Em seis meses, 37,5% dos presos deixaram o Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife. A redução atende à determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para diminuir a superlotação e as condições desumanas nos três presídios que compõem o Complexo. A meta é reduzir em 70% a quantidade de detentos até o final de abril deste ano.
Visita de membros do CNJ, incluindo a então corregedora Nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura, em agosto de 2022, constatou que havia 6.508 presos no Complexo do Curado - apesar de a capacidade ser de apenas 1.819 vagas.
A Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, do governo de Pernambuco, diz que o Complexo conta atualmente com 4.069 presos. Isso significa que cerca de 2,4 mil deixaram os três presídios.
Essa redução, ainda que não seja a ideal, constata a importância das medidas determinadas pelo CNJ para diminuir o problema histórico da superlotação e garantir um mínimo de dignidade às pessoas privadas de liberdade.
Segundo o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) a diminuição no número de presos foi possível graças a "alvarás de soltura, livramento condicional, progressão para regime aberto, progressão para regime semiaberto ou foram transferidos para outras unidades prisionais".
Além disso, o TJPE pontuou que nenhum preso entrou no Complexo do Curado desde a publicação da determinação do CNJ.
Estão sendo realizados mutirões, com a participação de 15 juízes, para analisar os processos dos réus presos. Outra medida muito necessária, já que a quantidade de processos parados aguardando julgamento também é alta - não só no Complexo do Curado, é importante destacar.
"Até agora, foram analisados 2.185 processos. Esse esforço se soma às análises realizadas sistematicamente pelos juízes naturais dos processos", disse a assessoria do tribunal.
A visita da comitiva do CNJ às unidades prisionais do Complexo do Curado, no ano passado, foi considerada estarrecedora, por causa das condições desumanas em que vivem os presos e pelo estado de favelização.
No Presídio Juiz Antônio Luiz Lins de Barros, por exemplo, há problemas estruturais e falta de higiene por toda a parte. Sem quartos, detentos improvisaram buracos para dormir. Para ter acesso, eles têm que rastejar. Pessoas também são forçadas a dormir no chão por falta de celas, abrigadas da chuva por pedaços de lona.
Na decisão que determinou a redução de detentos no Complexo do Curado, Maria Thereza de Assis Moura destacou que há um "mercado paralelo" nos três presídios.
"A falta de água potável e de alimentação adequada e em quantidade suficiente enseja a ostensiva comercialização, por parte das próprias pessoas presas, de insumos de sobrevivência básica, vendidos em 'cantinas', com preços abusivos."
"Também foi identificada a falta de kits de higiene e vestuário para as pessoas presas, o que reforça o mercado paralelo de comercialização nas unidades a facilitar situações de sujeição, corrupção e violência", completou.
Para atingir a meta de redução de presos no Complexo do Curado, o TJPE criou um gabinete de crise - com participação do Ministério Público, Defensoria Pública, Tribunal de Contas do Estado e Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos.
Há reuniões permanentes para avaliação de demandas e dificuldades de cada instituição.
Nesse período, também em atendimento à decisão do CNJ, juízes de competência criminal realizaram três visitas extraordinárias - todas registradas com fotografias e vídeos - para acompanhar as condições dos três presídios.
Para ampliar a taxa de redução de presos, a Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos informou outras medidas que também estão sendo adotadas, como o início a construção de uma nova unidade prisional no Complexo Prisional do Curado - com capacidade para 954 presos.
Há também o curso de formação para 1.354 policiais penais em andamento; a expansão de 4 mil para 8 mil tornozeleiras eletrônicas; a criação de 662 novas vagas no Presídio de Palmares e 352 no Presídio de Igarassu. Outras 154 estão em construção na Penitenciária Juiz Plácido de Souza, em Caruaru.
A situação desumana no Complexo do Curado é antiga e sempre foi de conhecimento de todas as autoridades. Tanto que, em 2011, a integrante do Conselho da Comunidade da 3ª Vara de Execuções Penais da Capital e coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, Wilma de Melo, precisou denunciar o Estado brasileiro à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Naquele ano, quando foi editada a primeira medida cautelar, a população carcerária se aproximava de 5 mil pessoas. Uma década depois, apesar de a Corte ter proibido a entrada de novas pessoas, o número de detentos no Complexo continuou a crescer, sem melhorias da estrutura.
O País foi condenado pela Corte IDH e, por isso, o CNJ foi obrigado a fiscalizar e cobrar com rigor melhorias nas condições de sobrevivência dos presos.