Nesta entrevista, o pediatra Eduardo Jorge da Fonseca Lima, conselheiro do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe) e vice-presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco, esclarece as principais dúvidas relacionadas a medidas de prevenção, isolamento social e sintomas relacionados à infecção pelo novo coronavírus na infância.
JC – Suspender as aulas foi uma medida certa?
EDUARDO JORGE - Tenho convicção de que a retirada das crianças da escola foi uma medida muito acertada. Pessoalmente me incomodavam, no início da epidemia, algumas questões: as pessoas achavam que deveríamos ficar tranquilos, que se morria mais por dengue e que o vírus não resistiria ao nosso calor, entre outras colocações. Sempre me preocupei, pois estamos diante de um vírus respiratório novo, sem nenhuma imunidade de rebanho prévia e de alta transmissibilidade. Embora a maioria dos casos seja leve, o percentual de infectados é muito grande e, para tentar reduzir isso, são importantes duas coisas: reduzir convívio social e ter diagnóstico precoce. As melhores experiências dos países com mais êxito (no enfrentamento à doença) tomaram essas medidas. O diagnóstico precoce, com exames em larga escala, não é uma possibilidade factível para o nosso País.
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JC - As crianças estão sendo menos afetadas pela covid-19. Qual a explicação?
EDUARDO JORGE - As crianças são menos expostas à transmissão, e a maioria das infectadas não apresenta sintomas ou tem quadros mais leves e, por isso, os testes diagnósticos não são realizados. Mas podemos estar com uma população pediátrica de assintomáticos maior que o divulgado.
JC – Mas o risco de infecção, entre as crianças, é menor mesmo?
EDUARDO JORGE - As infecções por covid-19, com base especialmente nos estudos da China, parecem realmente ter ocasionado doença com menor frequência nas crianças. Além disso, os quadros são bem menos graves. Um novo estudo, contudo, verificou que as crianças têm a mesma susceptibilidade de se infectar, mas como menor risco de ter quadro grave.
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JC - Como a criança se contamina?
EDUARDO JORGE - A grande parte é por contato familiar. Na experiência da China, mais de 80% (da população pediátrica doente) tinham esse vínculo.
JC – As crianças têm sinais diferentes dos adultos?
EDUARDO JORGE – Não. São sintomas muito parecidos com qualquer infecção respiratória viral: febre, coriza, tosse e dor de garganta. Em relação à febre, foi observado que várias crianças doentes (com o novo coronavírus) não apresentavam febre. Também recentemente foi publicado estudo em que vômitos e diarreia são bem frequentes e mais relevantes (entre crianças) do que no adulto. Importante ressaltar que não houve óbitos de criança na China. Na faixa etária pediátrica, foi verificado um óbito, no mundo, em um adolescente de 13 anos.
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JC – Gestantes podem transmitir o novo coronavírus ao feto, assim como ocorre com o zika? Uma mãe doente pode amamentar?
EDUARDO JORGE - Não há relato sobre esse tipo de transmissão. Dois estudos publicados, que acompanharam recém-nascidos de mães com a doença, mostraram que não foram identificados o vírus na criança. Em relação à amamentação, a orientação da Sociedade Brasileira de Pediatria é que a mãe continue o aleitamento tomando medidas de proteção adequada, como uso de máscaras e higiene rigorosa das mãos.
JC - Quais as orientações de proteção para a criança?
EDUARDO JORGE - Vamos tentar educá-las, neste momento de pandemia, e reforçar ensinamentos sobre a lavagem das mãos com água e sabão por, pelo menos, 20 segundos e com frequência. Na impossibilidade de lavar as mãos, deve-se orientar a criança a utilizar o álcool em gel. As crianças precisam evitar contato com pessoas doentes, tossindo ou espirrando. A família deve ainda desinfectar com frequência as superfícies de toques usadas pelas crianças. Também é importante ter cuidados com a limpeza dos brinquedos. Os adultos devem aproveitar o maior tempo de convivência para conversar de forma adequada com os pequenos sobre a doença e explicar por que estão em casa. Algo importante ainda é observar o que as crianças veem na televisão ou mídias digitais, a fim de se combater as informações falsas ou não confiáveis. A família deve tirar as dúvidas dos pequenos em uma linguagem acessível, com informações verdadeiras e apropriadas para a idade e o desenvolvimento da criança.