Prefeitura do Recife não quer Guarda Municipal armada, mas contrata vigilância privada
Prefeitura alega que serviços não são conflitantes e que visam ampliar segurança dos equipamentos públicos
Apesar de optar por não equipar a Guarda Municipal com armas de fogo, a Prefeitura do Recife faz contratações de empresas de vigilância privada armada. O argumento é de que os serviços são complementares e têm o objetivo de ampliar a segurança dos equipamentos públicos.
A Autarquia de Urbanização do Recife (URB), responsável pelas obras estruturadoras e serviços de engenharia no município, por exemplo, tem feito estudos para analisar se é viável a contratação de empresas de vigilância armada para reforço da segurança.
A prefeitura foi questionada pelo JC sobre o motivo pelo qual a Guarda Municipal não é treinada e equipada para fazer uso de armas de fogo nos locais onde há vigilantes privados armados.
Por meio de nota, a prefeitura argumentou que a Guarda Municipal tem como papel principal "promover a cultura cidadã, em acordo com o que a gestão considera o melhor caminho para diminuir os índices de violência na cidade, e considerando também o papel da administração municipal neste contexto".
A nota da prefeitura destacou que a Guarda "atua na segurança patrimonial de equipamentos públicos que, em sua maioria, prescindem de armas de fogo para sua vigilância, como parques e praças". E que qualquer mudança na forma de atuação deverá passar por amplo debate com a sociedade.
"Em relação ao emprego de vigilância privada, não se constitui serviço conflitante com a proteção patrimonial, uma vez que é complementar e visa ampliar a cobertura de segurança dos equipamentos municipais", completou a prefeitura.
O JC também pediu para a prefeitura esclarecer em quais situações estão sendo contratados vigilantes armados, mas não houve resposta.
ENTENDA A POLÊMICA SOBRE O USO DE ARMAS PELA GUARDA MUNICIPAL
A polêmica em relação ao uso de arma de fogo pela Guarda Municipal continua repercutindo no Recife - única capital do Nordeste que não quer aderir. Nesta segunda-feira (30), houve discussão sobre o tema na Câmara de Vereadores. Paulo Muniz (SD) fez críticas ao secretário municipal de Segurança Urbana, Murilo Cavalcanti, que afirmou ser contrário ao uso de armas de fogo. Já o vereador Ivan Moraes (PSOL) concordou com o desarmamento.
O debate teve início com a publicação de um artigo no JC, na edição da última quinta-feira (26). "A Prefeitura do Recife tem um papel fundamental a desempenhar na melhoria da qualidade de vida de seus cidadãos. E uma maneira decisiva de fazer isso é armar nossa Guarda Municipal", afirmou o vereador, no texto.
Em entrevista ao JC, no dia seguinte, Murilo Cavalcanti declarou que mantém a decisão de não armar os guardas municipais. "Não há evidência de que armar a Guarda Municipal irá diminuir a violência. O Brasil vive um momento muito difícil, com explosão da violência em todos os grandes centros urbanos. Mas armar a Guarda não é a pauta do momento."
Para Murilo, o investimento em políticas públicas em áreas mais vulneráveis, mapeadas pela Prefeitura do Recife, pode trazer melhor resultado no combate à violência.
Insatisfeito, o vereador usou a tribuna da Câmara para criticar a entrevista do secretário municipal ao JC. "Oito capitais do Nordeste armaram suas guardas. E o secretário Murilo Cavalcanti disse que não tem base científica para isso. Ele é um covarde, porque ele bota todos os dias 1,8 mil guardas, homens e mulheres, no meio da rua desprotegidos", disse Muniz.
O vereador Ivan Moraes afirmou que não concorda com o uso de arma de fogo pela Guarda Municipal.
"Um dos poucos acertos da prefeitura (do Recife) é manter a guarda desarmada. Guarda é guarda, polícia é polícia. Cada um tem uma tarefa. Tarefa da guarda é zelar pelos equipamento públicos, parques e praças. E isso pode ser feito com armamento não letal ou menos letal, como spray de pimenta. E, de fato, não há nenhuma base científica que comprove que a guarda armada reduz a criminalidade", declarou.
Murilo não quis comentar as novas declarações de Muniz.
ESPECIALISTA ALERTA PARA ALTO INVESTIMENTO E RISCO DE CONSEQUÊNCIAS
Em ao menos 20 capitais do País, a Guarda Municipal já atua armada. Gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, o advogado Bruno Langeani fez ponderações em relação à adesão das armas de fogo.
"O sucesso ou fracasso na atuação da Guarda Municipal para prevenir crimes tem muito mais a ver com a definição das prioridades, com a articulação das polícias estaduais e planejamento, do que necessariamente com o uso ou não da arma de fogo. A adesão da arma de fogo, para além do custo alto da compra e manutenção, também precisa prever um custo grande com treinamento e com reforço das atividades e da estrutura de correição da Guarda Municipal", afirmou Langeani.
"Caso seja decidida a compra de arma, considerando que a gente está entregando um instrumento letal para esses funcionários públicos, é preciso que isso venha acompanhado de um controle maior sobre essas atividades e capacidade de apuração de denúncias. Não deve ser uma medida tomada simplesmente porque outras guardas são armadas ou porque outras capitais estão armadas. Porque essa é uma decisão que pode vir com muito mais consequências negativas para a população do que como ajuda na prevenção criminal", completou o especialista, que é autor do livro Arma de Fogo no Brasil: Gatilho da Violência.