Não é só estética: cirurgia ortognática corrige função bucofacial, devolve autoconfiança e qualidade de vida aos pacientes
Cirurgia dura cerca de quatro horas e é recomendada quando o corpo atinge a maturidade esquelética: aos 16 anos para meninas e 18 para meninos
Autoconfiança e bem-estar são elementos fundamentais na vida de qualquer pessoa. Sentir-se bem consigo mesmo reflete diretamente nas relações sociais, no ambiente de trabalho e até mesmo na disposição para encarar os desafios diários. No entanto, para muitos pacientes que convivem com assimetrias faciais (condição em que um lado do rosto é diferente do outro e pode afetar mandíbula, nariz, olhos e lábios) e disfunções maxilares (associadas à mandíbula), essa realidade pode parecer distante.
Esse é o caso de quem necessita da cirurgia ortognática, um procedimento que não só corrige aspectos funcionais, como respiração e mastigação, mas também devolve a harmonia facial e a autoestima, com o objetivo de proporcionar uma transformação que vai além da aparência.
A cirurgia ortognática é um procedimento eletivo (não emergencial) realizado quando a mandíbula (queixo) é maior do que a maxila (estrutura óssea superior), ou o contrário. Quando acontece esse tipo de deformidade, o paciente passa por diversos problemas funcionais e estéticos.
Na maioria dos casos, a cirurgia deve ser precedida de tratamento com aparelho ortodôntico, a fim de organizar a posição dos dentes e preparar a cavidade oral para a operação.
Dessa forma, o procedimento cirúrgico tem cinco objetivos iniciais:
- melhorar a capacidade respiratória
- melhorar a capacidade de mastigação
- melhorar o encaixe dentário
- melhorar a articulação da fala
- melhorar, como consequência, o equilíbrio estético
A nutricionista Suely Oliveira, 22 anos, decidiu passar pela cirurgia ortognática há dois anos. Embora não tivesse grandes problemas funcionais, o desconforto com a aparência do seu rosto foi decisivo para ela optar pelo procedimento.
“Eu não usava o cabelo preso, tinha vergonha de olhar nos olhos das pessoas porque sabia que elas estariam prestando atenção no meu rosto”, relata.
Avanços tecnológicos
O cirurgião bucomaxilo Luis Felipe Maciel, especialista em cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial pelo Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) da Universidade de Pernambuco (UPE), recorda que, quando iniciou na área, a cirurgia ortognática era feita de forma rudimentar, com o planejamento cirúrgico realizado em moldes de gesso.
“Antigamente, a gente fazia a osteotomia (corte no osso) e deixava o osso parado na posição. Nós bloqueávamos o paciente, precisava ficar com a boca fechada por um fio de aço. Por isso, o procedimento chama muita atenção. Hoje em dia, a cirurgia é mais refinada, o paciente sai da cirurgia se alimentando, sai bem”, diz o cirurgião, que é pós-graduado em cirurgia ortognática pelo Instituto Maxilo Facial Centro Médico Teknon, em Barcelona (Espanha).
Atualmente, todo o planejamento é computadorizado, em moldes tridimensionais. Já a cirurgia, continua a necessitar da osteotomia, mas a estrutura é fixada com placas de titânio e parafusos. Isso permite ao paciente sair da cirurgia falando e se alimentando, ainda que de forma líquida e em seguida pastosa.
A cirurgia ortognática é realizada sob anestesia geral, e todas as incisões (cortes) são intraorais (como não há incisão externa, também não ficam cicatrizes).
Resultados
O procedimento, apesar de seguro, pode assustar no pós-operatório imediato para algumas pessoas. Suely conta que, durante esse período, sentiu-se arrependida ao ver seu rosto inchado ou sentir dores na face.
Entretanto, com a evolução pós-cirúrgica, o sentimento mudou completamente. "Eu senti uma realização muito grande, porque me incomodava muito e eu escolhi fazer a cirurgia por estética mesmo." A cirurgia não apenas trouxe a simetria facial desejada, mas transformou sua autoestima e confiança.
Clinicamente, os resultados podem ser vistos mais claramente entre seis meses e um ano após o procedimento. Entretanto, para os pacientes, é possível ver mudanças num período muito menor.
