O sorotipo 3 do vírus da dengue ressurgiu recentemente no Brasil, após mais de 15 anos sem causar epidemias no País. Já foram registrados casos da infecção este ano, em Roraima, na região Norte, e no Paraná, no Sul. Dessa maneira, especialistas acendem o alerta para o risco de uma nova onda da doença causada por esse sorotipo viral.
Essa preocupação é maior em locais onde atualmente há uma calmaria em relação à incidência da dengue, como Pernambuco e Rio de Janeiro.
O assunto foi debatido durante coletiva de imprensa realizada na manhã desta terça-feira (14). Realizado pela biofarmacêutica Takeda, o evento virtual apresentou o impacto da dengue no Brasil e os resultados de uma pesquisa que ouviu 2 mil pessoas em todo o País.
Encomendado a Ipsos pela Takeda e com a coordenação científica da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o levantamento revelou que três em cada dez brasileiros já tiveram dengue e 69% conhecem alguém que já teve a doença. Entre os já acometidos, 69% foram diagnosticados uma vez, 23% duas vezes e 6% três vezes ou mais.
O infectologista Alberto Chebabo, presidente da SBI, traçou um panorama do cenário da dengue, que tem chamado a atenção pelo aumento do número de casos recentemente, especialmente nos Estados do Sudeste e Sul do País.
Questionado pela reportagem do JC por que os Estados do Nordeste, como Pernambuco, continuam a apresentar um cenário de calmaria em relação à dengue e outras arboviroses, Chebabo disse que a explicação pode estar no fato de boa parte da população da região ter ficado imunizada após o período de tríplice epidemia (dengue, chicungunha e zika) vivido nos anos de 2015 e 2016.
Por outro lado, ele diz que o panorama de calmaria na região sinaliza um maior risco de ressurgimento de surtos decorrentes do sorotipo 3 do vírus da dengue.
A questão é que a circulação de um tipo de dengue, há tanto tempo ausente, preocupa os especialistas. Eis a razão: o risco de uma epidemia com o retorno do sorotipo 3 ocorre por causa da baixa imunidade da população, já que poucas pessoas foram infectadas por esse vírus desde as últimas epidemias registradas no começo dos anos 2000.
Vale explicar que o vírus da dengue possui quatro sorotipos. A infecção por um deles gera imunidade contra o mesmo sorotipo, mas é possível ser infectado novamente se houver contato com um sorotipo diferente.
Existe ainda o perigo da dengue grave, que ocorre com mais frequência em pessoas que já tiveram a doença e são infectadas novamente, por outro sorotipo.
O que os brasileiros sabem sobre dengue?
A pesquisa encomendada a Ipsos pela Takeda e coordenada pela SBI trouxe ainda o conhecimento dos brasileiros sobre os tipos de dengue. Quando perguntados sobre quantas vezes uma pessoa pode ter a doença, 69% dos entrevistados não souberam responder, 12% disseram por um número ilimitado de vezes, 18% entre uma e três vezes e apenas 2% acertaram a resposta: 4 vezes.
"Há uma falsa ideia de imunização após infecção por dengue. Ou seja, a pessoa que já pegou acredita estar imune à doença. Precisamos alertar que existem quatro tipos de dengue e, portanto, cada pessoa pode ser infectada até quatro vezes", reforçou Chebabo.
O infectologista ainda sublinhou que a dengue está presente na vida do brasileiro de alguma forma, seja porque já tiveram a doença, conhecem alguém que teve ou porque estão preocupados com o risco de infecção. "No entanto, as medidas de controle do vetor são insuficientes, e os casos só estão aumentando", analisou.
Segundo dados do Ministério da Saúde, existem mais de 1,6 milhão de casos registrados de dengue no Brasil e 1 mil mortes em 2023, superando os casos de 2022 (cerca de 1,4 milhão) e quase atingindo o mesmo patamar de óbitos (1.016).
"Precisamos também esclarecer mitos relacionados à infecção e reforçar que a dengue é uma doença democrática. Ela está presente em todo o Brasil, seja em localidades de clima quente ou frio, atingindo todas as classes sociais", frisou a infectologista Rosana Richtmann.
A pesquisa foi realizada entre os dias 26 de junho a 31 de julho de 2023, com 2 mil pessoas, acima de 18 anos, de todas as classes sociais e regiões do País, por telefone. A margem de erro é de 2 pontos percentuais.
Impacto da doença nas medidas de controle
Entre aquelas que tiveram a dengue, 70% afirmam que fizeram mudanças em casa após o diagnóstico:
- cuidados com os recipientes com água parada (27%)
- tampar reservatórios de água (12%)
- remover água parada de vasos (11%)
- maior limpeza no quintal de casa (10%)
- deixam garrafas com a boca para baixo (8%)
- colocam areia nos vasos de plantas (8%)
No entanto, 30% delas não realizaram qualquer tipo de medida preventiva.
Necessidade de maior conhecimento
O levantamento revelou ainda que mitos relacionados à infecção pelos vírus da dengue ainda persistem:
- acreditam que a dengue ocorre exclusivamente no verão (43%)
- pensam que a doença só atinge pessoas das classes sociais mais baixas (25%)
- acham que só ocorre em regiões endêmicas (25%)
- pensam que a dengue não está presente onde moram (21%)
- que a doença não acontece nas cidades grandes (21%)
Em relação aos sintomas, 98% dos entrevistados disseram que buscariam cuidados especializados se desconfiassem da dengue, mas conhecem poucos sintomas associados à doença.
A maioria cita febre (81%), dor no corpo/ dores musculares (57%) e dor de cabeça (39%).
Além disso, 73% das pessoas têm conhecimento de que a picada do mosquito é a forma de infecção.
Novas medidas de prevenção
Quanto às novas formas de combate à dengue, a possibilidade da vacinação contra a doença ainda é desconhecida pela maioria dos entrevistados (73%).
No entanto, entre aqueles que já ouviram falar do tema (27%), 86% acreditam na eficácia da vacina.
"Vemos que a dengue é uma preocupação nacional, e a população está mais atenta para as formas de controle do vetor. As campanhas de conscientização continuam sendo necessárias. Precisamos unir esforços para ampliar as formas de controle da doença", analisou a diretora médica da Takeda Brasil, Vivian Lee.