No Nordeste, o Recife é a segunda capital com a maior taxa de mortalidade por covid-19 a cada 100 mil habitantes, atrás apenas de Fortaleza, segundo análise que considera os dados oficiais das Secretarias Municipais de Saúde da região. A ordem é a mesma se for feito um retrato do número absoluto de óbitos pela doença e da letalidade nessas nove cidades nordestinas quase cinco meses depois da primeira morte confirmada pelo novo coronavírus no Recife. A capital pernambucana tem 129,6 mortes por 100 mil habitantes (mortalidade), e uma letalidade de 7,8%. Para se ter uma ideia, na cidade de São Paulo, que tem uma população sete vezes maior do que a do Recife, a taxa de mortalidade é de 79,4 por 100 mil habitantes; a letalidade, 4,2%.
Ou seja, por esse coeficiente, métrica adotada para tornar homogêneos e padronizar os dados de cada localidade, constata-se que, no Recife, morre-se mais por covid-19, em relação ao número de habitantes, do que em São Paulo. Outro detalhe é que a taxa de mortalidade da capital pernambucana é quase o triplo da nacional, de 45.
Mortalidade e letalidade, embora indicadores que são confundidos vez por outra, trazem informações diferentes e complementares para medir a dimensão de uma epidemia e os impactos que ela faz transbordar em cada grupo. Enquanto a taxa de mortalidade mede o risco de pessoas virem a ter a doença e, em seguida, morrer, a letalidade mede a gravidade da infecção e a chance de uma pessoa já com covid-19 ir a óbito, além de estar relacionada à severidade do vírus e a condições de atendimento na rede de saúde.
Na visão do secretário de Saúde do Recife, Jailson Correia, as cidades que já viveram praticamente toda a primeira onda da covid-19 (Recife alcançou o pico da curva epidêmica, segundo autoridades de saúde, em maio) tendem a ter um número acumulado de mortes significativamente maior do que aquelas que ainda não superaram toda a pressão inicial da pandemia. "O segundo aspecto é que devemos sempre lembrar da tradição reconhecida nacionalmente, pelo próprio Ministério da Saúde, de o Recife e de Pernambuco prezarem pelo cuidado na vigilância epidemiológica, no sentido de investigação de óbitos. Essa sempre foi uma característica importante: quem mais investiga mais encontra confirmação de mortes pelo novo coronavírus", explica Jailson.
Desde o início da epidemia, Pernambuco segue a escolha de testar todas as pessoas que foram a óbito por síndrome respiratória aguda grave (srag) — uma condição que pode ser causada por diversos agentes como vírus e bactérias, mas que está extremamente relacionada à covid-19 nesta pandemia. São investigados todas as mortes por srag, mesmo que inicialmente não se tenha levantado suspeita da infecção pelo novo coronavírus. Esse é um dos fatores que, segundo alguns especialistas, fazem a letalidade permanecer alta no Recife, por onde se iniciou com vigor a epidemia no Estado. Os números revelam como a vigilância tem sido sensível: dos 9.569 óbitos por srag em Pernambuco, 74,2% positivaram para covid-19. No Recife, a proporção é semelhante: dos 2.932 pessoas com srag que morreram, 73% haviam sido infectadas pelo novo coronavírus.
Diagnóstico
O passo agora tem sido ampliar cada vez mais a testagem, a fim de conseguir aumentar o poder de bloqueio da transmissão neste momento de retomada das atividades socioeconômicas. Atualmente todas as pessoas com sintomas já podem agendar o exame e, ainda este mês, o governo estadual deve iniciar os testes nos contatos assintomáticos de infectados. A testagem tem sido a menina dos olhos nesta pandemia, pois já se sabe que, sem testes, os casos não podem ser isolados e consequentemente a cadeia de infecção não será interrompida. Entre testes rápidos e RT-PCR, Pernambuco realizou 234.570 exames em pouco mais de cinco meses, mas ainda é preciso avançar mais, assim como outras localidades brasileiras. "Fica patente a discrepância entre os Estados em termos de recursos diagnósticos, o que evidencia a ausência completa do governo federal e que viramos uma colcha de retalhos em termos de estratégias de combate à pandemia no Brasil", destaca o médico sanitarista Tiago Feitosa.
Mesmo com a queda no número de novos casos que foram observadas em julho no Recife, especialistas alertam que o vírus continua a circular. "As pessoas podem ter uma falsa impressão ao ver que há um menor adoecimento. Mas friso que a covid-19 continua sendo potencialmente grave. Além disso, nas últimas duas semanas, observamos um discreto aumento de casos em consultórios e hospitais. Não sabemos se esse aumento será uma leve onda para cima, que vai cair e estabilizar, ou se é um incremento que ameaçará a traquilidade dos leitos hospitalares", frisa o pneumologista Alfredo Leite, do Hospital Universitário Oswaldo Cruz.
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