O impacto emocional na qualidade de vida é extraordinário, mesmo em atividades mais simples, como mastigar. Um paciente me relatou que nunca tinha sentido como era mastigar um camarão (antes da cirurgia), por exemplo. De coisas mais simples como essa, até as coisas mais importantes, como mudar um sorriso de alguém que nunca tinha sorrido", relata o cirurgião bucomaxilo Luis Felipe.
Expectativa por cirurgia no SUS
Essa é a expectativa da estudante de odontologia Taísa Freitas, 28 anos, que espera por uma vaga no Sistema Único de Saúde (SUS) para realizar o procedimento.
Ao ser avaliada para um possível tratamento ortodôntico, Taísa descobriu que necessitaria de um procedimento cirúrgico. Ela conta que, no primeiro momento, recusou a cirurgia. Só ao entrar na faculdade, entendeu a necessidade.
“Quando eu fui para segunda avaliação, já cheguei falando que eu não queria fazer nenhum procedimento cirúrgico, mas quando comecei a cursar odontologia, mudei meu pensamento”, conta.
Taísa foi diagnosticada como Classe III, quando a mandíbula é retraída em relação à maxila. No entanto, nunca enfrentou grandes questões estéticas.
Seus maiores problemas são funcionais: estalo na ATM (sigla para articulação temporomandibular, ligação entre a maxila e mandíbula), má oclusão (encaixe entre os dentes superiores e inferiores) e dificuldade de respiração durante o sono.
Ao trazer a maxila para frente, a cavidade nasal também sofre alterações e abre um espaço maior para a circulação de ar.
“A cirurgia ortognática é descrita objetivamente como corretora da posição do encaixe dentário, inicialmente para aqueles pacientes que tinham o queixo muito adiantado e para fazer morder, esse era objetivo. E à medida que fomos evoluindo e entendendo melhor a cirurgia, temos um conjunto de outros elementos: envolve respiração, envolve mastigação, envolve fala e, naturalmente, envolve estética”, explica Luis Felipe.
Taísa já completou o tratamento com aparelho ortodôntico e aguarda uma vaga em hospital público para realizar a cirurgia. “Estou tranquila, porque entendo um pouco melhor o procedimento, mas estou ansiosa”, relata.
“Queria resolver logo essa situação e fazer a cirurgia. Eu sei que o pós operatório é complicado, com alimentação líquida e pastosa. Na faculdade, vamos fazer fotos de 50% do curso concluído, e muitas vezes não gosto do meu rosto em fotos, acho que fica torto”, conta acerca da expectativa de realizar a cirurgia rapidamente.
Apesar disso, a estudante relata medo de não se reconhecer no espelho após a cirurgia com uma possível mudança na aparência. Entretanto, ela acredita que as modificações tendem a ser para melhor.
O bucomaxilo Luis Felipe explica que mexer na face é uma decisão muito importante. “Depois do processo, sem sombra de dúvidas, temos resultados da experiência clínica, emocional, estética; o resultado de vida como um todo, no sentido de que o paciente se introduz numa nova vida de autocuidado, muda sua percepção em relação ao mundo e às outras pessoas”, frisa.
Possíveis causas
Existe uma série de fatores que explicam deformidades faciais, e a forma mais comum é a congênita - ou seja, desde antes do nascimento. O desenvolvimento do crânio depende também de determinação genética.
Entretanto, é possível que as alterações ósseas faciais surjam ao longo do desenvolvimento do corpo. Luis Felipe explica que crianças e adolescentes que respiram pela boca têm tendência a não desenvolver a maxila.
Essa estrutura necessita de função para desenvolver. O ar, ao entrar pelo nariz, transita pelo seio facial (cavidades ao lado do nariz) e segue para os pulmões. Esse processo umidifica esse espaço, movimento necessário para o desenvolvimento da face.
Ao respirar pela boca, a cavidade facial não receberá a umidificação necessária e não se desenvolverá normalmente. Dessa forma, a mandíbula cresce em ritmo normal, diferentemente da maxila, que ficará menor, criando uma disparidade entre os ossos faciais.
Benefícios e acesso
- A cirurgia ortognática é segura, previsível, estável, além de promover mudanças significativas na função e na harmonia facial do paciente, a fim de melhorar a qualidade de vida.
- A cirurgia ortognática faz parte do Rol de Procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), pois favorece tanto os pacientes dos hospitais públicos, como dos hospitais privados.