Mesmo com o atraso do programa Juntos pela Segurança, que estava previsto para ser lançado em abril, a Secretaria de Defesa Social (SDS) está seguindo com novos estudos para combater a violência em Pernambuco. Na última semana, um grupo de trabalho foi criado para elaborar ações de controle e rastreamento das armas de fogo.
A decisão levou em conta estatísticas preocupantes. As armas de fogo foram usadas em 80% das mortes violentas em Pernambuco no primeiro trimestre de 2023, segundo boletim de indicadores do governo estadual. O número é semelhante ao registrado ao longo do ano de 2022, quando 79% das vítimas de homicídio foram atingidas por tiros.
O grupo de trabalho é formado por representantes de todas as forças de segurança do Estado: polícias Civil, Militar e Científica e Corpo de Bombeiros.
A iniciativa de estudos sobre as armas de fogo levou em consideração também um relatório de auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), que destaca o aumento da circulação de armas de fogo no Brasil - impulsionado pela flexibilização de regras para posse e porte de armamentos no governo de Jair Bolsonaro - e uma possível falta de controle por parte da Polícia Federal e do Exército Brasileiro.
O relatório do TCU pontuou que o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), sob a responsabilidade da Polícia Federal, continha o registro ativo de 637.972 armas de fogo em 2017. Ao final de 2020, o número subiu para 1.279.491. Os dados foram levantados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
No começo do ano, decretos de estimulo às armas, que resultaram na multiplicação delas nas mãos dos chamados Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CACs), foram revogados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além disso, os CACs também foram obrigados a realizar o cadastramento de suas armas no sistema da Polícia Federal.
O TCU destacou que as secretarias estaduais de segurança apreenderam 109.137 armas de fogo no ano de 2020. Mas, apesar de os governos estaduais terem a obrigação legal de reportar as apreensões no Sinarm, a Polícia Federal registrou, no mencionado ano, somente 2.561 armas aprendidas - o que demonstra a falta de controle no rastreamento desses materiais que resultam em violência.
Por causa disso, o TCU determinou que as unidades de criminalística estaduais, responsáveis pelas perícias de todas as armas apreendidas, façam os cadastros no Sinarm - sob o risco de os Estados deixarem de receber recursos federais do Fundo Nacional de Segurança Pública.
A criação do grupo de trabalho para ações de controle e rastreamento das armas de fogo em Pernambuco foi determinada pela secretária de Defesa Social, Carla Patrícia Cunha.
Na portaria, a gestora estadual disse que o grupo de policiais terá por obrigação o estabelecimento das prioridades e planejamentos necessários para o controle das armas circulantes no Estado, com metas a médio e curto prazo.
Dados da SDS apontaram que 2.015 armas de fogo foram apreendidas entre 1º de janeiro e 30 de abril deste ano.
Além da identificação da origem das armas apreendidas, para posterior punição dos criminosos, o Estado também precisa garantir um controle mais efetivo do próprio acervo. E punir, com rigor, os profissionais da segurança que não cumprem a lei e os gestores que não fiscalizam a rotina de trabalho de suas equipes.
Em janeiro de 2021, um policial civil identificou o sumiço de mais de 1,1 mil armas de fogo que estavam guardadas em um depósito da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil de Pernambuco, que era localizada na área central do Recife.
Além das armas de fogo, mais de 3 mil munições foram furtadas. A perícia não encontrou sinais de arrombamento no depósito onde os materiais estavam guardados.
Por uma falha grave de segurança, no interior do setor de armaria não havia câmeras. Mas havia uma do lado de fora, apontada para a porta de entrada. Foi descoberto, no entanto, que o equipamento não funcionava 24 horas por dia.
Após meses de investigação, 20 pessoas - incluindo cinco policiais civis (um deles faleceu depois) - foram apontadas como responsáveis pelo esquema de desvio e venda de armas para facções criminosas que atuam no Grande Recife.
Interceptações telefônicas apontaram que armas foram comercializadas por valores que variavam de R$ 6,3 mil a 6,5 mil, cada uma. Já as submetralhadoras custavam R$ 22 mil nesse comércio ilegal.
Os acusados respondem por crimes como organização criminosa, comércio ilegal de armas de fogo, peculato, lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva. Ainda não foram julgados pela Justiça e estão em liberdade por causa da demora no andamento do processo.
Apesar das provas, a Corregedoria da SDS ainda não concluiu os processos administrativos disciplinares que podem punir os policiais civis apontados como integrantes do esquema criminoso.