milícias, o que teria elevado os índices de violência em Estados como, principalmente, o Amazonas.
O material do Fórum aponta que os registros de homicídio caíram em todas as regiões do País, exceto na Norte. Nela, foram registrados 6.291 assassinatos no último ano, ante 5.758 em 2020. A maior alta foi no Amazonas, onde as mortes subiram de 1.121 para 1.670.
Recentemente, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram mortos em Atalaia do Norte, na fronteira do Estado. O crime chamou atenção para a alta da violência na área.
Os conflitos na Amazônia, explicou Lima, dão continuidade a uma série de disputas entre facções que vêm ocorrendo desde 2017 e que antes resultaram na alta de homicídios no Nordeste. Em 2017, o Nordeste chegou a registrar 27.288 homicídios.
Agora, ainda é a líder em registros no País, mas passa por um processo de estabilização - foram 20.500 ocorrências em 2021.Neste período, outras regiões entraram no radar das facções.
"Tabatinga (AM) hoje é considerada a segunda principal cidade de tráfico internacional de drogas e armas. Só perde para a rota de Ponta Porã (MS)", destacou Lima. "A rota de Ponta Porã é controlada pelo PCC (Primeiro Comando da Capital), já a de Tabatinga é controlada pelo Comando Vermelho. Mas essas rotas são disputadas."
Os conflitos pelo controle de regiões como essas, explicou, são um dos principais motivos que justificam a alta de mortes em regiões específicas do mapa, ao mesmo tempo em que outras localidades parecem sair de foco. "A área de Tabatinga ainda tem toda a interligação com as questões ambientais", diz ele, lembrando que as execuções de Bruno Pereira e Dom Phillips, no Vale do Javari, foram perto daquela região.
"Mas o tráfico sozinho não explica isso (as variações nos homicídios), há outros fatores", disse Lima.
Conforme o diretor do Fórum, 23% da tendência observada em 2021 - seja de alta ou de diminuição dos índices de criminalidade - recebeu influência de alterações na estrutura demográfica da população brasileira. "A gente sabe que quem morre mais e mata mais são os jovens", disse o sociólogo. O processo de envelhecimento da população também resvala nos índices de criminalidade.
Lima reforça que as faixas de 10 a 19 anos e de 20 a 29 anos são as que mais influenciam nos indicadores, o que demanda políticas públicas focalizadas. "É nesse segmento que a dinâmica da violência letal tem maior peso e, portanto, é nesse segmento que a gente tem que olhar com mais atenção o que está sendo feito", disse.
Nesse contexto, ele reforça que programas específicos dos governos estaduais também podem ter influenciado a queda dos homicídios, sobretudo para evitar com que jovens sejam cooptados pelo crime organizado. Como exemplo, cita as iniciativas Viva Brasília, no Distrito Federal, e RS Mais Seguro, no Rio Grande do Sul.
"Esses programas, segundo os estudos disponíveis, funcionam. O problema é que são circunscritos à liderança do gestor daquele momento", ponderou Lima.
Como não houve mudança estrutural na área, explicou, iniciativas como essas podem perder impacto, a depender dos planos dos próximos gestores. Já o impacto da pandemia e das medidas de isolamento social em 2020 e no ano passado, segundo os analistas do Fórum, foi maior em crimes patrimoniais ou de oportunidade, como roubos, do que nos assassinatos.